Orçamento com déficit leva tensão ao mercado e dólar vai a R$ 3,633

 

Claudia Violante 
Fabrício de Castro

O Estado de São Paulo, n. 44513, 01/09/2015. Economia, p. B1


O mercado financeiro registrou novos sinais de tensão com a economia brasileira. Ontem, o dólar fechou em alta de 1,40% e atingiu R$ 3,633, a cotação mais elevada desde 14 de fevereiro de 2003. Com o resultado, a moeda americana encerrou agosto com valorização de 6,32% em relação ao real.

A desconfiança do mercado teve como pano de fundo o Orçamento de 2016 do governo federal encaminhado ao Congresso, cuja previsão é de um déficit primário de R$ 30,5 bilhões (0,5% do Produto Interno Bruto). Ou seja, a projeção é que não haverá receita suficiente para cobrir todos os gastos estimados. No fim de semana, o governo também desistiu da proposta de recriar a CPMF, o que dificultou ainda mais um acerto das contas.

A avaliação dos analistas foi que, com a previsão de déficit nas contas, o País corre mais riscos de perder o grau de investimento concedido pelas agências de classificação de risco. Se o Brasil perder o selo de bom pagador, o fluxo de recursos internacionais para o Brasil deverá diminuir.

"Não há nada de animador, nada de boas notícias", disse o superintendente de câmbio da corretora Tov, Reginaldo Siaca. "Desde que me entendo por gente, este está sendo um dos piores momentos para o mercado financeiro."Segundo um profissional de outra corretora, "o principal para a sessão de hoje (ontem) foi o Orçamento. O déficit é muito grande".

Em menor grau, o dólar foi influenciado por questões externas. O pessimismo se espalhou pelo mercado com a notícia de que o governo da China não deve mais agir para segurar o preço das ações no mercado acionário local - nas últimas semanas, a bolsa chinesa tem apresentado fortes quedas. No cenário externo, o mercado financeiro também espera pela sinalização do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estado Unidos) com relação a um possível aumento da taxa de juros americana em setembro.

O comportamento do dólar ainda foi influenciado ontem pela formação da ptax (taxa de câmbio calculada durante o dia pelo Banco Central). "Nesses dias, a volatilidade costuma ser sempre maior. Tanto que, depois da definição da taxa (perto das 13 horas), a briga parou e as cotações se acomodaram um pouco", disse Mário Battistel, gerente de câmbio da Fair Corretora. A ptax de ontem, que servirá para liquidação de derivativos cambiais hoje, terminou em RS 3,6467, alta de 1,89% no dia e de 745% no mês.

Bolsa. O mau humor com a economia brasileira também ficou evidente no mercado acionário. O Ibovespa encerrou o dia em baixa de 1,12%. No mês, a queda foi de 6,76%. "O Levy (ministro da Fazenda, Joaquim Levy) defendia a CPMF ao mesmo tempo em que a presidente Dilma desistia do imposto. Era a favor de um fiscal mais forte, e estão divulgando um número fraco", comentou Ignácio Crespo, economista da Guide. Segundo ele, as agências de classificação de risco estão de olho nas contas domésticas e, agora, podem antecipar uma revisão da nota, diante desse noticiário ruim. "O político é um risco para o fiscal. Estamos vendo a consolidação do risco já observada há algum tempo." / com Reuters