Valor econômico, v. 16, n. 3929, 25/01/2016. Política, p. A6

Ameaçado por operações da PF e MPF, Lula prepara candidatura em 2018

Ex-presidente vem repetindo que será candidato dentro de dois anos e promete participar de eleições paulistanas neste ano

 
Ex-presidente Lula
 
      Da última vez em que esteve na Polícia Federal, em Brasília, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi surpreendido quando o delegado, ao responder a uma pergunta de seu advogado Nilo Batista, disse que ele seria ouvido na condição de investigado. Batista então disse que Lula não iria depor. O delegado então corrigiu e disse que ele seria ouvido na condição de informante.
      Lula já foi ouvido antes como informante na Polícia Federal. O presidente do PT, Rui Falcão, também. Nessa condição, a pessoa não está formalmente sob investigação. Para o ex-presidente da República, no entanto, o incidente só reforçou a suspeita que o levou a recorrer aos serviços do advogado Nilo Batista: sua cabeça é o objetivo final de procuradores e delegados nas investigações atualmente em curso no Ministério Público e na Polícia Federal. O "grande prêmio" - como diz o próprio Lula.
      A contratação de Nilo Batista já configurou uma mudança na estratégia de Lula. Até há bem pouco tempo, quando os amigos o advertiam de que o objetivo de delegados e procuradores era prendê-lo, Lula dava de ombros. Agora não só contratou Batista como tem ouvido um grupo de advogados mais próximos. E está no ataque, como demonstra a reveladora entrevista que concedeu a blogueiros.
      Na ofensiva, Lula atacou como nunca antes as investigações conduzidas pela Polícia Federal e o Ministério Público e a imprensa. Disse que agora não vai mais deixar passar batido as denúncia e vai abrir processos em série. Só na última sexta-feira protocolou uma interpelação judicial para que o apresentador de TV João Dória Jr, pré-candidato do PSDB a prefeito, explique uma frase na qual diz que Lula é "um sem-vergonha e cara de pau", anunciou a abertura de um novo processo contra a revista "Veja" e bateu firme no promotor que o acusa de lavagem de dinheiro, classificando sua conduta de "irregular" e "arbitrária".
      Também fez um gesto calculado em direção ao PT. Não só defendeu o partido, como também o ex-ministro José Dirceu e o ex-tesoureiro João Vaccari, o que não vinha fazendo. Lula disse que a prisão de ambos é injusta. Até o PT, ao se manifestar sobre a última prisão de Dirceu, foi mais comedido.
      Entremeando "fanfalulices" - neologismo criado por amigos para se referirem às bravatas do ex-presidente - e ameaças, Lula "mostra que está pronto para reagir e ao reagir está se preparando para a campanha eleitoral de 2018", dizem amigos e interlocutores mais frequentes. Na prática, Lula somente não será candidato à sucessão da presidente Dilma Rousseff por algum motivo de força maior ou se não quiser. O presidente do PT, Rui Falcão, costuma dizer que não tem Plano B, só o Plano A: Lula. E apenas vai discutir um eventual Plano B, se algum dia o Plano A não puder ser cumprido.
      Os cenários feitos no PT são mais de curto prazo, mas também são feitas projeções para até 2018. O primeiro embate é o impeachment. Outra prioridade é a estabilização da economia. Ninguém aposta na volta do crescimento, no atual governo, sobretudo em níveis como o de 2010, mas pelo menos que Dilma consiga trazer a inflação para o centro da meta. Já seria uma ajuda para 2018.
