Dilma diz estar indignada com decisão de Cunha

Bruno Peres e Andrea Jubé 

03/12/2015

Em pronunciamento escrito a quatro mãos com ministros do núcleo político, a presidente Dilma Rousseff se disse ontem tranquila quanto à improcedência do pedido de impeachment encaminhado pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a quem dirigiu ataques ao fazer uma defesa de sua própria trajetória política e pessoal.

"Recebi com indignação a decisão de Cunha de processar o impeachment, não há ato ilícito praticado por mim", disse a presidente, em pronunciamento de pouco mais de três minutos. Ela observou que a decisão confronta o mandato que lhe foi conferido através de voto - foram mais de 54 milhões de votos em outubro de 2014.

Sem mencionar o nome de Eduardo Cunha, Dilma advertiu que não recaem sobre ela as acusações que pairam sobre o pemedebista no Conselho de Ética e no Supremo Tribunal Federal. "Não paira contra mim nenhuma suspeita de desvio, não possuo conta no exterior nem ocultei bens pessoais", disse a presidente, em alusão a acusações contra Cunha. "Nunca coagi ou tentei coagir instituições ou pessoas, meu passado e meu presente atestam minha idoneidade", reforçou.

Dilma lembrou que a imprensa publicou notícias de que haveria arquivamento dos pedidos de impeachment se o PT apoiasse Cunha no Conselho de Ética e disse que jamais concordaria com a "barganha".

"Eu jamais aceitaria ou concordaria com quaisquer tipos de barganha, muito menos aquelas que atentam contra as livres instituições democráticas, bloqueiam ou ofendam os princípios morais e éticos que devem governar a vida pública".

Dilma procurou demonstrar que tem convicção do arquivamento do pedido de deposição do mandato por aliados no Congresso Nacional.

"Meu passado e meu presente atestam minha idoneidade e compromisso com a coisa pública", disse a presidente. "Não podemos deixar as conveniências e os interesses indefensáveis abalarem a democracia e a estabilidade de nosso país. Devemos ter tranquilidade e confiar nas nossas instituições e no Estado democrático de direito".

Dilma abriu a sua fala com a vitória do governo na sessão conjunta do Congresso Nacional. Enquanto Cunha anunciava a abertura do processo de afastamento, o presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL), conduzia com mão de ferro a votação que garantiu a aprovação do projeto que atualiza a meta fiscal de 2015. Segundo Dilma, o projeto permite "a continuidade dos serviços públicos e fundamentais para todos os brasileiros".

Na tentativa de demonstrar tranquilidade e respaldo político, Dilma chamou ao Palácio os ministros das siglas que formam a coalizão de apoio ao governo. A presidente discursou ao lado dos principais ministros do núcleo político - Jaques Wagner (Casa Civil) e Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) - além de José Eduardo Cardozo (Justiça) e Luís Inácio Adams (Advocacia-Geral). Também estavam presentes ministros de vários partidos aliados, como PMDB - Celso Pansera (Ciência e Tecnologia) e Henrique Alves (Turismo) -, Gilberto Kassab (Cidades), do PSD, Aldo Rebelo (Defesa), do PCdoB, Gilberto Occhi (Integração Nacional), do PP. O ministro dos Portos, Hélder Barbalho, do PMDB, estava a caminho do Planalto.

A avaliação interna no Planalto é que a aprovação hoje, na sessão do Congresso, do projeto de lei que atualiza a meta fiscal joga por terra os fundamentos do requerimento de impeachment deferido por Cunha. Além disso, o governo argumenta que o Congresso ainda não referendou a decisão do Tribunal de Contas da União que reprovou as contas de Dilma relativas a 2014 e a presidente tem chances de reverter o entendimento. A determinação é reunir a base e partir para o enfrentamento no Congresso.

Valor econômico, v. 16 , n. 3896, 03/12/2015. Política, p. A7