Valor econômico, v. 16, n. 3919, 11/01/2016. Política, p. A6

Adams aproxima-se de Temer

 
 
 
Ruy Baron/Valor 
Adams: "Ele [Temer] tem o desafio de presidir um partido tão complexo como o PMDB, de buscar a unidade. Tem que lidar com os que são contra e a favor do governo"
 

 

O advogado-geral da União, ministro Luís Inácio Adams, o decano do primeiro escalão do Executivo, tornou-se um interlocutor inesperado em meio à crise na relação da presidente Dilma Rousseff com o vice-presidente Michel Temer. Tornou-se uma "ponte institucional", em meio às desconfianças do PMDB quanto aos articuladores políticos do Palácio do Planalto.

 

Esse novo papel político evidenciou-se na noite de 7 de dezembro, quando foi divulgado na imprensa o conteúdo da carta que Temer enviara naquele dia à presidente. Em meio às especulações sobre o autor do vazamento, foi Adams - e não um dos ministros do núcleo político - o emissário de Dilma recebido às 23 horas para uma conversa reservada com Temer no Palácio do Jaburu. Após algumas taças de vinho e reflexões sobre a crise, Adams deixou a residência oficial da Vice-Presidência perto das 3 horas do dia seguinte.

"Eu sou uma ponte institucional, não sou uma ponte política", diz Adams. "Numa disputa de poder, a paranoia tende a tomar o lugar da razão. Eu me propus auxiliar nesse espaço da razão, sem descurar do debate político", define.

 

Em conversa com o Valor PRO, serviço de informações em tempo real do Valor, Adams confidenciou que desejava deixar o cargo desde janeiro de 2015, no início do segundo mandato da presidente Dilma, mas afirmou que não sai antes do desfecho do impeachment. "Agora não dá pra sair". Ele tem no horizonte um convite para assumir a representação no Brasil de uma importante banca de advocacia dos Estados Unidos.

Nos últimos dias, os ministros da Casa Civil, Jaques Wagner, e da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, fizeram gestos para reconstruir as pontes com Temer. Edinho trocou telefonemas e votos de Feliz Ano Novo, enquanto Wagner foi ao gabinete do vice na quarta-feira. Mas isso foi apenas o começo. Apesar das declarações sobre "harmonia", a atmosfera que cerca o Palácio e a vice-presidência ainda é de desconfiança mútua.

 

"Eles [Wagner e Edinho] buscam recompor o diálogo e criar uma agenda de normalidade", traduz um interlocutor de Temer. Adams, contudo, ainda desponta como um interlocutor não contaminado pelo clima de suspeição. "Adams é o advogado dela [da presidente Dilma]. Tem a vantagem de não ser palaciano, não ser do PT e ser um jurista como Temer, o que facilita o diálogo", explica um outro auxiliar do vice-presidente. Segundo a explicação desse auxiliar, o ambiente ficou dominado pela suspeita dos ministros palacianos de que Temer estaria estimulando a ala do PMDB favorável ao impeachment. "Temer está mais magoado do que antes. Antes, Temer era desprezado pelo Palácio, agora ele é um traidor", resumiu.

 

Adams relatou ao Valor PRO como foi convidado para falar com Temer na noite do vazamento da carta, em que o vice expôs o descontentamento na relação com Dilma. Quando soube que o teor da carta havia sido divulgado para a imprensa, Adams trocou telefonemas com o assessor especial de Temer, o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures. Horas depois, chegaria ao Jaburu. "Como eu estava envolvido com o impeachment, me preocupava o tipo de imagem que estava se construindo em torno do vice, como se ele fosse pontuando o processo para o impeachment, o que eu sei que não é verdade", narrou.

 

Adams afirma que ouviu de Temer que não se posicionou ao lado de Dilma contra o impeachment por causa das divergências internas no PMDB. "Ele tem o desafio de presidir um partido tão complexo como o PMDB, de buscar a unidade partidária. Tem que lidar com aqueles que são contra e a favor do governo", defendeu.

 

Adams exerceu naquela ocasião um papel que seria normalmente atribuído a um dos ministros petistas do núcleo político de Dilma, como Jaques Wagner, Edinho Silva, Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) ou José Eduardo Cardozo (Justiça). Todos esses intercederam na crise anterior, em agosto, quando Temer devolveu o cargo de articulador político do governo, acusando ministros do Palácio de sabotarem os acordos que firmava.

 

De perfil técnico, Adams é servidor público, vinculado à carreira de procurador da Fazenda Nacional. Em 2009, foi nomeado Advogado-Geral da União pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Não sou um agente político, sou um agente de Estado que cumpre uma função que também é política", diz. "Isso facilita o diálogo, mas não resolve. As pontes [com Temer] estão sendo construídas, mas a construção de uma ponte demora, é uma questão de credibilidade. Confiança se conquista, mas é demorada, há um processo em curso que ainda vai evoluir".

 

Mas desde a crise relativa ao julgamento das "pedaladas fiscais" no Tribunal de Contas da União (TCU), Adams passou a frequentar mais o restrito núcleo próximo a Dilma. No dia 2 de dezembro, data do acolhimento do impeachment, Adams era um dos quatro que ajudou Dilma a redigir o pronunciamento oficial. Os outros três eram Wagner, Cardozo e o assessor especial Giles Azevedo.

 

Ele admite a "fadiga de material" decorrente de tantos anos à frente da instituição, mas diz que o "desafio" ainda o motiva. "É o que mantém a mente viva". Comprometido com Dilma até o desfecho do processo, Adams diz que a missão mais difícil "é a próxima". Mas ressalta que o impeachment é peculiar, porque apesar do raciocínio técnico, este acaba desqualificado por causa da disputa de poder. "A desqualificação política interessa".