      Antes de 2018, no entanto, tem 2016. A prioridade do PT é reeleger Fernando Haddad em São Paulo, um ambiente hoje hostil. Comparado ao pessimismo de boa parte da militância, Lula exala otimismo. Na entrevista aos blogueiros, tocou no assunto. "Tem gente que acha que o PT acabou, e vocês vão ver. Eu acho que o Haddad vai ser reeleito em São Paulo, só pra falar a maior cidade", disse.
      Em particular, o diagnóstico de Lula é bastante parecido. O ex-presidente disse aos amigos que Haddad será reeleito porque não tem adversários. Nem mesmo a senadora Marta Suplicy, hoje no PMDB, que perdeu a prefeitura para José Serra (PSDB) em 2004, mas deixou o cargo com bons índices de aprovação. A eleição em São Paulo é fundamental para o PT. Se Haddad se eleger, o PT pode declarar vitória, mesmo que eleja menos prefeitos no país. A expectativa é manter mais ou menos o número atual. Na Grande São Paulo, o PT já aposta que Luiz Marinho deve fazer o sucessor em São Bernardo do Campo.
     Vencendo em São Paulo e se Dilma estabilizar a economia - o cenário mais otimista -, o PT espera entrar mais competitivo em 2018. Se Lula não for o candidato, há quatro alternativas sobre a mesa: os ministros Aloizio Mercadante (Educação) e Jaques Wagner (Casa Civil), o ex-governador Tarso Genro (RS) e o próprio Haddad, se vencer a eleição. Entre os aliados, há duas alternativas consideradas.
     A primeira seria do PMDB, apesar do afastamento do governo de setores do partido. Um nome seria o do prefeito do Rio, Eduardo Paes. Não é à toa que o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) vem subindo mais uma vez o tom de seus ataques ao PMDB - ele é a outra opção, embora vista com muita desconfiança no PT pelo destempero verbal. Lula está chateado com Ciro desde que ele declarou que o ex-presidente não era corrupto mas que seu governo não combateu a corrupção como deveria. "Se eu não fiz nada, quem fez?" perguntou Lula a um interlocutor, lembrando que fez o Portal da Transparência, a Controladoria-Geral da União (CGU) e deixou a Polícia Federal investigar.
     O que o próprio Lula tem dito e repetido sobre 2018 é que será sim candidato, se for para defender as conquistas de seu governo. Mas esteja ou não no palanque principal, sua intenção é participar de qualquer jeito da campanha eleitoral. Promete que já estará em ação nas eleições municipais de outubro, especialmente na campanha de Fernando Haddad à reeleição em São Paulo.
     Numa entrevista recente, Lula foi colocado diante do fato de que, em apenas um ano, sua rejeição saltara de 33% para 55%. O ex-presidente não demonstrou maior preocupação. Respondeu que era possível transformar rejeição em aprovação em apenas dois meses de uma campanha cujos pilares Lula parece assentar desde já, quando promete processar desde jornalistas a personalidades que cometam alguma imprudência como o lutador de MMA Wanderlei Silva. Ele postou em uma rede social foto que seria de Fábio, filho de Lula, abastecendo uma lancha de luxo. A foto não era de Fábio.
     Lula também passou a dizer em público, sem cerimônia, o que antes apenas falava em privado da presidente Dilma Rousseff. Na hipótese de o melhor cenário petista não se concretizar e Dilma não estabilizar a economia, trazendo a inflação para o centro da meta, o ex-presidente já tem a quem culpar - ela mesma, a presidente que não ouviu seus reiterados conselhos.

