O globo, n. 30067, 02/12/2015. Economia, p. 24

Um quarto de século

 
MÍRIAM LEITÃO COM ALVARO GRIBEL

Recessão não é apenas um número negativo, é uma sensação de temor que se espalha. As empresas temem a falta do cliente, o consumidor se encolhe, o investidor não arrisca, o futuro parece mais perigoso. A paralisia dos negócios muda o ambiente, e os empregos começam a sumir. Estamos na pior crise, no mais forte encolhimento, dos últimos 25 anos.

Como a atual série estatística começou em 1996, fala-se que a recessão é a maior há 19 anos. É pior do que isso. Olhando os dados de anos anteriores, mesmo que tenham sido calculados com diferenças metodológicas, a economia nunca teve uma queda deste tamanho desde que o ex-presidente Fernando Collor decretou o sequestro das aplicações financeiras e contas bancárias. Para a juventude brasileira, é a primeira vez que um evento assim acontece. Eles reagem como se fosse o fim dos tempos, e alguns começam a desistir do país.

Os dados divulgados ontem pelo IBGE são assustadores. Ele reviu para pior os dois primeiros trimestres, divulgou para o terceiro trimestre uma queda maior do que a prevista e mostrou que no ano a retração é de 3,2%. Maior do que a de 12 meses, 2,5%. Isso significa que o país ainda está afundando. Não há sinais alentadores. Pelo contrário. O investimento cai há nove trimestres. Isso faz o país não ter impulso para a retomada. O Ministério da Fazenda, em nota, disse que a inflação está tirando a renda das famílias. Um dos erros do governo foi ter conduzido a economia de uma maneira que levou a inflação para dois dígitos. Em grande parte, o salto foi resultado da manipulação de preços de tarifas em anos anteriores. Ao subir, a inflação diminuiu a renda disponível.

O que trouxe o país a este conjunto impressionante de más notícias — a pior recessão em um quarto de século, inflação de dois dígitos, emergência fiscal — foi o acúmulo dos erros dos anos anteriores. O ex-presidente Lula decidiu acelerar a economia com fins eleitorais em 2010, a presidente Dilma persistiu nos erros e acrescentou alguns mais. A conta chegou no difícil ano de 2015 em que o país atravessa crise política e incertezas empresariais.

A equipe econômica que assumiu no início do segundo mandato achou que faria um ajuste fiscal, isso permitiria a retomada da confiança. Os dois primeiros trimestres seriam de encolhimento do PIB, mas no terceiro o país estaria crescendo. A queda forte do PIB no terceiro trimestre mostra que essa estratégia não funcionou. Primeiro porque o ajuste não foi convincente, segundo porque o governo é o mesmo. Terceiro porque a equipe econômica se baseava no que aconteceu em 2003. Naquela época, a economia mergulhou, mas voltou rápido. E isso aconteceu porque o governo Fernando Henrique havia deixado o país ajustado do ponto de vista fiscal, e o Brasil foi beneficiado pelo boom das commodities. A história não se repetiu agora.

O país já encolheu muito e não há horizonte de melhora no curto prazo. Os economistas falam em mais dois trimestres de recessão e depois um período de estagnação. Ontem mesmo os economistas de bancos e consultorias voltaram a calcular a previsão para o ano, diante dos novos números para o primeiro e o segundo trimestres e o dado do terceiro. As projeções estão indo para 3,7% de recessão em 2015. E permanecem as previsões de queda no ano que vem, confirmando os temores de dois anos consecutivos de encolhimento do produto, o que não acontece no Brasil desde 1930.

Durante o ano de 2017 o Brasil pode volta ao terreno positivo, dependendo das decisões que forem tomadas durante o ano que vem. Este governo errou muito, e a presidente é refratária a críticas. Foram muitos os alertas de bons economistas durante o primeiro mandato de que ela teria que ajustar a economia dos desequilíbrios deixados pelo governo Lula e ajustar os seus próprios passos. A arrogância da equipe à qual ela deu poder para tomar decisões e manipular dados fiscais era enorme. A atual equipe não briga com os fatos e, ontem, a Fazenda divulgou uma nota sóbria e realista.

Mais do que os feios números, o que preocupa é a incerteza, destacada na nota do Ministério da Fazenda. A incerteza permanece conosco alimentando o temor que se espalhou pelo país.