Supremo bloqueia as contas de Cunha

Eduardo Militão

23/10/2015

O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que os 2,46 milhões de francos suíços em contas no exterior do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e da mulher dele, Cláudia Cruz, fossem sequestrados pelas autoridades brasileiras. Isso significa que o ministro-relator da Operação Lava-Jato na Corte, Teori Zavascki, reconheceu indícios de que os cerca de R$ 9,8 milhões depositados no banco Julius Baër, na Suíça, são fruto de crime. "Efetivamente demonstrada a existência de indícios suficientes de que os valores eram provenientes de atividades criminosas diante da farta documentação apresentada pelo Ministério Público, assim como há o evidente risco de desbloqueio dos valores com a consequente dissipação dos valores, uma vez que houve a formal transferência das investigações pelas autoridades suíças", afirmou o magistrado na sua decisão, tomada na quarta-feira e divulgada ontem. 

Segundo Teori, os recursos devem vir para os cofres do Brasil. "A medida cautelar agora requerida se efetivará pela transferência daqueles valores às autoridades brasileiras", disse o ministro. Segundo fontes ouvidas pelo Correio, nem sempre o dinheiro vem para o Brasil nesses casos. Às vezes, fica em contas na Suíça. 

O fato é que, a partir da agora, os recursos estão sob os cuidados da Justiça brasileira, e não correm o risco de serem desbloqueados. No mês passado, o Ministério Público da Confederação (MPC), no país europeu, transferiu toda a investigação para a procuradoria do Brasil. Agora, o dinheiro também está sob a guarda dos brasileiros. 

O ministro também rejeitou o pedido do presidente da Câmara para tornar sigiloso o Inquérito nº 4146. As autoridades da Suíça e a Procuradoria-Geral da República (PGR) não pediram segredo dos papéis, destacou Teori. Ele acrescentou em sua decisão que não se tratavam de documentos obtidos por alguma medida cautelar - quebras de sigilo - tomada por uma autoridade brasileira. 

A assessoria de Cunha afirmou que ele não comentaria o caso. Ele tem negado a posse de contas no exterior e a obtenção de propinas ou outras vantagens ilegais. O Ministério Público denunciou o deputado ao STF por corrupção e lavagem de dinheiro acusando-o de embolsar pelo menos US$ 5 milhões pelo fato de a Petrobras ter contratado a construção de dois navios do estaleiro Samsung em 2006 e 2007, avaliados em US$ 1,2 bilhão. Além disso, o presidente da Câmara é alvo de um inquérito sob a suspeita de ganhar 1,3 milhão de francos suíços para a petroleira comprar metade um poço de petróleo em Benin, na África, por US$ 34,5 milhões. 

Mulher e filha 

Os papéis da Suíça mostram documentos usados pela mulher e por uma das filhas de Cunha, Danielle Ditz da Cunha, para abrir uma conta-corrente e ter um cartão de crédito internacional. A documentação mostra que Cláudia Cruz era titular da conta Kopek, na qual gastou US$ 1 milhão com cartões, aulas de tênis e de inglês, curso de MBA e depósitos para uma filha. 

A documentação ainda mostra que, em 2011, Eduardo Cunha estava interessado em fazer investimentos no mercado brasileiro de energia elétrica. O deputado tem quatro contas ligadas a ele: Kopek, Netherton, Orion e Triumph, as últimas duas encerradas após a deflagração da Lava-Jato. A funcionária do banco Merril Lynch Elisa Mailhos afirma em ofício de 25 de julho de 2011 que a conta Netherton, de onde foram bloqueados mais de 2 milhões de francos, era usada para investimentos. "Foi aberta para um novo negócio que deverá aportar novos recursos ao banco quando os 'negócios em energia' evoluírem, segundo a funcionaria do banco Merryll Lynch Elisa Mailhos", descreve o perito criminal da Polícia Federal Gilberto Mendes, ao prestar relatório ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot. 

Pedido de afastamento

Vice-líder do governo, o deputado Silvio Costa (PSD-PE) protocolou uma representação na Procuradoria-Geral da República (PGR) pedindo o afastamento imediato do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, indiciado por corrupção e lavagem de dinheiro na Operação Lava-Jato. De acordo com ele, Cunha tem usado o cargo para travar o processo de cassação de seu mandato no Conselho de Ética da Casa. Em 13 de outubro, o PSol e a Rede apresentaram à Mesa Diretora representação por quebra de decoro parlamentar contra Cunha, mas o pedido ainda não foi numerado. Isso precisa ocorrer para que a peça seja encaminhada ao Conselho de Ética. "Não é possível a gente continuar com uma situação inusitada como essa de um presidente que está denunciado, com conta na Suíça, diz que não renuncia e esta Casa está neste marasmo", criticou Costa. Ele alegou que a posição é individual e negou ter conversado com o governo ou com o partido antes de apresentar o pedido.

Correio braziliense, n. 19142 , 23/10/2015. Política, p. 2