O globo, n. 30080, 15/12/2015. País, p. 3

Paes: poder se ganha no voto

 

SELMA SCHMIDT, SIMONE IGLESIAS E TIAGO DANTAS 

Prefeito assina carta de repúdio ao processo e diz que PMDB deve respeitar instituições.

“O poder se ganha disputando eleição. Defendo que o PMDB tenha uma candidatura própria em 2018 e aí assim chegue ao poder”
Eduardo Paes
Prefeito do Rio

Num gesto que expôs ainda mais a divisão no PMDB, o prefeito Eduardo Paes condenou a ação da ala do partido que trabalha pelo impeachment da presidente Dilma e é ligada ao vice-presidente Michel Temer. Além de assinar manifesto de 14 prefeitos de capitais de apoio a ela, Paes disse que o PMDB tem de chegar ao poder pelo voto e que vencer “na mão grande” é vergonhoso, referindo-se à troca do líder na Câmara. Pelo menos dez diretórios do PMDB querem antecipar a convenção para decidir sobre o rompimento com Dilma. -RIO E BRASÍLIA. -Em meio à divisão interna no PMDB sobre o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, condenou a postura de parte do partido, que se empenha pelo afastamento da presidente, e defendeu que o PMDB chegue ao poder pelo voto popular. Nome forte no partido e cotado como um dos possíveis presidenciáveis em 2018, Paes pregou respeito às instituições brasileiras.

— O poder se ganha disputando eleição. Defendo que o PMDB tenha uma candidatura própria em 2018 e aí assim chegue ao poder — afirmou Paes, antes de receber prêmio de empreendedorismo, ontem à tarde, no Copacabana Palace.

O prefeito do Rio, que deixou a cerimônia para participar de uma reunião de prefeitos com Dilma, em Brasília, na qual foi entregue um manifesto contra o impeachment, disse que o PMDB precisa cumprir seus compromissos até o fim:

— O PMDB assumiu em 2014 uma chapa com a presidenta Dilma. Em 2018, o PMDB deve ter uma candidatura própria. Agora, o PMDB deve chegar ao poder pela via legítima do voto popular, algo tão caro ao partido.

Ele condenou ainda a destituição de Leonardo Picciani (RJ) da liderança do PMDB na Câmara e sua substituição por Leonardo Quintão (MG), na semana passada.

— Tinha uma eleição convocada para fevereiro. Essa é mais uma medida que desrespeita valores institucionais. Respeito o direito do Quintão de ser líder do PMDB, mas deveria esperar a hora da votação, em fevereiro, e colocar o seu nome. Esse tipo de atitude de levar as coisas meio “na mão grande” prejudica a imagem do partido, que sempre teve como marco o respeito às instituições. Esse tipo de coisa me envergonha como peemedebista.

Ao defender a permanência de Dilma na Presidência, Paes, que se tornou portavoz informal dos prefeitos pró-Dilma, afirmou que seu partido não esconde suas ambições políticas.

— O PMDB nunca escondeu sua vontade de estar no poder, mas sempre marcada pelo respeito ao voto da população. Também estou sedento para estar com o PMDB na Presidência da República, mas quero que o PMDB dispute a eleição de 2018. Se vencer, estará na presidência.

MANIFESTO DE 14 PREFEITOS

Paes defendeu, principalmente, o respeito às instituições democráticas e acusou o jogo político que envolve o processo de impeachment :

— Há um certo jogo de barganha com as instituições brasileiras nesse caso. Quer se contestar a Dilma, que se conteste. Quer se fazer oposição, que se faça. Daí a fazer um processo de impedimento por impopularidade e porque não se concorda com a política econômica, acho um pouco demais. Não é uma questão de ser ou não aliado da presidenta. É uma questão de respeito às instituições brasileiras.

No entendimento de Paes, não há nada que leve a um crime de responsabilidade e que justifique um processo de impeachment contra a presidente:

— Historicamente, o PMDB tem sido defensor das instituições. A gente espera que esse papel, que é uma marca do PMDB, continue nos orgulhando como peemedebistas. A presidenta venceu as eleições de 2014. E não vivemos, hoje, um regime parlamentarista, em que popularidade e problemas econômicos possam ser resolvidos com queda de governo. No sistema presidencialista, que é o sistema brasileiro, e a presidenta Dilma foi eleita nesse sistema, o que temos é um processo em que você pressiona para que o governo avance.

Em Brasília, depois de entregar à presidente carta de repúdio ao impeachment assinada por 14 prefeitos, Paes foi ainda mais duro ao dizer que o PMDB não pode se afastar da legalidade.

— A gente tem que ter posição neste momento: o PMDB está a favor da democracia, da garantia das instituições, ou quer defender um autoritarismo ou, não vou usar a expressão golpe, mas algo parecido com isso?

Sem citar nomes, o prefeito declarou que certas atitudes de políticos do PMDB não “condizem com a história do partido”, mas não se furtou a comentar a atuação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que aceitou o pedido de impeachment de Dilma e enfrenta processo por quebra de decoro no Conselho de Ética.

— Eduardo Cunha é muito mais presidente da Câmara do que um quadro do PMDB. Acho que a população está julgando as suas atitudes. Mas não quero personificar. Quero falar do meu partido. Precisa ter serenidade — disse Paes, após sair do encontro com outros cinco prefeitos que levaram a Dilma o manifesto contra o impeachment.

HADDAD NÃO COMPARECEU

A carta de repúdio ao impeachment foi entregue a Dilma por seis prefeitos, no Palácio da Alvorada. Embora tenha assinado o manifesto, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT) não compareceu.

