Valor econômico, v. 16, n. 3918, 08/01/2016. Brasil, p. A3

Tombo maior da indústria piora herança de 2016

Arícia Martins e Robson Sales – Valor Econômico

A trajetória negativa da indústria se intensificou em novembro de 2015 e piorou perspectivas já ruins para o desempenho do setor neste ano. Na comparação com outubro, a produção industrial registrou o sexta recuo consecutivo e caiu 2,4%, feitos os ajustes sazonais, com tombo de 10,9% no setor extrativo e de 1,9% no de transformação, segundo a Pesquisa Industrial Mensal-Produção Física, divulgada ontem pelo IBGE.

O resultado ficou abaixo do piso das projeções de 17 analistas consultados pelo Valor Data, de recuo de 1,8%. A média contava com retração de 0,8%. Com a surpresa desfavorável, a herança estatística deixada pela produção industrial para o ano seguinte ficou ainda mais fraca, dizem economistas, em torno de -6%. Por isso, mesmo com alguma ajuda do setor externo, a indústria terá mais um ano medíocre, depois de queda acima de 8% em 2015. Com o dado de novembro, a produção industrial está 19,2% abaixo do pico histórico registrado em junho de 2013 e regrediu ao nível de janeiro de 2009.

De janeiro a novembro do ano passado, a atividade industrial encolheu 8,1% sobre o mesmo período de 2014. Em relação a igual mês do ano anterior, o recuo foi de 12,4%, o maior para o mês desde 2003.

Em relação a outubro, a maior influência negativa partiu do setor extrativo, que representa cerca de 11% da indústria, seguida da queda de 7,8% na produção de coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis. Os dois setores foram afetados, respectivamente, pelo rompimento de uma barragem da Samarco em Mariana (MG) e pela greve dos petroleiros.

Alexandre Andrade, da GO Associados, diz que o impacto do setor extrativo sobre a indústria em novembro foi significativo, mas não determinante para a queda mais forte do que o esperado da produção total. “A surpresa maior é em relação à atividade, que se enfraqueceu de maneira mais rápida e acentuada no segundo semestre.

A indústria acumulou perda 11,7% em outubro e novembro, retração mais forte que a registrada no terceiro trimestre, de 9,4%, e também abaixo dos resultados do primeiro e segundo trimestres (quedas de 5,7% e de 6,3% sobre igual período de 2014). Para Andrade, a deterioração do consumo das famílias é o principal fator responsável pelos números mais fracos do setor. O desaquecimento do mercado de trabalho e do crédito apontam que o declínio tende a se acentuar nos próximos meses.

A queda da produção em novembro impõe viés de baixa ao cenário já bastante negativo para a indústria neste ano, diz Rafael Bacciotti, da Tendências Consultoria. Como a previsão de retração de 8% para a atividade em 2015 será revista para baixo, a estimativa para 2016, atualmente em contração de 3%, também deve ser cortada. “É bem provável uma queda maior da produção neste ano”, diz Bacciotti, tendo em vista não somente o efeito estatístico do ano anterior, mas também o nível de estoques em excesso no setor industrial e a fraqueza da demanda interna.

Segundo André Macedo, gerente da coordenação de indústria do IBGE, o desastre ambiental ocorrido em Mariana deve ter reduzido a produção da indústria extrativa também em dezembro. Além desse efeito, Macedo afirmou que a conjuntura formada por crédito mais caro e restrito, inflação elevada, demissões e queda da renda estão afetando diretamente o setor industrial. “O ambiente de incerteza econômica e política traz para os empresários um adiamento das decisões de investimento e pelo lado das famílias, um adiamento nas decisões de consumo”, disse.

Refletindo esse quadro, os fabricantes de bens de capital e de bens duráveis seguem com desempenho pífio (ver quadro). A equipe da Rosenberg Associados observa que, com exceção do segmento voltado para a produção agrícola, todas as demais aberturas relacionadas aos investimentos estão indo “de mal a pior”, com destaque para os bens de capital para construção, cuja produção caiu 53,9% sobre novembro de 2014.

