O globo, n. 30082, 17/12/2015. País, p. 10 -11

Renan acusa Temer de ser responsável pela divisão do PMDB

 

CRISTIANE JUNGBLUT 

MARIA LIMA 

Senador chama de retrocesso decisão de proibir filiação de deputados.

-BRASÍLIA- O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), culpou ontem o presidente nacional do PMDB e vice-presidente da República, Michel Temer, pela crise interna do partido e pelos problemas na coalizão. Irritado, Renan disse que é um erro o PMDB se reunir para proibir filiações de deputados de outros partidos, como decidido ontem pela Executiva Nacional, e afirmou que o ex-deputado Ulysses Guimarães, maior símbolo da história do partido, deveria estar “tremendo na cova” com uma atitude dessas. Ulysses morreu em 1992, em desastre de helicóptero no mar de Angra dos Reis; seu corpo nunca foi encontrado.

— Fazer reunião para proibir (filiações)? Um partido democrático, que não tem dono, que se caracteriza por isso, fazer reunião para proibir a entrada de deputado é um retrocesso que deve estar fazendo o doutor Ulysses tremer na cova. — disse.

— É ao presidente do partido que cabe construir a unidade partidária. A quem serve a divisão do PMDB? O presidente tem responsabilidade por essa divisão — afirmou Renan, em novo ataque a Temer.

O presidente do Senado disse que o PMDB, quando assumiu a coordenação política do governo, comandada por Temer, só se preocupou com a nomeação de pessoas e cargos.

— Acho que o PMDB tem muita culpa. Quando foi chamado para coordenar o processo político, do governo, da coalizão, o PMDB se preocupou apenas com o RH. Eu adverti sobre isso na oportunidade. O PMDB perdeu a oportunidade de qualificar sua participação no governo. O governo tem culpa mas o PMDB também tem muita culpa com o que está acontecendo — disse.

O governo e o ex-líder do PMDB na Câmara Leonardo Picciani são acusados por aliados de Temer de tentar filiar novos deputados ao partido. O objetivo seria conseguir apoio

para restituir Picciani à liderança e, assim, indicar parlamentares pró-governo para a comissão do impeachment.

A decisão tomada ontem pela Executiva Nacional do PMDB impede o ingresso ao partido de deputados federais que estavam se transferindo para ajudar na recondução de Picciani. O ex-líder disse que irá à Justiça:

— Lamento o que aconteceu. Hoje, a comissão executiva escreveu uma página ruim, triste da história do PMDB, um partido que teve tantas páginas bonitas na História do Brasil, sobretudo, na defesa da democracia, das liberdades.

A mudança no regimento ocorre com o aval de Temer. Uma das filiações que não será aceita é a do deputado Altineu Cortês (PR-RJ). Sua saída do PR para o PMDB teve a participação da presidente Dilma Rousseff. Ela pediu ao PR que aceitasse perder Cortês para que Picciani ganhasse um voto e retomasse a liderança.

Horas após sua primeira declaração, Renan voltou à carga: disse que o vice tem responsabilidade na divisão do PMDB. E criticou a ação de Temer na coordenação política do governo:

— Quando foi chamado a coordenar politicamente o governo, o PMDB só queria saber de cargos, planilhas, 200 cargos, 100 cargos. O PMDB minimizou no governo seu próprio papel. Agora, com essa decisão da Executiva de querer botar uma tranca na porta de um partido democrático e sem dono, isso é um retrocesso, um horror — disse.

No PMDB, parlamentares atribuíram a fala de Renan a quatro fatores: o agravamento de sua situação na Operação Lava-Jato; a tentativa de se cacifar junto ao Planalto; a “antipatia antiga” entre ele e Temer; e o acirramento da disputa entre o grupo do Senado e da Câmara.

Temer reagiu em nota, publicada em primeira mão no blog de Jorge Bastos Moreno. Nela, Temer diz que cabe à Executiva do partido “tomar decisões que preservem o partido de manobras e artimanhas”: “É correta a afirmação de que o PMDB não tem dono. Nem coronéis. Por isso, suas decisões são baseadas no voto. (...) O deputado Ulysses Guimarães foi a maior liderança do PMDB. Qualquer jovem peemedebista sabe que seu desaparecimento se deu em um acidente em Angra dos Reis, em 1992. Seu corpo repousa no fundo do mar e devemos manter o respeito à sua história e sua memória, sem evocar seu nome em discussões que em nada enobrecem seu exemplo de retidão, honestidade e decência para todo o PMDB”.

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Pedro Paulo volta à Câmara para socorrer Picciani

Fernanda Krakovics e Marco Grillo

Na disputa pela liderança do partido, bancada do PMDB do Rio cresce 33%.

O deputado federal Pedro Paulo Carvalho reassumiu ontem o mandato na Câmara, como parte de uma estratégia do PMDB do Rio para devolver a liderança do partido na Casa a Leonardo Picciani (PMDB-RJ). O objetivo é conseguir um número suficiente de assinaturas na bancada para retirar Leonardo Quintão (PMDB-MG) do posto.

