Novato deve relatar processo contra Cunha

Thiago Resende e Fabio Murakawa 

05/11/2015

Em seu primeiro mandato como deputado, o advogado Fausto Pinato (PRB-SP) é o favorito para ser o relator do processo que pode levar à cassação do mandato do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O presidente do Conselho de Ética da Casa, José Carlos Araújo (PSD-BA), prometeu fazer o anúncio, aguardado para ontem, ao meio dia desta quinta-feira. Mas, segundo fontes, os outros dois candidatos estão praticamente descartados por Araújo.

Ontem, relatos de bastidores davam conta de que, na avaliação do baiano, Vinícius Gurgel (PR-AP) não poderia relatar o caso diante da veiculação de imagens em que ele comemora efusivamente a eleição de Cunha para a presidência da Casa. Gurgel foi um dos principais articuladores da campanha do pemedebista, eleito em fevereiro passado.

José Geraldo (PT-PA), o terceiro nome sorteado para a vaga, era o favorito de Araújo, mas o Valor apurou que o presidente do Conselho se irritou quando o petista "adiantou o voto". Geraldo tem falado abertamente no Congresso Nacional que "não tem como arquivar o processo" de Cunha. E, a colegas, tem se mostrado pouco entusiasmado com a possibilidade de assumir a tarefa. Teme a pressão do partido e do governo, já que Cunha tem o poder de dar ou não andamento ao pedido de abertura de processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.

Segundo pemedebistas, a escolha de Pinato seria a mais favorável para Cunha, pois é o mais próximo do presidente da Câmara. Um dos principais integrantes do partido na Câmara, porém, crê que o relator tem pouca influência no processo. "Dependerá das provas que devem chegar ao Congresso sobre as tais contas [que Cunha é acusado de manter na Suíça]."

Pinato é acusado de ter recebido apoio de empresas que praticam as chamadas "pirâmides financeira" - uma prática irregular no Brasil. Em vídeo durante campanha eleitoral, Pinato defendeu a regularização do chamado "marketing multinível": quando o revendedor é compensado pelo que vende e pelos novos revendedores que atrai para a estrutura de vendas diretas.

No caso das pirâmides, não é a venda de produtos ou serviço que sustenta o negócio, mas a "captação" de pessoas que se dispõem a revende-lo. O deputado do PRB nega ter recebido dinheiro desse tipo de empresa. Ele também se recusou a falar com a imprensa antes da decisão do presidente do Conselho de Ética.

Eleito com apenas 22 mil votos, Pinato conseguiu uma vaga na Câmara por causa de Celso Russomanno, também do PRB paulista, o mais votado no Estado. Coube a Russomanno sair em defesa de Pinato: "Ele não é ligado a essa empresa [de pirâmide] não. Já falou pra mim".

Ontem, em entrevista coletiva, Araújo deu pistas de que realmente Pinato é seu nome favorito, ainda que o negasse quando questionado diretamente sobre isso. O presidente do Conselho de Ética passou a boa parte do tempo falando sobre a "rápida conversa" que teve com o deputado paulista, com o colega de bancada Russomanno e outros nomes indicados por Pinato, para quem telefonou - entre eles o ex-deputado Julio Semeghini,e o também ex-deputado Dimas Ramalho, vice-presidente do Tribunal de Contas de São Paulo, com quem o deputado trabalhou. "São informações importantes que eu tenho que ter para saber quem eu vou escolher", disse.

Segundo fontes, Russomanno vê na relatoria do caso Cunha uma grande oportunidade de Pinato "crescer". E crê que, por isso, não faria "nada de errado" no caso, sob risco de prejudicar o próprio Russomanno, líder nas intenções de voto à prefeitura de São Paulo.

Deputado manda retirar "painel do impeachment"

Fabio Murakawa

Um "painel do impeachment", instalado ontem por líderes da oposição para pressionar os deputados a se comprometer com o afastamento da presidente Dilma Rousseff, causou confusão entre a deputada Moema Gramacho (PT-BA) e manifestantes pró-impeachment no Salão Verde da Câmara, uma imensa área contígua ao plenário. O painel acabou retirado do local por ordem do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Enquanto a confusão ocorria, Cunha, que concedia entrevista coletiva, era alvo de uma "chuva de dólares" atirados por manifestantes do Levante Popular da Juventude, um movimento de estudantes de esquerda. As notas falsas de US$ 100 estampavam a face de presidente da Câmara em vez da do presidente americano Benjamin Franklin.

Os manifestantes estão "simbolicamente acorrentados" a uma pilastra no Salão Verde há uma semana. Eles permaneciam como uma espécie de guardiões do painel, confeccionado a pedido dos líderes de PSDB, PPS, DEM e Solidariedade para abrigar a assinatura de todos os deputados favoráveis ao impedimento da presidente Dilma Rousseff.

No fim da tarde, quando Cunha concedia entrevista coletiva, houve confusão com troca de sopapos entre Gramacho, um assessor da deputada e os manifestantes.

Instantes depois, a poucos metros dali, um jovem interrompeu aos berros a entrevista de Cunha e jogou ao ar um enorme punhado de "Cunha-dólares". Era uma referência às contas na Suíça que, segundo a Procuradoria-Geral da República, o deputado mantém com dinheiro desviado da Petrobras.

"Eu não vou, por causa da agressão de um militante infiltrado aqui, achar que isso vai me constranger e intimidar", afirmou o pemedebista, questionado sobre se, diante desse tipo de protesto, sentia-se em condições de continuar na presidência da Câmara.

Valor econômico, v. 16 , n. 3876, 05/11/2015. Política, p. A7