Ibama multará mineradora por desastre em Mariana

 

WASHINGTON LUIZ 

O globo, n. 30047, 12//11/2015. País, p. 8

 

Seis dias após o desastre em Mariana, o Ibama informou que multará a Samarco em mais de R$ 100 milhões. Dilma, que hoje vai à região, quer que empresa cubra prejuízo. -BRASÍLIA- O Ibama vai multar a mineradora Samarco pelo rompimento das barragens que provocou uma tragédia ao destruir o distrito de Bento Rodrigues, em Mariana (MG). O órgão debate ainda quantas multas serão aplicadas pelo desastre ambiental. O GLOBO apurou que o valor deve superar os R$ 100 milhões.

DANIEL MARENCO/10-11-2015Fauna atingida. Morador de São Tarcísio, em Governador Valadares, mostra peixe morto retirado da lama: pesca e captação de água prejudicadas no Rio Doce

Seis dias depois da tragédia em Minas Gerais, a presidente Dilma Rousseff decidiu que o governo vai responsabilizar a Samarco pelo rompimento das barragens. Ontem, Dilma telefonou para o diretor-executivo da BHP, Andrew Mackenzie, e para o presidente da Vale, Murilo Ferreira, que controlam a Samarco, e cobrou que as empresas arquem com os prejuízos sociais e ambientais.

Dilma também determinou a criação de um comitê de gestão da crise, composto pelos ministérios da Integração Nacional, de Minas e Energia e do Meio Ambiente, para acompanhar e cobrar da Samarco ações de reparação de danos. A decisão deve ser publicada hoje no Diário Oficial da União. “RESPOSTA IMEDIATA” Segundo o ministro da Integração Nacional, Gilberto Occhi, as empresas terão de se encarregar de solucionar o problema de abastecimento de água nas cidades às margens do Rio Doce atingidas pela lama. Occhi afirmou que a Samarco já se mostrou disposta a arcar com as despesas.

— Ela (Dilma) cobrou isso. Ela afirmou que são de responsabilidade da mineradora todos esses danos. Nós estamos falando de impactos que também destruíram rodovias mineiras, propriedades de várias pessoas, que tinham suas plantações como forma de subsistência, criação de animais. Será preciso dar resposta imediata às famílias. E a mineradora diz que fará todo o esforço para, no mais rápido tempo, dar a resposta, principalmente, às famílias atingidas — afirmou Occhi.

Depois de receber muitas críticas pela ausência, hoje Dilma visitará as regiões afetadas pela lama em Minas e no Espírito Santo, acompanhada de Occhi e da ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira.

Em entrevista mais cedo, Izabella já tinha adiantado que o governo federal multará as mineradoras:

— Seremos rígidos. Não tem essa história de que não pune. Vai ter punição. Tem que restaurar ambientalmente.

Pelos cálculos do ministério, com o acidente, 50 milhões de metros cúbicos de rejeitos foram despejados no ecossistema:

— É um desastre de dimensão catastrófica. Para você ter uma ideia, se a gente comparar o volume de lama desse acidente chega a ser até seis vezes maior que o do maior acidente nacional ocorrido nos últimos dez anos — disse a ministra.

Segundo Izabella, os governos dos dois estados também poderão punir as empresas.

— Tem que ver as condições do licenciamento, se a empresa cumpriu tudo no prazo, tem relatório de vistoria das barragens — afirmou ela. EMPRESAS CRIARÃO FUNDO Vale, BHP Billiton e Samarco vão criar um fundo para ajudar vítimas e recuperar o meio ambiente nas áreas atingidas. A informação foi dada pelo presidente da Samarco, Ricardo Vescovi, em entrevista em Mariana. Além de Vescovi, participaram o presidente da Vale, Murilo Ferreira, e o da BHP, Andrew Mackenzie.

Segundo o presidente da Samarco, os impactos ambientais ainda estão sendo analisados e as pessoas são prioridade no momento. A Samarco está em Mariana há 38 anos. Vescovi disse que alarmes sonoros foram colocados na barragem de Germano, a maior das três.

A Integração Nacional reconheceu ontem a situação de emergência em Bento Rodrigues, a pedido da prefeitura de Mariana. A emergência é necessária para facilitar o auxílio do governo federal na aquisição e distribuição de alimentos e na realização de obras emergenciais.

 

MP defende suspender operações se licença estiver vencida

 

DANDARA TINOCO

 

O Ministério Público de Minas vai questionar as normas ambientais que permitiram que a barragem de Santarém, rompida semana passada, e a mina de Germano, no mesmo complexo, em Mariana (MG), continuassem em funcionamento, ainda que os dois empreendimentos da Samarco estivessem com as licenças de operação vencidas há dois anos.

DANIEL MARENCO/06-11-2015Cenário de desastre. O local do rompimento das barragens: 2.700 processos de licenciamento esperam avaliação

Os pedidos de revalidação das licenças foram feitos pela mineradora dentro do prazo, em 2013. Contudo, as solicitações sequer foram analisadas pela Secretaria estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas (Semad), que alega ter número insuficiente de funcionários.

A Semad calcula haver 2.700 processos de licenciamento parados no estado. Sem essa análise, a licença anterior continua válida até a conclusão do processo. Na revalidação, é ponderado se as companhias estão tomando medidas para minimizar impactos ambientais para flora, fauna e população local.

— Vamos abrir um procedimento questionando a legalidade dessas normas, uma vez que ela minimiza a importância das renovações da licença. Sem elas, não é possível dizer que os compromissos ambientais de um empreendimento estão sendo cumpridos — criticou Carlos Eduardo Ferreira Pinto, promotor de Justiça do Meio Ambiente de Minas.

De acordo com Pinto, ainda não há previsão de quando a medida será tomada pelo MPMG, que só agora soube que o total de processos na mesma situação chega aos milhares.

A Semad informou ontem que, embora a licença de Santarém tenha expirado em 25 de maio de 2013, e a de Germano tenha prescrito em 27 de julho do mesmo ano, as operações não eram irregulares, graças à deliberação normativa do Conselho de Política Ambiental 193/ 2014. Em seu artigo 1º, a norma diz: “Nos processos em que se constatar a apresentação de requerimento de revalidação dentro do prazo de validade da licença vincenda, ficará este prazo automaticamente prorrogado até decisão da Unidade Regional Colegiada do Copam”.

A secretaria afirmou que os milhares de processos parados foram “herdados da administração passada”, acrescentando que uma força-tarefa foi organizada este ano para acelerar as análises. Técnicos já estão debruçados sobre os documentos relacionados ao caso da Samarco, garantiu. ESPECIALISTA CRITICA ESTADO Membro do Conselho de Política Ambiental e representante da Fundação Relictos de Apoio ao Parque Florestal do Rio Doce, José Ângelo Paganini criticou o que chama de sucateamento do sistema de meio ambiente:

— O número de funcionários não é o suficiente, e os que trabalham têm salário e capacitação inadequados. Isso ocorreu no governo anterior e vem se repetindo no atual. Se o pedido de renovação da licença não é analisado, a empresa é acobertada para não cumprir condições ambientais.

Procurada, a mineradora informou que todas as suas licenças ambientais “estão em dia”. Ontem, o governo de Minas negou informações de que a barragem de Germano estaria apresentando sinais de rompimento, e informou que haverá só uma intervenção no dique da barragem.