Delegado pede ao STF autorização para ouvir Lula em inquérito da Lava Jato

 

Andreza Matais Talita Fernandes Beatriz Buüa
O Estado de São Paulo, n. 44524, 12/09/2015. Política, p. A4

A Polícia Federal solicitou ao Supremo Tribunal Federal autorização para tomar o depoimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em inquérito da Operação Lava Jato. Ele é apontado, em relatório da PF, como possível beneficiário do esquema de corrupção na Petrobrás. O texto diz que o esquema na estatal possibilitou a formação da base de apoio da gestão Lula no Congresso.

O pedido para que Lula seja ouvido é parte dos procedimentos solicitados em inquérito em que é apurada a existência de uma suposta organização criminosa no esquema de corrupção na Petrobrás. Para a PF, Lula pode ter sido "beneficiado pelo esquema em curso na Petrobrás, obtendo vantagens para si, para seu partido, o PT, ou mesmo para seu governo".

"Dentro dessa lógica, os indícios devem ser buscados não apenas no rastreamento e identificação de vantagens pessoais que por ventura foram obtidas pelo então presidente, mas também nos atos de governo que possibilitaram que o esquema se instituísse e fosse mantido", escreveu o delegado Josélio Azevedo de Sousa no documento.

Além de Lula, a PF pede a oitiva de Ideli Salvatti, ex-ministra da Secretaria de Relações Institucionais, do ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência Gilberto Carvalho (governo Dilma Rousseff) e do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (governo Lula). O ex-presidente disse não ter sido informado (Mais informações nesta página).

O pedido da Polícia Federal é uma diligência referente a um dos inquéritos abertos no Supremo e, por isso, depende de autorização do ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato na Corte. Mas, antes da decisão, o pedido será submetido ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Cabe ao chefe do Ministério Público Federal dar um parecer sobre o pedido da PF, já que a Procuradoria-Geral é a autora do inquérito.

A PF diz que a presidente Dilma, ex-ministra de Minas e Energia e da Casa Civil e ex-presidente do Conselho de Administração da Petrobrás, não pode ser investigada por força da Constituição: o "presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções".

Delatores. No ofício, o delegado diz que "a investigação não pode se furtar de trazer à luz da apuração dos fatos a pessoa do então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva que, na condição de mandatário máximo do país, pode ter sido beneficiado pelo esquema em curso na Petrobrás, obtendo vantagens para si, para seu partido, o PT, ou mesmo para seu governo, com a manutenção de uma base de apoio partidário sustentada à custa de negócios ilícitos na referida estatal."

O pedido para ouvir Lula se baseia em depoimentos de delatores da Lava Jato - o doleiro Alberto Youssef, o ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa e o ex-gerente da estatal Pedro Barusco. A PF destaca que Costa disse em depoimento que "soube através de José Janene que o então presidente Lula ligou para o então presidente da Petrobrás, José Eduardo Dutra, exigindo que o declarante fosse nomeado diretor de Abastecimento". A PF entende que não há como dissociar o esquema de poder político dos desvios na Petrobrás.

PARA ENTENDER

Investigação cita políticos


O pedido da PF para que Lula seja ouvido na Lava Jato foi encaminhado ao Supremo Tribunal Federal por tratar-se de diligência referente a um inquérito aberto na Corte, mas isso não significa que Lula é ou será, necessariamente, investigado no STF.

O pedido está em um inquérito em que é apurada existência de organização criminosa no esquema alvo da Lava Jato, e entre os investigados estão políticos que só podem ser investigados no Supremo. Lula só será alvo de inquérito na Corte se houver pedido da Procuradoria e, ainda sim, se houver fato em que ele está ligado a alguma autoridade com foro privilegiado.

Petista encerra agenda na Argentina

Ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tira foto com fãs durante inauguração do Centro de Inovação dos Trabalhadores da Universidade Metropolitana para a Educação e o Trabalho, em Buenos Aires, marcando fim da jornada de três dias na Argentina. O petista permaneceu duas horas no local, cercado por seguranças.

No Piauí, Dilma se queixa do "quanto pior, melhor"

A presidente Dilma Rousseff repetiu ontem, em Teresina (PI), o bordão que vem usando para se defender: alguns grupos estão torcendo pelo "quanto pior, melhor".

"Devemos repudiar estes que querem sempre o desastre, sempre a catástrofe", disse Desde agosto, quando a crise se intensificou, ela insiste nessa estratégia.

Ex-presidente não comenta; aliados o defendem

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem, em Buenos Aires, não ter recebido qualquer requisição da Polícia Federal para ouvi-lo no caso de desvios na Petrobrás investigados pela força-tarefa da Operação Lava Jato. "Eu não sei como comunicaram a você e não me comunicaram. É uma pena", disse Lula ao Estado.

Para o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, o pedido da PF faz parte da normalidade democrática. "Numa democracia um delegado tem o direito de ouvir quem quer que seja", afirmou.

Segundo ele, a avaliação inicial dos advogados do ex-presidente é de que o pedido foi feito ao Supremo Tribunal Federal e não ao juiz Sérgio Moro porque o depoimento não faz parte da Operação Lava Jato, mas de um outro processo, iniciado na época em que Lula ainda era presidente, que tramita no STF. Okamotto não soube dizer qual seria o processo. O presidente do Instituto Lula destacou o trecho do requerimento no qual o delegado admite que Alberto Youssef e Paulo Roberto Costa não têm provas sobre a suposta participação de Lula no esquema de desvios da Petrobrás. "É aquela velha tese de que o Lula não sabia de nada", disse Okamotto.

No documento, o delegado Josélio Sousa escreve: "Os colaboradores, porém, não dispõem de elementos concretos que impliquem a participação direta do presidente Lula nos fatos". Procurados, o PT e o governo federal não se manifestaram. 

Seguranças barram repórter do ‘Estado’

• No último compromisso de Lula em Buenos Aires, seguranças e um assessor do ex-presidente tentaram impedir o trabalho do correspondente do Estado, Rodrigo Cavalheiro. O repórter chegou a ser empurrado contra a parede. Sob protesto de outros jornalistas, ele também foi detido por um policial argentino, que exigiu sua identificação e o liberou em seguida.