Macri dá novo tom ao Mercosul

 

Presidente recém-eleito da Argentina cobra libertação de presos políticos pela Venezuela e pressiona bloco a monitorar violações de direitos humanos.

A estreia do presidente recém-eleito da Argentina numa reunião de cúpula do Mercosul foi marcada por um duro discurso de Mauricio Macri e uma reação ríspida da chanceler venezuelana, Delcy Rodríguez. O presidente argentino foi direto ao ponto e, amparando-se na cláusula democrática do bloco, cobrou a libertação dos presos políticos do regime dirigido por Nicolás Maduro, que preferiu não ir à reunião: “Nos Estadosmembros do Mercosul não pode haver lugar para perseguição política por razões ideológicas nem a privação ilegítima da liberdade.” Delcy reagiu acusando Macri de ingerência em assuntos internos da Venezuela.

Já a presidente Dilma Rousseff manteve a habitual condescendência em relação aos herdeiros de Hugo Chávez no governo venezuelano.

O clima pesado, raro em reuniões diplomáticas, tem sua razão de ser. À medida que a crise econômica toma proporções catastróficas e mina o apoio ao regime, o Executivo venezuelano reage de forma cada vez mais truculenta. Denunciado por crime contra a Humanidade ao Tribunal Penal Internacional, em Haia, na Holanda, e criticado por instituições como o Human Rights Watch e o Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos, o governo Maduro mantém hoje centenas de prisioneiros políticos, inclusive Leopoldo López, um dos líderes da oposição. Há denúncias de tortura e, só nas manifestações de fevereiro de 2014, mais de 30 pessoas foram mortas e cerca de 800 feridas pela polícia e grupos paramilitares.

A “revolução”, idealizada por Chávez, baseou sua política social na distribuição da riqueza oriunda da indústria petrolífera para alguns privilegiados com acesso ao regime. Após a crise global de 2008, a maré virou e os preços da commodity, que oscilavam em torno dos US$ 120 o barril, caíram para o patamar de US$ 30. Dependente do petróleo e com desastrosas intervenções do governo, a Venezuela sucumbiu.

Sua inflação está na casa dos três dígitos; há desabastecimento generalizado, inclusive de itens de primeira necessidade; controle de preços; e um ambiente hostil a investidores. Vários escalões do governo e de estatais estão sendo investigados por suspeita de corrupção e envolvimento com redes de tráfico de drogas.

A situação é tão dramática que, apesar da repressão, a população venezuelana enfrentou o regime e deu à oposição a maioria (dois terços) no Parlamento, no início deste mês.

Na reunião do Mercosul, Macri se impôs como líder: lembrou o valor da liberdade, cobrou Maduro e recomendou prudência à oposição. Por iniciativa de Argentina e Paraguai, o bloco exortou a Venezuela a aderir ao protocolo de Assunção de defesa dos direitos humanos e aprovou um grupo de monitoramento.

Dilma, encolhida, limitou-se a parabenizar “o presidente Maduro e o povo venezuelano pelo espírito democrático”.

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Acordo do clima exigirá acompanhamento

 

Passada a euforia pelo sucesso da COP-21, começa a etapa mais difícil do pacto para conter o aquecimento global: a execução das medidas acordadas pelos 195 países.

Passada a merecida celebração do acordo fechado na conferência do clima em Paris, a COP-21, tem início a etapa mais difícil do acordo: a efetiva implementação das medidas acertadas em 14 dias de longas e exaustivas negociações entre os 195 países presentes ao fórum. A COP-21 foi um passo crucial para a meta de conter a elevação da temperatura média da Terra em 2°C neste século em relação aos níveis pré-industriais, e, assim, evitar os efeitos catastróficos do aquecimento global, que já se fazem sentir.

Pode-se afirmar que os objetivos acordados na COP-21 são audaciosos. Para conseguir manter o teto da elevação da temperatura em 2ºC os países terão que implementar medidas de contenção o quanto antes, a começar pelas nações desenvolvidas. Foi consenso entre os participantes que até a segunda metade deste século será preciso chegar a um equilíbrio entre as emissões e o potencial de absorção desses gases, sobretudo o dióxido de carbono (CO2). Estas medidas serão especialmente desafiadoras para os países que têm sua matriz energética em combustíveis fósseis, como os derivados de petróleo.

O acordo foi costurado a partir das contribuições individuais de cada país. Das 195 nações presentes em Paris, 187 apresentaram suas propostas de corte de emissões, inclusive o Brasil (37%). Ao se considerar esses compromissos, verifica-se que eles são insuficientes. Segundo analistas, a temperatura média do planeta ainda cresceria cerca de 3ºC com os esforços já programados. Serão necessárias, portanto, medidas adicionais.

Para isso, a COP-21 estabeleceu que as contribuições de cada país serão revisadas para cima a cada cinco anos. A primeira revisão já está programada para 2018, e a primeira implementação das atualizações em 2020, quando o acordo de Paris efetivamente entraria em vigor. A cobrança é maior sobre os países desenvolvidos, que terão efetivamente que reduzir suas emissões. Para as nações pobres e em desenvolvimento está prevista uma tolerância de adaptação, em função de suas efetivas capacidades de reduzir ou limitar suas emissões de CO2, sem afetar o desenvolvimento.

Para ajudar a mudança de matriz energética, estabeleceu-se uma verba anual de US$ 100 bilhões além de outros instrumentos essenciais para que o acordo funcione. Outro ponto importante é o acompanhamento do progresso dos países em seus esforços de redução dos gases do efeito estufa. Os países desenvolvidos se comprometeram a divulgar informações completas, ao passo que os emergentes terão uma cobrança menor nesse sentido, e os pobres, uma exigência mínima.

O comportamento dos governos bem como a supervisão internacional, portanto, serão cruciais para o sucesso do acordo. Um desafio e tanto, considerando-se que, em muitos casos, implicará uma reestruturação completa de fontes energéticas e matrizes industriais, inclusive de setores hoje fortemente beneficiados por subsídios e estímulos. O passo inicial, porém, já foi dado.