O globo, n. 30068, 03/12/2015. País, p. 7

Para oposição, processo é caminho sem volta para a presidente

 

Senadores trataram do tema em reunião com o vice Michel Temer.

-BRASÍLIA- Lideranças da oposição avaliam que a aceitação do pedido de impeachment de Dilma Rousseff é o primeiro passo para o fim da gestão da presidente da República: um caminho sem volta. A previsão é que a partir de agora haverá mobilização das ruas. Os oposicionistas fazem uma comparação com o processo de impeachment do ex-presidente Collor, que, entre a manifestação do 7 de setembro em que os caras-pintadas foram para as ruas de preto, e a abertura do processo na Câmara, no dia 29, levou 22 dias.

— As ruas vão se mobilizar naturalmente a partir de agora. O estopim foi aceso. Nós apoiamos o impeachment, que não é golpe, está previsto na Constituição, e a peça que encaminhamos através dos juristas tem elementos muito consistentes para que a presidente Dilma seja processada. O que temos que decidir agora, de olho na sociedade, com muita serenidade e com amplo direito de defesa do governo, é se daremos um salvo-conduto para que a presidente Dilma cometa crimes fiscais e eleitorais ou se daremos ao país uma nova oportunidade de recuperar a credibilidade e a governabilidade — disse o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG).

— Já vimos este filme com Collor. A variável agora é a rua — disse o deputado Benito Gama (PTB-BA).

O líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), disse que a decisão de Eduardo Cunha foi um gesto que terá um enorme impacto econômico e político nos próximos 45 dias. Mas, depois desta turbulência, o país retomará seu caminho com mais tranquilidade.

— Viveremos agora dois momentos. No primeiro momento haverá uma paralisia generalizada, com recessão e mais demissões; ninguém sabe direito em que dimensões. Passado o pânico, o segundo momento será de recuperação da perspectiva de o Brasil apresentar um plano de recuperação com Dilma fora. Será resgatado o sentimento de credibilidade — avalia Caiado. SENADORES FAZEM MANIFESTO A abertura de um processo de impeachment foi discutida numa reunião com participação do vice-presidente Michel Temer, um grupo de senadores da oposição e alguns da base, liderados por Fernando Bezerra (PSB-PE). Os senadores submeteram a Temer um manifesto pedindo a inclusão do impeachment da presidente na pauta. A coleta de assinaturas começou a ser feita em seguida, durante a sessão do Congresso, por Fernando Bezerra, e rapidamente chegou próximo ao número pretendido de 45 nomes.

Segundo a assessoria de Temer, o grupo de senadores foi comunicar ao vice que o manifesto pretendia dar uma alternativa para o impasse que paralisa o país: se o impeachment resolve a crise, ou se a crise será resolvida com a presidente Dilma no cargo.

O manifesto será também uma sinalização de apoio à decisão de Cunha, com o apelo para que o impeachment não continue sendo usado como moeda de barganha, mas que seja resolvido para que Brasil volte a andar nos trilhos. Estiveram na reunião com Temer, além de Bezerra, os senadores José Agripino (DEM-RN), Tasso Jereissatti (PSDB-CE), Ricardo Ferraço (PMDB-ES), Valdemir Moka (PMDB-MS), José Serra (PSDB-SP) e Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP).

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A festa dos pró-impeachment

 

Integrantes de movimentos, como o Brasil Livre, foram às ruas de São Paulo em pequenos grupos comemorar, mas evitaram se posicionar sobre a situação de Eduardo Cunha.

‘Estávamos com o kit festa preparado”, afirmava Renan Santos, um dos líderes do Movimento Brasil Livre (MBL), com incontida alegria, minutos depois que o deputado Eduardo Cunha acatou o pedido de impeachment da presidente Dilma. No fim da tarde de ontem, fogos de artifício foram queimados em diferentes regiões da capital paulista. Na Zona Sul, os estampidos foram esparsos, enquanto na Zona Oeste o barulho foi mais intenso. O clima festivo era claro entre os movimentos que organizaram manifestações contra Dilma ao longo de 2015, que conclamavam eleitores insatisfeitos com ela a comemorar o início do processo de impedimento na Avenida Paulista, “como se o nosso time estivesse ganhando o campeonato”, explicava Santos.

— Sabíamos que isso aconteceria; estávamos assistindo a um jogo de chantagem entre Cunha e PT. Em alguma hora esse jogo ia colapsar, como aconteceu. E quem ganha é o Brasil; é um presente de Natal para o Brasil — disse o líder do MBL.

Por volta das 22h, cerca de cem pessoas estavam no vão livre do MASP, enroladas em bandeiras do Brasil e entoando “O PT vai cair”.

— Se Deus quiser, agora ela cai. Vamos marcar uma nova manifestação ainda hoje — disse Kim Kataguiri, do MBL.

Outro grupo que comemorava a decisão de Cunha era o Vem Pra Rua.

— Este é um dia histórico, porque finalmente um pedido da população está sendo atendido — afirmou Rogério Chequer, porta-voz do movimento.

Quem não foi para a Paulista mas quis manifestar apoio ao impeachment bateu panela quando a presidente falou na televisão, por volta das 20h30m. O barulho, bem menor do que em outros pronunciamentos de Dilma, foi ouvido nos bairros centrais na capital.

Os movimentos, no entanto, evitaram se posicionar claramente sobre a situação de Eduardo Cunha, acusado repetidas vezes de ter recebido propina no âmbito da Operação Lava-Jato. Para Chequer, ele ainda é presidente da Câmara e, portanto, tem competência para tomar a decisão.

— Infelizmente, é por motivo de barganha, mas isso é prerrogativa dele. Este pedido não veio de políticos; veio de um clamor popular, e é isso o que importa.

Já Santos, do MBL, não quis discutir a legitimidade do deputado.

— Queremos que o Cunha saia, mas uma coisa não tem nada a ver com a outra — desconversou.