Correio braziliense, n.19.107, 18/09/2015. Política, p. 3

Jogatina, a bola da vez

Quatro dias depois de apresentar um pacote de ajuste fiscal para cobrir o deficit orçamentário de R$ 30,5 bilhões, o governo segue dando sinais explícitos que não sabe exatamente como sair da crise na qual se enfiou. Durante reunião com líderes aliados na Câmara, o chefe da Casa Civil, ministro Aloizio Mercadante, sondou os parlamentares sobre a ideia de legalizar os jogos de azar no país, como bingos e cassinos, para aumentar a arrecadação. Além disso, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva desembarcou em Brasília para, com a presidente Dilma Rousseff e ministros petistas, traçar um plano de trabalho daqui para frente.

A sondagem feita por Mercadante veio após ouvir dos líderes aliados que não existe chance de a CPMF ser aprovada no Congresso. “Ainda estamos muito distantes dos 308 votos necessários para aprovação da emenda constitucional”, reconheceu o líder do PSD na Casa, deputado Rogério Rosso (DF).

A ideia de ressuscitar o debate em torno da legalização dos jogos não veio exatamente do governo. A proposta foi levantada na reunião da presidente Dilma com senadores na terça-feira passada e foi apresentada pelo deputado Benedito Lira (PP-AL). Polêmico, o assunto já provocou diversas crises ao longo destes 13 anos de governo do PT. Em 2004, o assessor especial para assuntos parlamentares da Casa Civil, Waldomiro Diniz, foi exonerado do cargo após o vazamento de um vídeo no qual ele tentava extorquir o bicheiro Carlinhos Cachoeira, à época em que era presidente da Loterj — Loterias do Estado do Rio de Janeiro.

O tema ainda foi alvo de uma CPI, em 2005. E o próprio Carlinhos Cachoeira foi investigado por tráfico de influência em busca de contratos para a realização de obras públicas. “São coisas distintas, Carlinhos Cachoeira é um contraventor. Nós queremos legalizar algo que já existe em todos os países civilizados do mundo, como, por exemplo, os Estados Unidos, o Canadá, o Chile e a Argentina, por exemplo”, afirmou o líder do PR na Câmara, Maurício Quintella Lessa (AL).

Para Quintella, seria mais fácil aprovar uma proposta deste tipo no parlamento do que obter êxito na criação de um imposto. “Cassinos e bingos as pessoas vão porque querem. É muito diferente de você aprovar o imposto que todos os brasileiros terão de pagar”, acrescentou o parlamentar alagoano. Durante o encontro, o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), destacou que a tramitação desta proposta enfrentará muitas resistências na bancada evangélica e em outras ligadas a grupos religiosos.

Segundo apurou o Correio, embora veja como uma alternativa para aumentar a arrecadação dos cofres públicos, o governo não vai se empenhar em elaborar uma proposta específica do Executivo para discutir a questão — cálculos iniciais mostram que o valor a ser arrecadado poderia chegar a R$ 20 bilhões por ano. Mas, se os congressistas toparem conduzir o debate, não haverá qualquer tipo de óbice no Planalto. Uma das crises de 2004 ocorreu porque Waldomiro — o mesmo flagrado no vídeo pedindo propina para Carlinhos Cachoeira — era responsável, naquela época, em elaborar um anteprojeto de lei para legalizar os bingos no país.

IsençãoPara além do debate em torno dos jogos, a quinta-feira foi de reuniões intensas do PT. Em São Paulo, a executiva nacional do partido aprovou resolução na qual defende a recriação da CPMF e as demais medidas de ajuste. Mas defendeu a apresentação de emendas para incluir uma faixa de isenção pra as pessoas de baixa renda. E um debate com os sindicatos e movimentos sociais para encontrar caminhos alternativos ao adiamento dos reajustes do funcionalismo e aos cortes nos programas sociais.

Em Brasília, Dilma reuniu-se com ministros do PT na hora do almoço, em um encontro que durou quatro horas. Debateram os cortes que precisam ser feitos pelo governo e os demais ajustes necessários ao orçamento e às medidas apresentadas ao Congressos. No fim da tarde, Dilma reuniu-se com Lula no Alvorada. De lá, o ex-presidente seguiu para um jantar com ministros do PT. Apesar do descontentamento por não ter sido consultado com antecedência, Lula tem trabalhado para “salvar o pacote” de Dilma e torná-lo mais palatável aos movimentos sociais.

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