Correio braziliense, n.19.109, 20/09/2015. Política, p. 5

Trem da alegria milionário

Mesa Diretora da Câmara analisa ascensão funcional de servidores de nível médio que custará R$ 247 milhões aos cofres públicos
 
Uma mudança nas exigências para técnicos legislativos da Câmara deve custar caro ao contribuinte. O assunto só não foi para frente porque os deputados da Mesa receberam estudos de servidores da própria Casa apontando gastos futuros de R$ 247 milhões, sendo R$ 134 milhões só com funcionários da ativa. Como revelou em primeira mão a coluna Brasília-DF, do Correio, na última terça-feira, a Mesa discute uma medida que obrigaria os futuros concurseiros ao cargo de técnico a terem diploma de curso superior - e não apenas nível médio.
 
A mudança não é apenas cosmética no crachá dos futuros servidores. A Presidência da República já vetou medida semelhante em 2009, afirmando que isso significa transformar cargos de nível médio em uma ascensão funcional. Em 2011, a Procuradoria-Geral da República (PGR) foi ao Supremo Tribunal Federal questionar a mesma tentativa feita na Receita Federal.
 
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), disse semana passada que a medida não será aprovada se tiver impactos financeiros. "Eu não sei se tem impacto", iniciou ele. "Se, efetivamente, não tiver impacto e for uma alteração meramente administrativa para ingresso no futuro, a gente o fará. Se tiver algum tipo de impacto, é óbvio que não faremos."
 
O suplente da Mesa, Luiz Mandetta (DEM-MS), afirmou ao Correio que alertou Cunha na reunião de terça-feira passada sobre a possibilidade de haver custos. Aí, o assunto foi adiado. Desde 2009, esta é a quarta vez que a Câmara tenta emplacar a medida. A última foi no ano passado, como noticiou o jornal. "Há aqueles que dizem que, lá na frente, os servidores técnicos pedirão reenquadramento", contou Mandetta. "Isso porque a lei retroage quando é a meu favor." Ele disse que o tema vai ser analisado de novo, mas sem data.
 
Os membros da Mesa receberam ao menos dois estudos de servidores de nível superior que condenavam a proposta. A reportagem não localizou representantes do sindicato dos funcionários do Congresso (Sindilegis). Mas, em 2013, quando houve outra tentativa de fazer o que é considerado por muitos um "trem da alegria", o diretor de Benefícios, Helder Azevedo, garantiu que não haveria custos para o contribuinte. Ele disse, à época, que seria apenas uma mudança no "status" do crachá dos técnicos, que seriam contratados com melhores qualificações.
 
Contrassenso
 
Mandetta afirma que é hora de poupar dinheiro. E destaca que exigir curso superior de cargos técnicos parece um contrassenso. Médico, ele afirma que isso pode trazer problema para os técnicos em enfermagem que trabalham no Departamento Médico da Casa. "O país está fazendo um esforço enorme com o Pronatec. Aí, você fecha essa possibilidade."
 
A reportagem apurou que o pedido para fazer a espécie de "graduação" dos técnicos partiu de servidores do Departamento de Polícia Legislativa (Depol). Lá, os agentes e seguranças não precisam ter curso superior para ingressar na Casa.
 
"Se, efetivamente, não tiver impacto e for uma alteração meramente administrativa para ingresso no futuro, a gente o fará. Se tiver algum tipo de impacto, é óbvio que não faremos"
 
Eduardo Cunha, presidente da Câmara
 
Quanto vai custar
 
Medida proposta pela Câmara já foi considerada transformação de cargos pela Presidência da República e pelo Ministério Público
 
Salário básico inicial
 
Técnicos: R$ 13.578
 
Analistas: R$ 20.384
 
Salário básico final*
 
Técnicos: R$ 20.185
 
Analistas: R$ 26.005
 
Aumento da despesa com técnicos
 
Com 1.391 funcionários ativos:     R$ 134 milhões
 
Com 1.449 aposentados:     R$ 113 milhões
 
Impacto total:     R$ 247 milhões por ano