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MP investiga ex-presidente por lavagem

25/01/2016 - Fonte:  Valor Online 
 

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva passou à condição de investigado em outra frente de apuração criminal, conduzida pelo Ministério Público estadual de São Paulo (MP-SP). Até agora, Lula figurava como suspeito apenas no procedimento em que a Procuradoria da República do Distrito Federal apura suposto tráfico internacional em favor da Odebrecht. Nas operações Lava-Jato e Zelotes, por ora, o ex-presidente da República depôs apenas como informante.

A promotoria criminal do fórum da Barra Funda, em São Paulo, sustenta dispor de uma "vasta gama de prova documental, testemunhal e circunstancial" que apontam para possível lavagem de dinheiro decorrente do crime de estelionato que envolveria o triplex de quase 300 metros quadrados localizado na Praia das Astúrias, no Guarujá (SP). O imóvel foi reformado pela OAS ao custo de R$ 788 mil, segundo documentos anexados ao inquérito policial - a empreiteira é umas das investigadas na Lava-Jato por suspeita de integrar um suposto cartel de empresas que pagaria propinas a políticos em troca da obtenção de contratos bilionários com a Petrobras.

O inquérito em que Lula é investigado é um desdobramento de ação penal por estelionato, lavagem de dinheiro e organização criminosa movida contra dirigentes da Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo (Bancoop) e o ex-presidente do Sindicato dos Bancários e ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, que tramita na 5ªvara criminal central de São Paulo e está em fase de alegações finais. Vaccari foi preso preventivamente pela Lava-Jato em 15 de abril de 2015 e é acusado de corrupção e lavagem de dinheiro envolvendo contratos da Petrobras.

O MP-SP alega que 3 mil famílias foram vítimas de estelionato e tentativa de estelionato no caso Bancoop. A partir de 2010, a OAS assumiu algumas obras inacabadas da cooperativa - que faliu em 2006 -, entre as quais a do Guarujá e a de um condomínio residencial na região da Liberdade, em São Paulo.

De acordo com o MP-SP, Vaccari é dono de um apartamento no mesmo prédio em que a OAS reformou o apartamento que a investigação afirma pertencer à família de Lula, no litoral paulista. O imóvel tem estimativa de valor de R$ 1,8 milhão, segundo informações juntadas ao inquérito.

Até agora, o promotor de Justiça Cássio Conserino já tomou o depoimento de nove moradores do prédio, ouviu proprietários e funcionários do edifício e ainda dois engenheiros da OAS. Testemunhas confirmam que o imóvel era frequentado por familiares de Lula e dizem que José Aldemário Pinheiro Filho, o Leo Pinheiro da OAS - condenado em primeira instância a 16 anos por corrupção, organização criminosa e lavagem de dinheiro pela Lava-Jato - esteve no edifício mais de uma vez.

O apartamento que pertenceria à família de Lula é o único que dispõe de elevador privativo, de acordo com a promotoria.

No sábado, a assessoria de imprensa do Instituto Lula publicou nota no site da entidade em que afirma que o promotor Cássio Conserino "violou a lei" e adotou conduta "arbitrária" e "leviana" ao informar à imprensa que já dispões de indícios de prova suficientes para acusar o ex-presidente. A nota tem o título "Violência contra Lula: promotor anuncia denúncia sem ouvir defesa".

No comunicado, a assessoria de Lula afirma que "o promotor violou a lei e até o bom senso ao anunciar, pela imprensa, que apresentará denúncia contra o ex-presidente Lula e sua esposa, Marisa Letícia, antes mesmo de ouvi-los".

A nota diz também que "a atitude do promotor é incompatível com o Estado democrático de direito e com procedimento imparcial que se espera de um defensor da lei, além de comprometer o prestígio e a dignidade da instituição Ministério Público".

Pela assessoria do instituto, Lula e sua mulher alegam que nunca ocultaram que tinham uma cota no empreendimento no litoral paulista no qual está localizado o triplex, e que o investimento foi declarado à Receita Federal. "Esse fato comprova que Lula e Marisa não cometeram ocultação de patrimônio e nem lavagem de dinheiro", diz a assessoria do ex-presidente.

Ao Valor, o promotor Conserino disse que "tudo o que afirmei está respaldado na investigação". Em nota divulgada no sábado, o promotor afirmou que não houve antecipação da denúncia. O Ministério Público só exteriorizou, em homenagem ao interesse público que norteia a questão, que as provas coligidas apontam para a possibilidade de uma denúncia".

Ainda segundo a nota de Conserino, "informar a sociedade sobre uma investigação de evidente interesse público, por meio de uma imprensa livre, não me parece violar a lei, especialmente porque o sigilo da investigação foi baixado [retirado]."

Conserino diz também, na nota: "oxalá os investigados consigam refutar toda a gama de prova testemunhal, circunstancial e documental que apontam para possível crime de lavagem de dinheiro entre outros".

Na avaliação do promotor de Justiça, "o trabalho é do Ministério Público com a participação de outros promotores e não tem qualquer tom personalíssimo".

O membro do Ministério Público paulista afirma ainda, no comunicado, que "além disso somos promotores de Justiça e trabalhamos em prol e para a sociedade, que merece tomar ciência de investigações dessa envergadura".