O globo, n. 30082, 17/12/2015. País, p. 4

MPF diz que mensagens revelam relação espúria com empreiteiros

 

TIAGO DANTAS

B.O. sobre desafeto de Cunha é encontrado em paletó de peemedebista.

-BRASÍLIA- A Polícia Federal encontrou trocas de mensagens de celular entre o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e os empreiteiros Leo Pinheiro, ex-presidente da OAS, e Otávio Azevedo, presidente afastado da Andrade Gutierrez. Os dois executivos são investigados pela Operação Lava-Jato. As mensagens foram usadas pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para embasar o pedido de afastamento de Cunha do cargo. Para o MPF, as mensagens são indícios de que Cunha usava a função de deputado para negociar textos de medidas provisórias.

“Se esta atuação ilícita ocorria enquanto Cunha não era presidente da Câmara, certamente referido cargo lhe dá muito maiores poderes para atender aos interesses espúrios dos empresários, pois é o presidente da Câmara o responsável por estabelecer a pauta de votação da Casa e, ainda, interferir na escolha de diversos cargos estratégicos para tais votações”, diz Janot.

No pedido de afastamento de Cunha, o Ministério Público Federal afirma que dois boletins de ocorrência relacionados ao deputado Fausto Pinato (PRBSP), ex-relator do caso de Cunha no Conselho de Ética, foram apreendidos, um deles no paletó de Cunha e outro no escritório. O segundo documento tratava de uma briga com agressão física envolvendo Pinato.

“O interesse do Eduardo Cunha possivelmente era conhecer a extensão de fatos supostamente desonrosos envolvendo o Deputado Fausto Pinatopara que pudesse, de alguma maneira, constrangê-lo caso levasse adiante o intento de prejudicar o Eduardo Cunha junto ao Conselho de Ética”, diz o MP. PARA STF, ATOS ILÍCITOS

Segundo o documento enviado ao Supremo Tribunal Federal, as trocas de mensagem também mostrariam “negociações ilícitas envolvendo liberação do FIFGTS/CEF” entre Leo Pinheiro e Cunha. Embora faça menção ao fundo de investimento do FGTS, o documento apresentado pela Procuradoria não reproduz a troca de mensagens que trata exclusivamente deste assunto.

Nas mensagens, enviadas entre 2012 e 2014 e encontradas nos celulares dos dois executivos, são discutidas emendas a medidas provisórias que beneficiariam as construtoras. Para o MP, Cunha recebia propina dos empresários para atender aos seus interesses. Em troca de mensagens entre Cunha e Pinheiro, de outubro de 2012, o deputado cobrou dívida que envolvia prestações de R$ 1,5 milhão e R$ 400 mil, segundo a análise dos procuradores.

A denúncia sugere que textos de emenda eram escritos por executivos da OAS. Diretor Operacional da OAS Bahia, Manuel Ribeiro Filho era tratado pelo presidente da companhia como "escriba". Em uma mensagem de 3 de abril de 2013, Ribeiro Filho escreve para Pinheiro: “Mandei para seu emeio (sic) as emendas de EC refeitas."

O parecer cita que dois parlamentares que teriam apresentado emendas negociadas por Cunha: Sandro Mabel (PMDB-GO) e Francisco Dornelles (PP-RJ), atual vice-governador do Rio.

Em troca de mensagens de 25 de setembro de 2012 entre Pinheiro, Cunha e Roberto Zardi, diretor de relações institucionais da OAS, Zardi pergunta: “A emenda da desoneração da mão de obra, quem poderia assinar?”. Um número de telefone indicou Mabel. Na sequência, Zardi diz que o nome lhe agrada e pergunta se Cunha pode pegar a assinatura do outro deputado. No dia seguinte, Mabel apresentou cinco emendas à MP 582. Uma delas inclui empresas da construção civil em uma lista de desoneração da folha de pagamento.

Segundo Janot, Cunha recebia valores “seja por doações oficiais, para si ou para os deputados que o auxiliavam ou por meio de pagamentos ocultos”. Mabel não foi localizado e a assessoria de Dornelles disse que não conseguiu localizá-lo.

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Vice da Câmara responde a dois processos no STF

Maria Lima e Evandro Éboli

Waldir Maranhão será o sucessor de Cunha em caso de afastamento.

-BRASÍLIA- Personagem de duas operações da PF para apurar desvios de recursos públicos — a Miqueias e a Lava-Jato —, o maranhense Waldir Maranhão (PP), vice-presidente da Câmara, será o sucessor de Eduardo Cunha em caso de seu afastamento do cargo. Ele responde a dois inquéritos no STF por suposta participação num esquema de desvios de recursos de Fundos de Previdência municipais, desbaratado em 2013 pela Polícia Federal na Operação Miqueias. Nos dois inquéritos, é investigado por crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos ou valores.

Já na Lava-Jato, Maranhão integra a lista de deputados investigados por supostamente ter recebido repasses mensais que variavam de R$ 30 mil a R$150 mil. Maranhão é tido como um político discreto. Do baixo clero e com atuação pouco expressiva, depois que a situação de Cunha se agravou, passou a frequentar o cafezinho do plenário e agendou conversas reservadas para se pôr como alternativa ao atual presidente. Depois, recuou e ajudou Cunha ao fazer o processo contra ele no Conselho de Ética voltar à estaca zero.