As movimentações, que começaram semana passada, fizeram com que a bancada fluminense saltasse de 9 para 12 deputados. A 13ª vaga está próxima de ser preenchida, já que o suplente Átila Alexandre Nunes (PMDB-RJ) já foi convocado pela Mesa Diretora e protocolou ontem seu afastamento da Câmara de Vereadores do Rio.

A estratégia é comandada pela cúpula do PMDB no Rio, com o apoio do governo federal. Desde a semana passada, três deputados de partidos que estavam coligados com o PMDB na eleição para deputado federal em 2014 foram contemplados com secretarias nos governos de Luiz Fernando Pezão e Eduardo Paes. Os suplentes que assumiram as vagas pertencem ao PMDB.

Alexandre Serfiotis (PSD-RJ) foi nomeado para a Secretaria municipal de Ciência e Tecnologia; Walney Rocha (PTB-RJ) assumiu a Secretaria municipal de Abastecimento e Segurança Alimentar, e Deley (PTBRJ) tornou-se o novo secretário estadual de Esporte, Lazer e Juventude. Esse posto ficou aberto após a saída de Marco Antônio Cabral (PMDB-RJ), que reassumiu o cargo em Brasília também com o intuito de fortalecer Leonardo Picciani. FILIAÇÃO EMPERRADA

A vaga que ficará com Átila Alexandre Nunes foi aberta com uma manobra mais elaborada. O futuro deputado ficou, em 2014, como primeiro suplente da coligação feita por Solidariedade e PSL. O único eleito pela aliança, Ezequiel Teixeira, assumiu anteontem a Secretaria estadual de Assistência Social e Direitos Humanos. Teixeira trocou recentemente o Solidariedade pelo PMB, enquanto Nunes saiu do PSL em outubro rumo ao PMDB. Mas, como a Câmara reconhece as vagas de acordo com as coligações estabelecidas na eleição, o PMDB será beneficiado.

Uma outra parte da estratégia, a de filiar deputados de outros partidos, esbarrou na Executiva Nacional, que decidiu ontem que as transferências de deputados federais precisam passar pelo colegiado nacional, e não mais pelos diretórios estaduais. Altineu Côrtes (PR-RJ) e Dr. João (PR-RJ) estavam com conversas avançadas para mudar de legenda. Outro sondado foi Nelson Nahim (PSD-RJ), agora o próximo suplente da fila. 

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PF mira três assessores do presidente do Senado

VINICIUS SASSINE

Inquérito, que tramita em sigilo, foi aberto a partir de acusações de empreiteiro.

-BRASÍLIA- Num dos inquéritos que levaram à Operação Catilinárias, deflagrada anteontem, a Polícia Federal pediu a investigação da atuação de três assessores do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e também a busca por provas da relação entre o senador e o dono da construtora UTC, Ricardo Pessoa, como consta em documento obtido pelo GLOBO. O inquérito tramita de forma oculta no Supremo Tribunal Federal (STF) e foi instaurado a partir das acusações feitas por Pessoa em sua delação premiada.

Na Catilinárias, a PF cumpriu mandados de busca e apreensão, com reunião de provas para sete inquéritos da Operação Lava-Jato no STF, incluindo esse procedimento oculto. A Procuradoria Geral da República (PGR) chegou a pedir buscas na residência oficial de Renan em Brasília, negado pelo ministro relator da Lava-Jato no STF, Teori Zavascki. Os pedidos da PGR e as decisões de Teori sobre as buscas e apreensões também são mantidos sob sigilo.

DOAÇÕES OFICIAIS A RENAN

Antes dessas buscas da Catilinárias, a PF já ampliara as investigações sobre a suposta participação de Renan na Lava-Jato. Em 30 de setembro deste ano, o delegado Felipe Alcântara Leal pediu ao núcleo de análises da PF a identificação de “Marcos e Everaldo e Bruno Mendes, citados como assessores de Renan Calheiros”. O delegado pediu uma pesquisa “nos bancos de dados disponíveis, compilando os registros pessoais, societários e/ou criminais, além de pesquisas em fontes abertas”.

Na delação premiada, Pessoa afirmou ter feito doações oficiais a Renan e que se encontrava com o senador em São Paulo com regularidade. Ele considerava “útil um bom relacionamento com o parlamentar”. O empreiteiro citou os restaurantes em que Renan costumava jantar, dos hotéis Unique e Emiliano, e que “normalmente pagava a conta dos jantares”. Os jantares eram marcados por Everaldo e por Marcos, conforme a delação.

Num dos jantares, Renan teria pedido doação ao filho, Renan Filho, eleito governador de Alagoas. O pedido foi feito após Renan questionar se a UTC já havia ganho contratos para as obras da usina nuclear Angra 3, em Angra dos Reis, segundo Pessoa. Ficou definida uma doação de R$ 1,5 milhão. “O declarante entendeu que poderia descontar as contribuições de Renan Filho da propina de Angra 3”, cita um dos termos de colaboração. Procurada, a assessoria de Renan não retornou.