Leilão reduz caixa de distribuidora

 Rodrigo Polito e Camila Maia 

27/11/2015

Algumas distribuidoras de energia podem ter de solicitar à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) revisão tarifária extraordinária no início de 2016 para compensar o efeito negativo do custo da energia contratada no leilão de 29 usinas existentes, na quarta-feira. Na prática, a partir de janeiro, as distribuidoras pagarão algo próximo de R$ 124,88 por megawatt-hora (MWh) - preço médio do leilão - por essa energia, mas serão remuneradas, até a data do reajuste tarifário anual, pelas cotas relativas a esses empreendimentos, definida na Medida Provisória 579, de cerca de R$ 30/MWh.

"Para algumas empresas que têm reajuste mais afastado do momento atual, isso pode gerar um problema de pagamentos e de falta de caixa para honrar os compromissos. Nesse caso, estamos interagindo com a Aneel para verificar a possibilidade de essas empresas solicitarem uma revisão tarifária extraordinária para haver um concatenamento entre o aumento da despesa e o reconhecimento na tarifa", afirmou o presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Nelson Leite, ao Valor.

Segundo ele, a Abradee já iniciou conversas com a Aneel sobre o impacto do leilão para as distribuidoras. Agora, será vista, "caso a caso", a situação de cada empresa.

"Obviamente, existe um descasamento que afeta o fluxo de caixa, e as distribuidoras já estão numa situação difícil desde 2013, devido à exposição involuntária", disse Ricardo Savoia, diretor de Regulação da consultoria Thymos Energia.

Para Laura Souza, advogada do Machado Meyer, enfrentar um reajuste extraordinário não é o cenário ideal para o governo, que deve esperar antes para ver como o mercado se comporta em relação à repactuação do risco hidrológico.

Para um especialista do setor, que pediu anonimato, porém, será necessária alternativas de socorro para algumas distribuidoras

Segundo a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), ainda não é possível contabilizar o efeito generalizado do preço da energia negociada no leilão no caixa das distribuidoras.

O impacto, porém, deverá ser maior para empresas cujo reajuste anual ocorre no segundo semestre. Nesse caso estão AES Eletropaulo, CPFL Piratininga, Light, as distribuidoras da EDP Energias do Brasil e da Eletrobras, entre outras.

No início do mês, o Valor antecipou que projeções feitas pela Light, durante o processo tarifário deste ano, indicavam que a companhia poderia ter um impacto no caixa da ordem de R$ 150 milhões, pela defasagem do preço de energia do leilão e o valor cobrado atualmente na tarifa, de R$ 35,82/MWh.

Segundo o analista de um grande banco de investimentos que pediu para não ser identificado, o impacto é da ordem de R$ 158 milhões, o equivalente a quase um terço do caixa reportado pela Light no terceiro trimestre, de R$ 482 milhões. "A Light provavelmente precisará de uma revisão extraordinária", avaliou.

Ao Valor, a Light informou que o impacto do leilão não pode ser avaliado isoladamente, porque há "a expectativa de que seu efeito na CVA [conta de ativos e passivos regulatórios] seja mitigado por outros itens de custos com despesas inferiores à cobertura tarifária definida no último reajuste". Na prática, outros itens considerados no último reajuste tarifário da Light podem ter um custo inferior ao incluído na tarifa, o que pode compensar o impacto do resultado do leilão.

A CPFL Energia informou que está mensurando o impacto para as distribuidoras da incorporação das cotas de energia do leilão das hidrelétricas não prorrogadas. Entre as distribuidoras da companhia, a CPFL Piratininga deve ser a mais afetada, por ter reajuste tarifário em outubro. As demais empresas sofrerão menos com o descasamento de caixa, por terem reajustes no primeiro semestre.

A Eletrobras informou que as distribuidoras da estatal estão fazendo as análises dos efeitos do leilão e, por isso, ainda não têm como responder sobre o assunto.

Eletropaulo e EDP Energias do Brasil não comentaram. O reajuste da Eletropaulo é em julho, o da EDP Escelsa, em agosto, e o da EDP Bandeirante, em outubro.

Valor econômico, v. 16 , n. 3892, 27/11/2015. Empresas, p. B2