Correio braziliense, n.19.104, 15/09/2015. Política, p. 2

A frágil equação da reforma ministerial

A presidente Dilma Rousseff terá muitas dificuldades para fechar a equação da reforma ministerial, já que seu governo mergulhou em um clima de intriga e briga de poder entre o PT, os aliados e os movimentos sociais. Atuando isoladamente ou em conjunto, esses grupos poderão zerar todo o esforço da presidente para obter a economia - pequena, diga-se de passagem, de R$ 200 milhões - com a redução do tamanho da Esplanada e realinhar as forças políticas que lhe permitam sobreviver ao risco de impeachment que cresce diariamente.

O nível de tensão e desconfiança é tanto que Dilma tirou da comitiva do vice-presidente Michel Temer, que embarcou no sábado para uma viagem à Rússia e à Polônia em busca de investidores, dois ministros que considera leais: Jaques Wagner (Defesa) e Kátia Abreu (Agricultura). O comboio peemedebista aos países europeus foi visto pelo Planalto como uma chance para uma conspiração além-mar, já que a legenda defende o desembarque do governo em novembro, durante o Congresso Nacional do partido.
Ao petista Jaques Wagner, ela pediu que permanecesse em Brasília neste momento em que o governo estuda os cortes econômicos e o novo desenho da Esplanada. Para Kátia, sua fiel escudeira no PMDB, o pedido foi semelhante. Mas, antes mesmo da conversa com a presidente, a ministra da Agricultura já cogitava a possibilidade de não embarcar para a Rússia, por ter a exata noção das repercussões da viagem internacional, apesar das ótimas relações - políticas e pessoais - que mantém com Temer.

O nível brutal de desconfiança chegou ao ponto de ministros próximos à presidente defenderem que ela definisse, esta semana ainda, as mudanças na Esplanada, sem consultar o vice e o PMDB.  Dilma resolveu não comprar uma briga tão explícita e vai esperar para conversar com Temer semana que vem quando o vice-presidente já estiver de volta.

Para todos os efeitos, no entanto, a reforma já começou ontem. O ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), Mangabeira Unger, pediu demissão do cargo, o que foi prontamente aceito pela presidente. Outros vespeiros maiores estão na mesa de Dilma e não se sabe se ela terá coragem de mexer neles.

Uma das dúvidas é se ela, agora ou mais para frente, promoverá ou não a mudança na Casa Civil, com a saída de Aloizio Mercadante. Atacado por peemedebistas, petistas, e até pelo ex-presidente Lula, Mercadante mantém-se no posto por conta da histórica teimosia de Dilma. Dois nomes aparecem na bolsa de apostas para substituí-lo, caso a presidente ceda às pressões externas: a própria Kátia Abreu e o ministro de Ciência e Tecnologia, Aldo Rebelo.

"Rojão"
Curiosamente, ambos estavam ontem no Planalto, longe dos holofotes e dos microfones, enquanto os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, explicitavam as medidas para cobrir o deficit de R$ 30,5 bilhões do Orçamento. E podem se encaixar no perfil por razões e perfis diferentes. Aldo é um político habilidoso, clássico, com bom trânsito no Congresso, inclusive com a oposição. Já foi articulador político do governo Lula, mas não é unanimidade. "Ele é bom em condições políticas normais. Tenho dúvidas se, neste momento de crise, ele segura o rojão", criticou um petista.

Kátia Abreu é uma incógnita ainda maior. "O PT vai destruir essa proposta antes que ela surja. A gênese de Kátia é o PFL, ela é reacionária, os movimentos sociais não aceitarão", esbravejou um senador petista. Contra ela também pesa o fato de não ser uma peemedebista histórica. Se é para acalmar o PMDB com um cargo no coração do Planalto - mais central que a Casa Civil, impossível -, melhor seria se a vaga fosse para um cacique partidário, não para uma cristã nova na legenda.

"Kátia é uma gerentona, cópia fiel da presidente, tanto que são amicíssimas", elogiou um interlocutor governista. Isso poderia fazer com que Dilma faça ouvidos moucos às críticas, que já foram enormes quando Kátia foi escolhida para o Ministério da Agricultura, e devem tornar-se ensurdecedores caso ela seja deslocada para a Casa Civil.

Dilma também precisará decidir se preservar os ministérios sociais do PT ou se reúne todos em um Ministério da Cidadania, englobando Direitos Humanos, Igualdade Racial e Política para Mulheres. Por conta da pressão do Banco Central, a tendência é que ela mantenha o status de ministério do BC, da Advocacia-Geral da União (AGU) e da Controladoria-Geral da União (CGU).

Somado a tudo isso, Dilma ainda precisa retomar a confiança dos aliados no movimento social. "Vamos defender o governo da direita. Mas Dilma precisar colocar em pauta a agenda da esquerda que a elegeu. Caso contrário, vamos às ruas para criticar a presidente", disse a coordenadora paulista do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto, Natalia Vernita.

»  Em que pé está //     Quinze dias para o governo decidir o futuro da reforma ministerial na Esplanada

O que o governo queria inicialmente

» Banco Central, Advocacia-Geral da União e Controladoria-Geral da União perderia status de ministério

» Ministério da Pesca seria agregado ao Ministério da Agricultura

» Ministério da Micro e Pequena Empresa seria agregado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio

» Secretaria de Aviação Civil e Secretaria de Portos seriam agregados ao Ministério dos Transportes

» Secretaria de Assuntos Estratégicos, Secretaria de Relações Institucionais e Gabinete de Segurança Institucional (GSI) seriam extintas

O que pode ser feito

» Banco Central, Advocacia-Geral da União e Controladoria-Geral da União manterão status de ministério

» Ministério do Desenvolvimento Agrário será agregado ao Ministério do Desenvolvimento Social (MDS)

Permanecem de acordo com o modelo original:

» Ministério da Pesca será agregado ao Ministério da Agricultura

» Ministério da Micro e Pequena Empresa passa a agregar o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio

» Secretaria de Aviação Civil e Secretaria de Portos incorporada ao Ministério dos Transportes

» Secretaria de Assuntos Estratégicos, Secretaria de Relações Institucionais e Gabinete de Segurança Institucional (GSI) serão extintas

O que também defendem os aliados

» A substituição de Aloizio Mercadante na Casa Civil
» Ministérios sociais (Secretaria de Proteção à Mulher e Secretaria da Igualdade Racial) seriam agregados à Secretaria dos Direitos Humanos