Título: DF cada vez mais livre do cigarro
Autor: Braga, Juliana
Fonte: Correio Braziliense, 30/08/2011, Brasil, p. 8

O Distrito Federal é a segunda unidade da Federação com o menor número de fumantes e a 11º no ranking de moradores que abandonaram o vício, segundo levantamento feito pelo Instituto Nacional de Câncer.

Deyverson Rafael Cescaro começou a fumar aos 15 anos de idade em Cataguases, no interior de Minas Gerais. Fumava cigarros de palha quando saía para conversar com os vizinhos, que davam o tabaco para o adolescente. Quando veio morar em Brasília, o vício, mesmo que moderado, continuou e, então, ele precisou passar a comprar as carteiras. Nunca encontrou dificuldades, mesmo sendo menor de idade. Hoje, aos 24 anos, tenta mais uma vez parar de fumar. Desta vez por conta da gravidez da esposa. "Eu me preocupo com a possibilidade de o meu filho fumar um dia. Sei que não é isso que determina, mas podem aumentar as chances", acredita.

Deyverson retrata bem o perfil dos fumantes no país. O morador do Distrito Federal vive na unidade da Federação onde há a segunda menor quantidade de pessoas viciadas em tabaco (13,4%) e onde o número de ex-fumantes (19,2%) é superior ao da média nacional (18,2%), segundo publicação divulgada ontem pelo Instituto Nacional de Câncer (Inca), que reuniu dados de pesquisas feitas entre 2002 e 2009. Em 1997, de acordo com a Secretaria de Saúde do DF, 39% dos moradores da capital do país fumavam.

Para o pneumologista e professor da Universidade de Brasília (UnB) Carlos Alberto Viegas, o DF se destaca devido ao alto poder aquisitivo dos moradores. "Hoje, sabemos que o tabagismo se concentra nas camadas com menor poder aquisitivo e isso está ligado ao acesso à informação", explica o especialista. Os dados divulgados pelo Inca confirmam a visão do professor. Quanto menores a renda e a escolaridade, mais cedo o fumante entra no vício. Dos entrevistados com até um ano de estudo, 40,8% começaram a fumar antes dos 15 anos, percentual que cai para 12,9% entre os que estudaram mais de 11 anos. O mesmo ocorre com a renda. Enquanto 21,8% dos entrevistados que vivem com até um quarto de salário mínimo começaram a fumar com menos de 15 anos, somente 12,5% tiveram o mesmo comportamento entre os que ganham mais de dois salários mínimos.

Precoce Deyverson também seguiu a onda do vício precoce. De acordo com o levantamento do Inca, 77,9% dos fumantes no Brasil iniciam o hábito até os19 anos de idade. No Centro-Oeste, o percentual de adolescentes fumantes entre 13 e 15 anos que nunca foram impedidos de comprar cigarros em função da idade chega a 88,7%. No Nordeste, chega a 89,9%. A faixa etária em que a maioria inicia o vício é entre 17 e 19 anos, intervalo no qual 31,9% dos entrevistados começaram a fumar.

Para o pneumologista Ricardo Meirelles, da Divisão de Controle do Tabagismo do Inca, falta fiscalização para impedir o acesso dos jovens ao tabaco. "A maior preocupação é porque entre 50% e 60% desses jovens fumantes vão se tornar dependentes da nicotina. Se não houver fiscalização para cumprir a lei, os menores vão experimentar e vão acabar se viciando", avalia. As mulheres são mais precoces do que os homens. A porcentagem das fumantes que começam antes dos 15 anos é de 21,9%. Entre eles é de 18%.

Outro fator que influencia o hábito de fumar é a exposição ao tabaco diariamente dentro de casa. Os valores variam de cidade para cidade, mas em Goiânia, por exemplo, 34,6% dos adolescentes têm pais fumantes. Desses, 48,5% também fumam. Ricardo defende que uma das estratégias para combater a indústria, que tenta seduzir o jovem com sabores e cheiros diferentes, deve informá-lo sobre os males mais precoces do cigarro. "Não adianta falar para um jovem que ele terá enfisema aos 50 anos. Está muito distante", critica. Ele sugere campanhas que tratem de impotência para os rapazes, ou do envelhecimento precoce da pele para as garotas. "O jovem tem que enxergar que perde sua liberdade e começa a ser manipulado por uma indústria", alerta.