Valor econômico, v. 16, n. 3926, 20/01/2016. Política, p. A5

Collor recebia por mês na BR, diz Cerveró

André Guilherme Vieira | De São Paulo

O ex-diretor de Internacional da Petrobras Nestor Cerveró afirmou à Operação Lava-Jato ter visto uma tabela com valores de propina supostamente desviados da BR Distribuidora que seriam pagos mensalmente ao senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL). A declaração consta de anexo de informações entregue pela defesa de Cerveró à Procuradoria-Geral da República (PGR). O Valor teve acesso ao documento. Subsidiária da Petrobras e também alvo de investigação que apura esquema de corrupção, a BR é a maior distribuidora de derivados de petróleo do país.

O delator disse aos investigadores que soube do pagamento de propina e do suposto repasse a Collor por intermédio do empresário Pedro Paulo Leoni Ramos. "Em certa oportunidade, Pedro Paulo Ramos mostrou uma tabela de valores mensais para a (sic) Fernando Collor, que chegavam na margem de milhões de reais". Cerveró, no entanto, não soube "precisar o valor correto" da propina.

O ex-diretor da petrolífera afirmou à PGR que enquanto ocupou a Diretoria Financeira da BR Distribuidora (2008 a 2014), as licitações para construção de bases de distribuição de combustíveis foram "todas direcionadas para a UTC construir bases de tancagem e armazenamento para a BR Distribuidora, todas aprovadas por todas as diretorias da BR Distribuidora". A UTC é uma das empresas investigadas por corrupção na Petrobras. Seu dono, Ricardo Pessoa, foi acusado de coordenar um "clube de empreiteiras" que se revezaria em contratos bilionários com a companhia, segundo o Ministério Público Federal (MPF). Pessoa fez delação premiada com a PGR e atribuiu a políticos o recebimento de recursos desviados da estatal.

Também acusado de corrupção e lavagem de dinheiro pela Lava-Jato, Pedro Paulo Leoni Ramos é descrito pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, como "operador de esquema criminoso de cobrança e repasse de propina" supostamente instalado na BR Distribuidora. Ele é investigado ainda por suspeita de repassar propina de R$ 1 milhão ao deputado federal Vander Loubet (PT-MS).

No resumo de informações entregue à Lava-Jato antes de assinar o acordo de delação premiada, Cerveró faz uma observação sobre o senador por Alagoas: "O negócio do Collor é dinheiro, ele não arrecada para partido, mas para ele mesmo." Cerveró disse também que esteve na residência de Collor em Brasília e "que o lugar é nababesco". A Casa da Dinda foi a residência oficial de Collor durante seu mandato como Presidente da República (1990-1992) - Collor foi submetido a processo de impeachment e renunciou ao cargo em 1992.

Foi na Casa da Dinda que a Polícia Federal (PF) apreendeu uma Lamborghini, uma Ferrari e um Porsche, em julho de 2015. Os carros de luxo foram devolvidos a Collor no ano passado. Ele é acusado de corrupção e lavagem de dinheiro pela PGR. Janot pediu a cassação de seu mandato ao Supremo Tribunal Federal (STF).

À Lava-Jato, Cerveró fez menção expressa sobre suposta propina nas bases de distribuição de combustível de Porto Nacional (TO) e de Cruzeiro do Sul (AC), cujas licitações foram vencidas pela UTC.

"A diretoria responsável pela construção das bases era a Diretoria de Engenharia e Serviços, cujo diretor era José Zonis, indicado pelo senador Fernando Collor", registra o resumo de informações entregue aos investigadores. Segundo a versão de Cerveró, no caso das bases a suposta vantagem indevida foi recebida somente pela diretoria de Engenharia e Serviços, "que repassou a propina ao senador Fernando Collor". Zonis já negou, em documento enviado ao STF, no ano passado, tanto o relacionamento pessoal com Collor como o favorecimento à UTC.

Auditoria interna da BR encontrou, em julho de 2015, "indícios de inconformidades com as normas da companhia para a realização de processos licitatórios". A empresa, entretanto, não divulgou o relatório da auditoria sob o argumento de que se trata de informação sigilosa.

O senador Fernando Collor disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que "o vazamento parcial de declarações atribuídas a Nestor Cerveró é ilegal e busca covardemente vilificar alvos escolhidos junto à opinião pública".

Ainda segundo o comunicado, "o senador Fernando Collor não teve qualquer participação ou ingerência em processos internos e licitações realizadas pela BR Distribuidora, bem como jamais recebeu recursos ilícitos da UTC, nem diretamente nem por pessoa interposta".

A assessoria de comunicação de Pedro Paulo Leoni Ramos disse que o empresário não vai comentar as declarações de Cerveró "por não ter tido acesso ao teor da delação e da denúncia da Procuradoria-Geral da República".

Já a UTC informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que "a empresa não comenta investigações em andamento".