O globo, n. 30066, 01/12/2015. País, p. 4

Pedido de inquérito reúne Delcídio e Renan na mesma investigação

 

CAROLINA BRÍGIDO

Colaboraram André de Souza e Cristiane Jungblut

Solicitação é sigilosa; Jader Barbalho e Aníbal Gomes também são alvo.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu a abertura de inquérito sigiloso contra os senadores Delcídio e Renan Calheiros. -BRASÍLIA- O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedido de abertura de mais dois inquéritos na Operação Lava-Jato. O primeiro é contra o senador Delcídio Amaral (PT-MS), o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDBAL), e o senador Jader Barbalho (PMDB-PA). O segundo é contra Renan, Jader e o deputado Aníbal Gomes (PMDB-CE). O grupo é suspeito de ter cometido corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ambos os pedidos estão tramitando em sigilo.

Caberá ao ministro Teori Zavascki, relator dos processos da Lava-Jato no tribunal, decidir se atende ao pedido do procuradorgeral. A praxe é a abertura dos inquéritos quando há pedido do chefe do Ministério Público Federal (MPF). Caso isso se confirme, será o segundo inquérito aberto no STF contra Delcídio por indícios de participação no esquema de desvios de dinheiro da Petrobras. O primeiro foi aberto na semana passada e levou a sua prisão. Renan responderá ao quinto inquérito na Lava-Jato no STF e Aníbal, o quarto. Em relação a Jader, será o primeiro inquérito que ele responderá sobre o assunto no tribunal. Os pedidos de abertura de inquérito chegaram ontem ao STF.

Não foram divulgados documentos com detalhes sobre as investigações. Há somente a informação de que o pedido foi feito com base em uma petição que tramita de forma oculta no tribunal. A petição trata de uma delação premiada — que, por lei, deve ser mantida em sigilo. Uma das delações homologadas recentemente foi a do lobista Fernando Baiano.

NO STF, 68 INVESTIGADOS Se as novas investigações forem abertas, haverá no STF 35 inquéritos sobre a Lava-Jato. Serão 68 investigados. Há 23 deputados, 14 senadores, um ministro de Estado e um ministro do Tribunal de Contas da União. A expectativa é de que o rol de investigados seja ainda maior, porque a Corte mantém investigações ocultas, sem disponibilizar sequer o nome do suspeito ao público.

Por meio da assessoria de imprensa, Renan negou irregularidades. “O presidente do Senado, Renan Calheiros, reitera que suas relações com as empresas públicas nunca ultrapassaram os limites institucionais. O senador já prestou os esclarecimentos necessários, mas está à disposição para novas informações, se for o caso. O senador acrescenta ainda que nunca autorizou, credenciou ou consentiu que seu nome fosse utilizado por terceiros”, diz a nota. O GLOBO não conseguiu falar com Aníbal Gomes nem com seu advogado, Gustavo Souto.

A defesa de Delcídio informou que ele só vai se manifestar quando tiver acesso aos autos. Delcídio está preso na Superintendência da Polícia Federal desde a última quarta-feira. Bernardo Cerveró, filho do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, gravou uma conversa que teve com Delcídio, o advogado Edson Ribeiro e o chefe de gabinete do senador, Diogo Ferreira. Nela, o senador promete ajuda para conseguir a liberdade de Cerveró, fala em auxílio financeiro e planeja até mesmo uma fuga.

Jader Barbalho disse que não poderia comentar porque ainda não tomou conhecimento:

— Eu desconheço totalmente. Não sei do que se trata. Então não posso me manifestar. Só depois que tiver conhecimento é que posso me manifestar.

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Cardozo e senador conversaram sobre Lava-Jato

JAILTON DE CARVALHO 

Ministro confirma que Delcídio o perguntou sobre habeas corpus dado pelo STF.

-BRASÍLIA- O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, confirmou ontem que conversou com o senador Delcídio Amaral (PTMS), ex-líder do governo no Senado, sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de conceder habeas corpus para Alexandrino Alencar, ex-diretor de Relações Internacionais da Odebrecht, um dos presos na Operação Lava-Jato, que acompanhava o ex-presidente Lula em viagens internacionais financiadas pela empresa.

Segundo Cardozo, Delcídio quis saber se a decisão do STF teria repercussão em outras instâncias da Justiça, o que poderia beneficiar outros réus da Lava-Jato presos. Cardozo reafirmou, no entanto, que não se lembra de ter conversado com o senador sobre Nestor Cerveró, ex-diretor de Internacional da Petrobras. A referência a suposta conversa de Cardozo com Delcídio está em um dos documentos apreendidos em poder de Diogo Ferreira, chefe de gabinete do senador.

Delcídio, Ferreira, o banqueiro do BTG Pactual André Esteves e o advogado Edson Ribeiro estão presos desde a quarta-feira passada por tentativa de obstrução das investigações da Lava-Jato no STF e por tramarem a fuga para a Espanha de Cerveró.

Num dos documentos recolhidos pela PF entre os pertences de Ferreira no Senado consta um texto com a seguinte anotação : “Falou JC- Zé Cardoso - reforçado HJ, SS - Sigmaringa Seixas - Entendem muito bem a situação, - Também está ocorrendo com os demais, - Empenhados em uma ação ampla”.

Numa entrevista ao GLOBO, Cardozo disse que conversava regularmente com Delcídio e, num desses encontros, o senador quis saber sobre possíveis desdobramento da Lava-Jato:

— Ele me perguntou se uma decisão do STF poderia repercutir em outras esferas do Judiciário. Era aquela decisão sobre o habeas corpus do Alexandrino (Alencar, executivo da Odebrecht), não me lembro qual.

ADVOGADO FOI CONSULTADO Cardozo afirmou que conversava muito com Delcídio, trocava impressões sobre vários assuntos e o interesse do senador sobre a repercussão de uma decisão do STF era só um dentre os temas discutidos.

Procurado pelo GLOBO, o advogado Sigmaringa Seixas, ex-deputado do PT, disse que conversou entre duas a quatro vezes com Delcídio nos últimos meses. Numa das conversas, o senador quis saber sobre a repercussão de habeas corpus concedidos a presos da Lava-Jato pelo STF.

— Uma vez expliquei para o Delcídio que o Supremo não tinha analisado o mérito dos habeas corpus. Eram decisões em liminares. Expliquei sobre os habeas corpus no contexto da Lava-Jato. Mas ele não me pediu nada, nem para ajudar ninguém.

No documento de Diogo Ferreira constam ainda referências a Júlio Camargo, um dos principais delatores da Lava-Jato, e expressamente a Nestor Cerveró.