A carta diz que Dilma Rousseff tem demonstrado “retidão institucional e compromisso público no exercício de suas funções” e que a análise do pedido de afastamento da presidente se “inicia eivada de vícios”. Segundo o documento, “não há atos ou fatos que respaldem o início de um processo dessa natureza”.

Além de Paes, encontraram-se com Dilma os prefeitos de Palmas, Carlos Enrique Franco Amastha (PSB); de Macapá, Clécio Luís Vilhena Vieira (sem partido); de Campo Grande, Alcides Bernal (PP); de Fortaleza, Roberto Claudio Rodrigues Bezerra (PDT); e de Goiânia, Paulo Garcia (PT).

Antes de se despedir dos prefeitos, segundo Garcia, Dilma fez um apelo.

— Um colega nosso perguntou: “O que a senhora quer que a gente faça?” E ela respondeu: “Defendam a democracia”.

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PMDB aguarda decisão do STF para decidir se faz convenção

 

SIMONE IGLESIAS, JÚNIA GAMA E MARIA LIMA 

(Colaborou Washington Luiz)

Grupo ligado a Temer quer discutir saída do governo; para senadores, é ‘blefe’.

-BRASÍLIA- A cúpula do PMDB aguarda a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a validade da eleição da chapa avulsa na comissão do impeachment para decidir se convoca uma convenção do partido para avaliar a permanência no governo Dilma Rousseff. Segundo um cacique da legenda, se o STF entender que a eleição foi legítima, a volta do ex-líder Leonardo Picciani (PMDB-RJ) à liderança da bancada na Câmara ficaria dificultada, em função do fortalecimento da ala pró-impeachment. No entanto, se o tribunal decidir por nova eleição, e Picciani conquistar apoios para retomar o posto, não haverá alternativa na avaliação dos dissidentes, senão a realização de uma convenção nacional em fevereiro.

Vice-líder do partido e um dos que comandaram a queda de Picciani, Lúcio Vieira Lima PMDB-BA) diz que já são 10 — um a mais que o necessário — os diretórios que querem convocar a Executiva para aprovar a antecipação da convenção de março e deliberar sobre o rompimento com Dilma.

— Vamos aguardar o resultado do STF para saber se vamos pedir a convocação da Executiva para antecipar a convenção. Só quem está segurando Dilma, na Câmara, é Picciani. Mas ele dá opiniões pessoais, sem consultar a bancada — diz Lúcio.

CUNHA FAZ QUEIXAS A TEMER

A avaliação dos caciques do partido no Senado, entretanto, é que o grupo rebelde da Câmara, ligado ao vice-presidente Michel Temer, não conseguirá antecipar a convenção, e o rompimento com o governo é apenas “um blefe”. Na convenção quem tiver 362 votos ganha a direção toda e escolhe o novo presidente da legenda. O diretório do Rio tem 68 votos, e o governador Luiz Fernando Pezão é o maior aliado de Dilma, junto com Picciani.

— Hoje é difícil saber quem ganha convenção no voto. Antecipar a convenção é ruim para o PMDB, que já está dividido. Só quem convoca convenção é a Executiva, e com prazo de 30 dias para registro de chapas com publicação no Diário Oficial — diz Eunício Oliveira (CE), líder do PMDB no Senado.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), se reuniu com Michel Temer na tarde de ontem para se queixar da operação do PMDB do Rio para levar Picciani de volta à liderança no partido na Casa. Na conversa, de cerca de uma hora, Cunha reagiu à manobra feita por Pezão, de exonerar secretários que foram eleitos deputados para fortalecerem a bancada pró-Picciani. Cunha e Temer, no entanto, avaliaram que Picciani ainda não tem votos suficientes para recuperar a liderança. Ao deixar o encontro, Cunha não quis falar com a imprensa. Mais cedo, defendeu a antecipação da convenção.

— Infelizmente, não tenho o que fazer nesse momento para antecipar a convenção. Não sou presidente de diretório estadual e nem da Executiva, porque minha vaga era de líder. Mas espero que a convenção seja antecipada. Acho que o PMDB tem que discutir se permanece ou não no governo, é melhor do que ficar nesse jogo todo dia de confusão para lá e para cá — afirmou.

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Novo líder na Câmara tem indicados no governo

JÚNIA GAMA

-BRASÍLIA- O novo líder do PMDB na Câmara, Leonardo Quintão (PMDB-MG), levado ao posto pela ala antigovernista do partido, não tem motivos para se queixar do Palácio do Planalto. Se foi rejeitado pela presidente Dilma Rousseff para se tornar ministro — seu nome foi cogitado em ao menos três oportunidades —, Quintão acabou recompensado com cargos nos segundo e terceiro escalões, tanto na esfera federal, quanto em Minas Gerais, onde o governador petista Fernando Pimentel nomeou aliados seus.

Segundo conhecedores da distribuição de cargos no governo, Quintão é um dos parlamentares mais bem representados na máquina pública. Somente este ano, conseguiu emplacar dois indicados para cargos chave. Um deles foi o superintendente do INSS Regional Sudeste II, Paulo Eduardo Cirino, nomeado em junho.

APADRINHADO FOI AFASTADO

Outra nomeação de Quintão foi a do superintendente do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) em Minas Gerais, Paulo Sérgio Costa Almeida, que assumiu o posto em novembro deste ano.

Antes disso, Quintão teve um apadrinhado, Sérgio Dâmaso, como diretor-geral do DNPM nacional, desde 2011. Ele acabou sendo exonerado em maio deste ano, quando uma investigação do Ministério Público revelou seu envolvimento em um esquema de exploração ilegal de pedras preciosas.