CYNTHIA DECLOEDT
O Estado de São Paulo, n. 44536, 24/09/2015. Economia, p. B4
A disparada da cotação do dólar está acentuando a pressão sobre os bônus da Petrobrás negociados no exterior, com alguns deles operando em patamar que sinaliza a percepção de que a companhia pode ter de reestruturar a dívida.
Nos preços, os investidores embutem também a instabilidade política no Brasil e a percepção de que a companhia deve perder o grau de investimento por uma segunda agência de crédito de risco.
Cada bônus reflete de maneira particular a desconfiança do mercado em relação à estatal. Os papéis com vencimento em 2024, normalmente os mais líquidos, eram cotados a 72% do valor de face nesta quarta-feira, patamar a partir do qual os investidores consideram haver perspectiva de renegociação ou reestruturação de suas dívidas. O bônus de 2023, por sua vez, operava a 65% do valor de face. Ambos oferecem retorno de cerca de 11,5%.
Profissional de um banco estrangeiro nota que a rentabilidade desses bônus está em nível equivalente a CDI somado a um prêmio de 6,8%. “Se compararmos ao retorno de CDI mais spread de 1,85% oferecido na série de cinco anos da emissão que está sendo feita de debêntures, fica claro que os bônus estão sendo negociados em níveis estressados”, comentou a fonte que não quis ter o nome citado.
Petrobrás passa por crise financeira
Ele lembra que a Petrobrás tem de rolar dívidas relacionadas a bônus da ordem de US$ 6 bilhões ao ano, excluindo juro, de 2016 a 2018. “É um valor alto, considerando-se a situação da companhia, sua incapacidade de fazer novas captações no exterior e o fato de que sua base de investidores diminuiu com a perda do grau de investimento”, acrescentou o profissional.
A fonte nota que muitos investidores de bônus da Petrobrás já saíram do papel antes mesmo do corte em sua nota por uma segunda agência de risco, para não correrem o risco os venderem “na força”, quando o rebaixamento realmente acontecer. O mesmo profissional diz ainda que os montantes de dívidas com vencimento a partir do ano que vem são praticamente impossíveis de serem refinanciados com as captações locais.
“O câmbio distorcido chama a atenção de investidores que estavam preocupados com o endividamento de outras empresas e agora pensam também na Petrobrás. Tem gente que acredita que a empresa terá de reestruturar a sua dívida, porque não consegue vender ativos, não consegue elevar o preço da gasolina, ao mesmo tempo que sua dívida em dólar cresce”, disse um outro profissional que opera em Nova York.
Exposto. Já outro profissional comentou que no intervalo de preço entre 70% do valor de face e 50% do valor de face, os bônus ficam expostos a oscilações bruscas, porque estão patamares pouco atraentes para investidores que compram para manter os papéis em suas carteiras.
A Petrobrás tem cerca de US$ 50 bilhões em títulos de dívida emitidos no exterior em várias moedas, representando cerca de um quarto do total das captações externas feitas por empresas e pelo Tesouro por meio de bônus. A companhia, gozando do confortável status do de grau de investimento, aproveitou o bom momento de liquidez externa e captou elevados montantes, superando os US$ 10 bilhões anualmente.
De acordo com o balanço da estatal do segundo trimestre, desde 2006, a dívida total da Petrobrás saltou 854,8%, para R$ 415,5 bilhões, dos quais R$ 306 bilhões atrelados à moeda norte-americana. Essa conta foi baseada em um dólar a R$ 3,10. Por outro lado, o Ebitda (sigla em inglês para Lucros Antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização) cresceu 48,9% no mesmo período, fazendo com que em junho, pela primeira vez, a capacidade de geração de caixa, medida pelo Ebitda, ficasse abaixo da dívida de curto prazo, então em R$ 44,6 bilhões.