Copom mantém Selic em decisão dividida

Eduardo Campos, Alex Ribeiro, Silvia Rosa e Felipe Marques 

26/11/2015

A manutenção da taxa básica de juros, a Selic, em 14,25% ao ano estava na conta do mercado, mas o placar dividido da reunião de ontem deve tirar um pouco do marasmo das mesas de operações e consultorias e econômicas sobre o rumo da Selic em 2016.

Os diretores de assuntos internacionais, Tony Volpon, e de organização do sistema financeiro, Sidney Corrêa Marques, votaram por uma elevação de 0,50 ponto percentual, que levaria a Selic a 14,75% ao ano. Essa foi a primeira decisão não unânime desde outubro do ano passado, quando o BC retomou o movimento de alta tirando a Selic de 11% para 11,25%. Naquela ocasião Altamir Lopes (então diretor de administração), Luiz Awazu Pereira (de política econômica) e Luiz Edson Feltrim (relacionamento institucional e cidadania), votaram pela manutenção. Este foi o último encontro do colegiado em 2015, que volta a se reunir nos dias 19 e 20 de janeiro de 2016.

O comunicado apresentado após a reunião foi modificado, com o BC falando, apenas, que tomou a decisão "avaliando a conjuntura macroeconômica e as perspectivas para a inflação".

O texto não traz nenhum aceno sobre a estratégia ou possíveis passos futuros na condução da política monetária, o que dá graus de liberdade para o BC calibrar sua atuação e possíveis sinalizações até o encontro de janeiro. O BC também fica sem amarras para ajustar sua política conforme a decisão e desdobramentos da reunião do Federal Reserve (Fed), o BC americano, em 16 de dezembro. Há expectativa de elevação dos juros entre zero e 0,25% desde 2008.

O BC deixou de mencionar que a manutenção da Selic em 14,25% ao ano por período suficientemente prolongado era necessária para a convergência da inflação à meta no horizonte relevante da política monetária. Com isso, o colegiado também retirou a frase em que falava de que manteria postura "vigilante" para obtenção de seu objetivo.

O tom mais austero do comunicado e o fato da decisão não ter sido unânime reforçam a probabilidade de um novo ciclo de aperto monetário no ano que vem, afirma Tatiana Pinheiro, economista do Santander. Segundo a economista, entre as variáveis que influenciam a inflação, a desancoragem das expectativas parece ter sido o elemento mais relevante.

"O comunicado traz uma sinalização clara de que o plano de voo anterior mudou e a manutenção da taxa básica de juros já não parece ser suficiente para um grupo de pessoas do BC", diz.

Alessandra Ribeiro, economista da Tendências Consultoria, que espera que o colegiado do BC comece a subir os juros já no início do ano que vem. A extensão do ciclo, segundo ela, vai depender do comportamento das expectativas de inflação, que vêm piorando nos últimos meses.

"É difícil imaginar que o BC realize uma alta da taxa Selic e pare por aí. Acho que serão pelos menos mais duas a três altas de juros, elevando a Selic em pelo menos um ponto", afirma.

"Eu esperava já um tom 'hawkish' [pró-aperto] no comunicado, mas a decisão acabou vindo bem mais 'hawkish' que o esperado". diz o economista-chefe do banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves. "Dificilmente o dissenso entre os participantes não sinaliza uma mudança de postura. O convencional é que na próxima reunião tenha mais gente alinhada aos dois", diz. "O viés ficou claramente de alta".

Para o economista-chefe da Icatu Vanguarda, Rodrigo Alves de Melo, havia a expectativa de mudança no comunicado da reunião para incorporar o discurso do diretor de política econômica, Altamir Lopes, no começo do mês. Lopes havia sinalizado a convergência da inflação para o centro da meta em 2017, ao mesmo tempo em que afirmou que a taxa não deveria estourar o teto da banda de variação da meta em 2016. A dúvida, porém, é se a falta de unanimidade vai crescer na próxima reunião a ponto de virar o placar.

"A questão é se o dissenso é mesmo uma sinalização de alta. Será que o 'core' do BC vai embarcar na tese da alta no próximo encontro?", questiona.

Até a divulgação da ata, na quinta-feira da próxima semana, não se sabe qual o objetivo do colegiado do BC.

O voto contrário de Volpon não chega a surpreender, pois em palestra a investidores no início do mês, ele disse que o BC deveria trabalhar para garantir a convergência da inflação para 4,5% o mais brevemente possível. Ele também defendeu a explicitação sobre quando o BC pretende cumprir a meta, pois essa seria uma estratégia vantajosa para a economia e menos custosa em termos de credibilidade institucional. Em julho, o diretor já tinha defendido uma regra de atuação monetária ao falar que votaria pela alta de juros até que a projeção de inflação do BC estivesse apontando de forma satisfatória para o centro da meta. A postura do diretor Marques também não surpreende. Ele tem histórico de votação pela elevação dos juros em outros momentos em que houve dissenso.

Valor econômico, v. 16 , n. 3891, 26/11/2015. Finanças, p. C3