O globo, n. 30086, 21/12/2015. Economia, p. 20

Antes de tomar posse, Nelson Barbosa falará com investidores

BÁRBARA NASCIMENTO

Ministro tentará acalmar mercados. ‘Pedaladas’ terão cronograma.

-BRASÍLIA E ASSUNÇÃO- Depois de passar o fim de semana em reuniões no Ministério da Fazenda para acertar os detalhes de sua transição, o novo ministro Nelson Barbosa vai tentar acalmar os investidores antes mesmo de tomar posse. Na sexta-feira, os rumores de que Barbosa assumiria o cargo no lugar de Joaquim Levy fizeram a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) fechar em queda de 2,9% e o dólar avançar 1,43%, para R$ 3,94. O anúncio oficial com a troca na Fazenda ocorreu após o encerramento dos negócios do mercado.

Hoje, pela manhã, Barbosa terá uma reunião com o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, às 9h. Na sequência, Barbosa vai participar de uma conferência por telefone com investidores nacionais e estrangeiros, às 12h. A posse como ministro da Fazenda está marcada para as 17h, no Palácio do Planalto.

FOCO É NO AJUSTE, DIZ MONTEIRO

Segundo fontes, Nelson Barbosa deve apresentar, antes do fim deste ano, o cronograma oficial do pagamento das “pedaladas fiscais". Por enquanto, ainda não há definições se o plano será o mesmo sinalizado por Levy. Barbosa primeiro deve se inteirar sobre os números e alternativas e conversar com os representantes do BNDES e dos demais bancos.

Em Assunção, onde participou de reunião de ministros do Mercosul, o ministro do Desenvolvimento, Armando Monteiro, disse que as linhas da política econômica não mudarão com a chegada de Barbosa à Fazenda. Monteiro destacou que o novo ministro já declarou seu compromisso com o ajuste fiscal e disse que Barbosa “é alguém que tem muita competência técnica, se relaciona muito bem com o Congresso, com os companheiros do governo e tem sobretudo a confiança da presidente Dilma Rousseff".

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Em busca da confiança perdida

BRUNO ROSA

Discurso pragmático tem nuances em relação a Levy.

A palavra economia significa “por a casa em ordem”.

As primeiras declarações de Nelson Barbosa após ser anunciado novo ministro da Fazenda foram sob medida para tentar resgatar a confiança dos investidores: ele citou 29 vezes a palavra fiscal, e mencionou em13 ocasiões o termo crescimento. Logo após ser confirmado o novo ministro da Fazenda, Nelson Barbosa mostrou, em entrevista coletiva, um discurso sob medida. Durante a explanação aos jornalistas, citou a palavra fiscal 29 vezes. E mencionou o crescimento apenas em 13 ocasiões. Para economistas, suas declarações deixam claro que ele pretende apostar no pragmatismo porque não há espaço para mudanças na condução da política econômica e é impossível, neste momento, abandonar a busca pelo rigor fiscal de seu antecessor, Joaquim Levy, sob o risco de abalar a já reduzida confiança de investidores e empresários. Especialistas em linguagem e psicanalistas destacam que, se o argumento central do discurso de Barbosa foi o mesmo de Levy — o equilíbrio fiscal —, há nuances importantes.

Estudioso das palavras, o etimologista Deonísio da Silva lembra que o termo economia significa, em sua origem, “pôr a casa em ordem”. Ele destaca que tão importante quanto o conteúdo de um discurso, é saber conduzir suas diretrizes.

— Levy já foi tarde porque, se ele sabia fazer, não soube como fazer. Tem que saber conduzir. O discurso de Barbosa mostra que não tem como gastar mais. E vai tentar arrumar a casa, assim como a origem da palavra economia — analisa.

Na sexta-feira, o ministro-chefe da Casa Civil, Jacques Wagner, ao discorrer sobre como seria o perfil de um novo ministro da Fazenda, destacou que “o mensageiro tem que ser jeitoso”.

Para a psicanalista Lorena Coutinho, o melhor trânsito político de Barbosa, que teria sido um dos motivos para sua escolha, pode esbarrar na cultura populista da América Latina. E, ainda, numa possível maior submissão à presidente Dilma Rousseff:

— E aí você enxerga o mito de Narciso, que sempre busca ser admirado. Barbosa parece se submeter mais à Dilma, diferentemente de Levy.

Lorena traça paralelos entre a situação atual do Brasil e outra grande crise, a depressão da década de 1930, período que na psicanálise marcou o lançamento de um clássico, o “Mal-Estar da Civilização”, de Sigmund Freud.

— É importante retirar das pessoas todo esse mal-estar.

Para o economista Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central (BC), neste momento de crise, não há espaço para ideologia.

— Barbosa foi objetivo porque precisa evitar um novo rebaixamento. Será um teste de governabilidade. O importante é que já menciona os ajustes pelo lado das despesas, como a questão da previdência.

Para Cláudio Frischtak, da Inter.B Consultoria, Barbosa não tem muita escolha. Uma sinalização errada afugentaria ainda mais os investidores.