Correio braziliense, n. 19127, 08/10/2015. Opinião, p. 13

O ajuste fiscal e o Orçamento do Sistema

08/10/2015 - Fonte:  Correio Braziliense - Edição Digital 

Uma das propostas em estudo pelo governo federal para reduzir o deficit do Orçamento 2016 é a retenção de até 30% do valor repassado ao Sistema S, constituído pelas entidades Senai, Sesi, Senac, Sesc, Sebrae, Senar, Sest, Senat e Sescoop. A medida foi apresentada ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy, pelo senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), de forma unilateral.

Sem conhecimento e participação das entidades que integram o Sistema S, o parlamentar propõe uma espécie de Desvinculação de Receitas da União (DRU), que permite ao governo reter parte dos valores destinados ao Sistema S. Os defensores dessa equívoca proposta de confisco seguramente desconhecem o importante papel desempenhado ao longo de seis décadas pelas instituições que compõem o Sistema S na formação de mão de obra para o setor produtivo e no fortalecimento da educação empreendedora para os pequenos negócios do país, representados por milhões de microempreendedores e empresários de micro e pequenas empresas.

Nos últimos anos, a agenda continuada de ingerências do governo federal no Sistema S tem encontrado forte resistência por parte das confederações e proporcionado amplo debate entre doutrinadores administravistas, notadamente quanto a interpretações do conceito e do destino dos recursos administrados pelo Sistema S. O TCU tem decidido que o sistema não integra a administração pública. "É pacífica, contudo, a posição da corte de que há sujeição dos componentes do Sistema S à fiscalização do tribunal, como decorrência do caráter público dos recursos colocados à sua disposição", segundo Marcos Bemquerer Costa.

O ex-ministro do STF, Ilmar Galvão, adere a esse entendimento alegando que, quando o produto das contribuições ingressa nos orçamentos das entidades dos Serviços Sociais Autônomos, perde o caráter de recursos públicos. Os relatórios anuais de gestão das entidades que compõem o sistema permitem, de forma clara e transparente, que os agentes públicos envolvidos com a ideia do confisco conheçam a excelência das ações programáticas levadas avante e os expressivos resultados quantitativos e qualitativos alcançados em todo o país, sobretudo nas regiões Norte e Nordeste.

O Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) realizou 3,64 milhões de matrículas em cursos de formação profissional em 2014, dos quais 1 milhão foram ministrados na modalidade a distância. O Serviço Social da Indústria (Sesi) efetivou, no mesmo ano, 2,2 milhões de matrículas em educação continuada, voltadas ao desenvolvimento das competências requeridas pelo setor industrial. O Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) registrou, em 2014 ,desempenho superior a 100% nas metas mobilizadoras. Atendeu a cerca de 8,1 milhões de microempreendedores individuais e micro e pequenos empresários e implementou a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa em 2.243 municípios.

O impacto que a proposta de confisco de valores poderá causar nas ações programáticas das entidades pode ser observado nos indicadores e dados da pesquisa Economia Urbana Informal - IBGE - Ecinf 2003, que investigou o funcionamento e a capacidade de geração de postos de trabalho e rendimento de 10.335.962 pequenas unidades produtivas do setor informal urbano do país. Estudos do Sebrae estimam que 23,6 milhões de pessoas realizam atividades nos empreendimentos formais e informais no país. A relação desses empreendedores formais e informais com o grupo familiar atinge cerca de 70,8 milhões de pessoas, que dependem social e economicamente dos ganhos auferidos com as atividades desenvolvidas nos setores formal e informal da economia. Os indicadores representam 34,6% da população de 204.450.649 habitantes do país.

A aprovação do confisco representará retrocesso no crescimento organizacional das instituições do Sistema S. A diminuição de receitas impactará diretamente nas metas e objetivos do aprimoramento continuado do capital humano, social e cultural e no desenvolvimento de instrumentos e mecanismos mobilizadores de informação, apoio, orientação, capacitação, formação e consultoria, voltados para o aumento da competitividade e do desenvolvimento sustentável de milhões de micros e pequenas empresas no país, que representam mais de 95% das empresas brasileiras, respondem por 27% do PIB no Brasil e por 52% do total de empregos com carteira assinada - mais de 17 milhões de vagas.