Valor econômico, v. 16, n. 3926, 20/01/2016. Internacional, p. A9

Fórum Econômico começa com países emergentes sob pressão

Assis Moreira e Daniel Rittner | De Davos (Suíça)

O crescimento da economia mundial em 2016 tende a ser pior do que foi em 2015, e o Brasil em recessão precisa baixar a sua taxa de juro real, a mais alta do mundo, disse ao Valor o professor Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de Economia, na véspera da abertura do Fórum de Davos, o maior encontro global de empresários, executivos, acadêmicos e autoridades políticas e econômicas.

Os mercados globais já perderam mais de US$ 4 trilhões neste ano. Além disso, a China anunciou o seu menor crescimento em 25 anos, o que indica que o ano será mais duro do que se pensava.

A pressão sobre os emergentes continua. A aversão ao risco segue elevada, os preços das commodities, em baixa, e as cotações do Petróleo continuam gerando inquietações. O Instituto Internacional de Finanças (IIF) estima que o fluxo de portfólio para essas economias em 2015 foi de apenas US$ 41 bilhões, numa redução de 85,6%, comparada à média de US$ 285 bilhões anual entre 2010-2014.

"A economia global terá o menor crescimento desde a crise de 2008-09, por causa dos efeitos assimétricos do colapso do preço do Petróleo´´, disse Stiglitz. Para ele, num cenário já ruim, o consumo vai se retrair ainda mais, já que os países produtores de Petróleo, que costumam ser grandes gastadores, terão enorme queda de receita.

Ele destaca que a crise na zona do euro não acabou e está apenas suspensa. Já os Estados Unidos "continuam tendo boa sorte". Quanto à China, ela desacelera, mas quão sério isso é ainda é questão de debate, acha o professor.

Stiglitz é uma das personalidades com quem o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, se encontrará à margem do Fórum Econômico Mundial. E o que ouvirá do professor é claro. "Um dos problemas que o Brasil tem é uma taxa de juro real excessivamente alta, maior do que a de qualquer outra economia, e é inevitável que isso desacelere o crescimento econômico", disse. "Espero discutir políticas para estimular o crescimento do Brasil, o país está em recessão."

A diferenciação entre Brasil, Argentina e México começou a ser feita. Em entrevista ao Valor, Randall Stephenson, presidente global da AT&T, maior empresa de TELEFONIA dos EUA, rejeitou a noção de pessimismo geral na economia mundial, sublinhando que o Brasil é um dos países com uma situação única. "Há lugares no mundo que estão sob pressão por causa dos preços das commodities, da queda do preço do PETRÓLEO, e o Brasil é um deles", afirmou. "Mas nem todos os mercados são iguais. A Argentina está fazendo coisas que parecem muito positivas."

O executivo destacou que o México "está fazendo coisas incríveis e estamos investimento pesadamente nesse país". Mas ele rejeitou a possibilidade de as grandes empresas ignorarem o Brasil. "O Brasil é tão grande que é preciso ficar de olho sempre, não dá para deixar o Brasil de lado."

Com a compra da DirecTV pela AT&T, por US$ 49 bilhões, no ano passado, a gigante de TELEFONIA americana entrou no mercado brasileiro de varejo. A AT&T entrou na DirecTV Latin América, controladora da Sky, a segunda maior rede de TV paga do Brasil. Embora tenha dito recentemente que poderia vender ativos na América Latina, incluindo no Brasil, Randall se disse otimista com o negócio no mercado brasileiro. "É o nosso principal mercado na América Latina, nosso negócio lá é bom."

Por sua vez, um empresário latino-americano, que preferiu não se identificar, lamentou a situação brasileira e completou: "Vamos acabar tendo inveja dos hermanos argentinos."

Já o empresário israelense Sami Sagol espera um "zigue-zague" nos preços do Petróleo em 2016. Ele dirige o Keter Group, uma das maiores indústrias plásticas do mundo, com faturamento anual de US$ 1 bilhão e 30 fábricas espalhadas em três regiões -EUA, Europa e Israel.

Com a volta do Irã ao mercado internacional e a desaceleração da China, o empresário acredita em um ano com "mais altos e baixos" do que os anteriores, mas aposta numa reversão do cenário no médio prazo. Sagol prevê que os preços do v fiquem baixos, certamente abaixo do patamar de US$ 40 a US$ 50, por "mais alguns meses" e "talvez até o fim do ano". Mas prevê oscilações nas cotações.

Ele acha que "a era do v está terminando", pois combustíveisfósseis têm dado lugar a fontes renováveis. Essa transição energética pode demorar um pouco mais por causa do petróleo temporariamente barato, mas é irreversível.

Para Tony Hayward, chairman da Glencore, uma das maiores negociadoras globais de commodities, há excesso de pessimismo no mercado. "Quando a situação está difícil, o pessimismo acaba vindo de maneira excessiva", disse, até em relação à China, cuja desaceleração tem causado uma depressão no preço das commodities.

Ao mesmo tempo, as ações da companhia subiam 13% na bolsa de Londres em meio a expectativa geral de que o governo chinês adotará proximamente um novo plano de estímulo econômico, após os fracos resultados do ano passado.

Para analistas de Capital Economics, as avaliações sobre a China de fato estão sendo feitas mais com sentimento do que com base em fundamentos econômicos, e a situação do maior consumidor de commodities do mundo não está próxima de um pouso forçado.

O BC chinês continua gastando reservas para proteger o yuan. Para o Barclays, a China pode tolerar declínio de US$ 600 bilhões nas reservas internacionais em 12 meses. Atualmente as reservas são de US$ 3,3 trilhões, mas US$ 2,7 trilhões é nível seguro para Pequim cobrir potenciais compromissos externos, segundo o banco britânico.