Paulo Silva Pinto
25/11/2015
Quem tem mais de 40 anos já viu este filme. No tempo da superinflação, antes do Plano Real, era só receber o salário e todo mundo corria para aplicar o dinheiro, mesmo que precisasse pagar contas dali a dois dias. Qualquer rendimento era importante para evitar a perda do poder de compra com a remarcação diária de preços. Essa época exibe sinais novamente, com a insistência cada vez maior dos bancos para a adesão dos clientes às contas remuneradas. Os juros são muito baixos, mas, argumentam, vantajosos para quem vai só precisar do dinheiro dentro de alguns dias. “Bom mesmo é para os bancos, que tiram ou pouquinho de dinheiro daqui e dali e acabam ganhando com isso no mercado”, diz o economista Felipe Chad, da DXI Planejamento Financeiro.
Saldo em conta-corrente é indesejável para a instituição financeira, que é obrigada a entregar 45% do valor no Banco Central (BC), na forma de depósito compulsório, e não recebe remuneração por isso. Já o dinheiro que está em algum tipo de aplicação é depósito a prazo, e tem compulsório de apenas 25%. Detalhe importante: por esses recursos, a instituição é remunerada pela Selic, a taxa básica de juros, atualmente em 14,25% ao ano. Com o restante do dinheiro, o banco pode fazer o que quiser. E quem toma dinheiro emprestado sabe que o que se cobra é muito superior à Selic.
O problema do crédito é a inadimplência, que está crescendo. Muitos bancos voltaram a contar, para ter lucro, com a atividade a que estavam acostumados na era pré-Real: emprestar dinheiro ao governo. “O crédito ainda cresce, mas muito menos do que antes”, disse o analista da Austin Rating Luís Miguel Santacreu. “Com as taxas de juros que temos, entre as maiores do mundo, os bancos buscam rentabilidade nas operações de tesouraria”, explicou. Por isso, mesmo com o aumento das provisões, recursos que precisam ser reservados para enfrentar a inadimplência, os lucros não param de crescer.
A demanda por papéis com alta liquidez, necessários para que os bancos tenham dinheiro para entregar aos clientes que fazem saques em aplicações com resgate automático, esbarra em um problema: a escassez de papéis de curto prazo, lastreados à Selic, nas ofertas do Tesouro Nacional. O órgão evita lançá-los no mercado para não piorar o perfil da dívida pública. Mas o BC acaba sendo obrigado a fazer operações compromissadas, nas quais oferece títulos do governo que estão em sua carteira, comprometendo-se com a recompra. São operações com alto custo para a autoridade monetária. Em setembro, o estoque de compromissadas era de R$ 836,4 bilhões.
Perdas
O Santander foi a única instituição a fornecer informações sobre a conta remunerada que oferece aos clientes: a ContaMax, com juro igual ao da poupança, mesmo que os recursos sejam mantidos por menos de um mês. A conta do Bradesco é a InvestPlus, que oferece 5% do CDI, taxa muito próxima à Selic. O Itaú tem a Aplicação Automática Mais, que, para aplicações até 30 dias, paga 2% de outra taxa quase idêntica à Selic, a média da Cetip. Banco do Brasil e Caixa informaram que não oferecem contas remuneradas.
Se optar por colocar o dinheiro em um fundo de investimentos e sacar em menos de 30 dias, o correntista pagará alíquota elevada de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF): no primeiro dia, chega a 96% da remuneração, além do Imposto de Renda (IR) de 22,5%. Não sobra quase nada. Apesar de o cliente ficar livre dessa tungada na conta remunerada, ela raramente vale a pena, na avaliação do presidente da Bullmark, Renato Nobile. “É muito difícil a pessoa manter uma quantia considerável parada na conta por tão pouco tempo. Se deixar na conta remunerada por mais de um mês, perde dinheiro, em comparação com outras aplicações”, explicou. O BC alertou os clientes para que exijam do banco que apenas com a autorização deles o dinheiro seja colocado na conta remunerada.
Correio braziliense, n. 19175 , 25/11/2015. Economia, p. 8