Valor econômico, v. 16, n. 3926, 20/01/2016. Brasil, p. A4

TCU deve livrar ministros de punição por ´pedaladas´ fiscais

Murillo Camarotto | De Brasília

 

Esperado para o fim de fevereiro, o anúncio das penalidades que serão impostas aos responsáveis pelas "pedaladas" fiscais deve ser o primeiro processo de destaque do Tribunal de Contas da União (TCU) em 2016. O colegiado, que retorna hoje do recesso, deve absolver a maioria das 17 autoridades citadas, entre as quais está o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa.

Assim como ocorreu em 2015, quando rejeitou as contas presidenciais após 80 anos, o TCU terá outro ano bastante movimentado. Além do processo das "pedaladas" e da próxima análise das contas de Dilma Rousseff, o tribunal tem no horizonte auditorias polêmicas na PETROBRAS, acordos de leniência das empresas envolvidas na Lava-Jato, fiscalização das barragens das mineradoras e o programa de concessões de infraestrutura.

A maioria dos casos considerados mais espinhosos está no gabinete do ministro José Múcio Monteiro. Relator das "pedaladas" no ano passado, é ele quem está à frente do processo de responsabilização dos gestores citados. Múcio também cuida de todas as auditorias relacionadas à PETROBRAS e, para completar, é o relator das contas de 2015 da Presidência da República.

Encerrado o processo no qual o TCU decidiu que os atrasos nos repasses de recursos do Tesouro para os bancos públicos feriram a Lei de Responsabilidade Fiscal, as atenções se voltam agora para a punição dos responsáveis. Técnicos do tribunal estão avaliando as defesas de cada gestor e prometeram entregar um parecer no fim do próximo mês.

Até agora, o entendimento é de que a maior parte dos citados não merece punição. São os casos, por exemplo, dos presidentes dos bancos públicos. Luciano Coutinho (BNDES) e Aldemir Bendine (ex- Banco do Brasil) são vistos mais como "vítimas" do que como responsáveis pela contabilidade criativa. "Foram prejudicados, pois deixaram de receber os recursos", disse um técnico envolvido no processo.

O mesmo raciocínio vale para alguns ministros citados, como Tereza Campello, do Desenvolvimento Social, e Gilberto Occhi, ex-Cidades e hoje na Integração Nacional. A avaliação preliminar no TCU é que houve um crime de "tesouraria" e que esses ministros não tiveram responsabilidade sobre as manobras fiscais.

O titular da Fazenda, Nelson Barbosa, também deve escapar de sanções. Ele é mencionado por ter assinado uma portaria quando ainda era secretário-executivo do ministério, na gestão Guido Mantega. O documento renovou o teor de uma portaria anterior, assinada por Mantega, que concedia um prazo generoso para o Tesouro quitar suas obrigações com o BNDES.

Barbosa assinou o documento enquanto ministro interino, o que reforçou os argumentos em seu favor. Recentemente, a procuradoria do TCU fez análise semelhante ao tratar da assinatura de decretos irregulares pelo vice-presidente, Michel Temer. De acordo com o procurador do tribunal Julio Marcelo de Oliveira, o vice-presidente apenas cumpriu decisões de Dilma.

O exemplo é citado para tratar do caso de Barbosa, um sinal de que as principais sanções devem recair mesmo sobre Mantega e o ex-secretário do Tesouro Arno Augustin. É grande a chance de os dois ficaram inabilitados para o exercício de cargo de confiança no setor público por oito anos.

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Tribunal cria secretaria exclusiva para Operação Lava-Jato

Murillo Camarotto | De Brasília

O acúmulo de denúncias feitas no âmbito da Operação Lava-Jato levou o Tribunal de Contas da União (TCU) a criar uma secretaria exclusiva para cuidar do assunto. Batizada de Secretaria Extraordinária de Operações Especiais em Infraestrutura, o órgão conta com 20 auditores e está em funcionamento desde o dia 4.

De acordo com o tribunal, a secretaria vai priorizar as ações voltadas à Lava-Jato, mas também poderá atuar na fiscalização de outras operações da Polícia Federal na área de infraestrutura. Estão no radar para 2016 as refinarias premium, projetadas para o Maranhão e o Ceará, e que nunca saíram do papel. O TCU está passando um pente-fino nos projetos em busca dos responsáveis pelo prejuízo causado à estatal.

Os técnicos envolvidos acreditam que o nome de Dilma Rousseff pode aparecer novamente, assim como aconteceu com a aquisição da refinaria de Pasadena, que, segundo o tribunal, gerou prejuízo de US$ 792 milhões.

Destaque do ano passado, as contas presidenciais devem sofrer mudanças. O TCU vai oficializar nas próximas semanas novas regras para a análise das demonstrações. A principal deve ser a que estabelece a defesa prévia do governo para eventuais irregularidades que forem identificadas. O desejo dos ministros é de que as contas sejam apreciadas em junho, como ocorre normalmente. Em 2015, o desfecho só se deu em outubro.

Segundo apurou o Valor, a troca de informações entre governo e TCU ficou mais "ágil" e "transparente" após a traumática rejeição do ano passado. "Os números são horrorosos, mas pelo menos parecem fidedignos", disse uma fonte com acesso ao material.

O governo também deve voltar a ter dificuldades com o tribunal nas concessões em infraestrutura. No ano passado, o órgão liberou os leilões de áreas portuárias após quase dois anos de análise dos estudos. O TCU aprecia atualmente o projeto da Rodovia do Frango - primeira concessão que o governo quer fazer este ano - e já apontou uma série de irregularidades.

Outro processo aguardado com expectativa trata da atuação do governo no rompimento da barragem da mineradora Samarco. Uma auditoria no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) vai apurar se o órgão acompanha a contento o desempenho da Política Nacional de Segurança de Barragens, criada em 2013. Segundo o TCU, das 386 barragens acompanhadas pelo sistema, 36 têm alto risco de acidente.