Na passagem mensal, a produção de insumos típicos da construção civil encolheu 1%, segundo cálculos com ajuste sazonal da Rosenberg. “Com a desaceleração das concessões de financiamento imobiliário e o mercado de trabalho em deterioração, sem mencionar o imbróglio em que a construção civil se encontra por conta da Lava-Jato, a tendência é de continuidade desta trajetória de queda”, afirma a consultoria em relatório.

O único elemento positivo é o câmbio mais desvalorizado, que ajudou alguns setores. Macedo, do IBGE, cita como exemplo a produção de celulose, que cresceu 4,5% nos últimos dois meses, na comparação com igual período de 2014. “O câmbio favorece determinados itens, mas não é suficiente para reverter o ritmo de queda que a indústria mostra”, diz Macedo.

Para Bacciotti, da Tendências, “no médio prazo existe a possibilidade de alguma melhora do desempenho da indústria por conta da depreciação cambial, mas no curto prazo é difícil observar esse efeito positivo”.

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Produção de bens de capital retrocede mais de dez anos e vai afetar retomada

Denise Neumann
 
A produção de bens de capital caiu 24% nos 12 meses encerrados em novembro do ano passado e retrocedeu mais de dez anos. O volume produzido de máquinas, equipamentos, veículos pesados, tratores e outros produtos desse grupo no trimestre encerrado em novembro é semelhante ao de boa parte do ano de 2004.

Ao longo desses 11 anos, o pico da produção de bens de capital foi semelhante em três períodos, sempre em meados do ano: 2008, 2011 e 2013. Em relação a esses momentos, a produção do trimestre encerrado em novembro foi 40% menor, na série com ajuste do IBGE.

No conjunto, a produção industrial caiu 8,1% no acumulado do ano e 7,7% em 12 meses, considerando novembro de 2015. O penúltimo mês de 2015 foi muito ruim (queda de 2,4% sobre outubro na série com ajuste), não apenas devido ao acidente na Samarco e da greve dos petroleiros. A produção do setor de transformação caiu 1,8%, com recuo forte em outros setores, além das refinarias de petróleo. Onde houve crescimento, como veículos, a alta mal arranhou a queda nos meses anteriores.

Na média, o bimestre outubro-novembro registrou queda de 3,2% em relação ao terceiro trimestre do ano. Mesmo que dezembro zere toda a retração de novembro, ainda assim esse será o patamar de queda do período. Talvez sugira um PIB ainda menor que o já previsto no último trimestre do ano.

Se a produção geral resume a brutal recessão de 2015, a queda na fabricação de bens de capital indica que há uma perda de capacidade produtiva e de produtividade em gestação. A indústria sairá dessa crise defasada tecnologicamente e pior preparada para ganhar mercados no exterior, uma das saídas na qual se aposta para a retomada do crescimento.

A importação de bens de capital – que poderia ser um contraponto – também está em queda. O volume importado desse grupo foi 19% menor de janeiro a novembro de 2015 em relação a igual período de 2014.

Por segmento, a produção doméstica mais recente mostra que a crise afeta fortemente setores que antes ajudavam a economia, como a agricultura. Entre o pico mais recente da produção de bens de capital agrícolas e o trimestre encerrado em novembro de 2015, a queda supera 35% em peças e é de 28% em bens agrícolas finais.

Outro segmento afetado é o de construção, cujo auge foi atingido no primeiro semestre de 2014. De lá para a cá, o recuo já chega a 48%, refletindo os efeitos da Lava-Jato, da desaceleração de programas como PAC e Minha Casa, Minha Vida e da contenção e aumento do custo do crédito imobiliário.

Por isso, como são fortes e generalizados, os efeitos da atual contração na produção de bens de capital serão sentidos muito além do biênio recessivo já contratado.
 
Via: Folha de São Paulo — Clipping de notícias de Leônidas Herndl, com informações do país e do mundo, além de finanças, economia e demais temas pertinentes.