Sem sirenes, empresa diz que fez alerta por telefone

 

Bruno Ribeiro

O Estado de São Paulo, n. 44580, 07/11/2015. Metrópole, p. A22

 

Diretor-presidente da Samarco, mineradora responsável pelas barragens que romperam em Mariana (MG), Ricardo Vescovi disse que a empresa cumpriu todas as regras do programa de emergência aprovado pela prefeitura ao constatar a ruptura das barreiras. A Defesa Civil foi avisada e, segundo ele, alguns moradores foram alertados, por telefone, da tragédia

A falta de alarme sonoro para antecipar a reação da população foi uma queixa constante entre as famílias que ficaram desabrigadas. “Mas não temos esse aviso. A lei de segurança das barragens é a 12.334, de 2010, e nós a cumprimos integralmente”, afirmou o coordenador de projetos da empresa, engenheiro Germano Silva Lopes.

A Lei 12.234 prevê “Plano de Ação de Emergência” quando for exigido pelo órgão fiscalizador. “O plano deverá, entre outras disposições, conter uma estratégia e meio de divulgação e alerta para as comunidades potencialmente afetadas em situação de emergência.” Mas não se especifica de que forma o alerta deve ser feito.

O prefeito de Mariana, Duarte Júnior (PPS), disse que a Samarco vem prestando “toda assistência” à população e não comentou a falta da sirene. “Eles emprestaram boa parte do maquinário usado nos resgates.”

Obras. Segundo a Samarco, a primeira barragem a romper, a do Fundão, tinha 7 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mina e vinha passando por obras de ampliação. A segunda, de Santarém, tinha 55 milhões de litros de água. “Por volta das 14 horas, foi ouvido um tremor na barragem do Fundão. Foi feita uma vistoria e nada se constatou de anormalidade”, disse Lopes. Por volta das 15 horas, porém, aconteceu a ruptura da primeira barragem, que provocou a quedada segunda e o despejo de 62 milhões de toneladas de lama na população de Bento Rodrigues, distante40minutos do centro de Mariana. Foi quando o plano de telefonemas entrou em ação.

A Barragem do Fundão passava por uma obra de alteamento, segundo a empresa. Operários vinham utilizando um dreno no local para preparar a ampliação das barreiras de concreto, o que aumentaria a capacidade de armazenamento dos resíduos. Ambos os reservatórios estavam com capacidade máxima de operação.

Seguro. A Samarco informou ainda que está acionando o seguro para a cobertura da tragédia, mas não especificou os danos cobertos. A empresa de mineração deve ficar responsável pela recuperação dos danos causa dos ao meio ambiente. De acordo com o advogado Danilo Miranda, especialista em Direito ambiental e concessões minerárias, nesse caso a recuperação independe de se ter ou não culpa pelo desastre. “É responsabilidade objetiva, independe da apuração da causa.”

Se houver comprovação de que houve culpa de terceiros, a empresa poderá acionar eventuais responsáveis, sem que isso a isente da reparação do dano ambiental. Caso se confirme que eventual omissão na conservação ou imperícia no manejo da barragem contribuíram para o rompimento, os diretores podem ficar sujeitos à penalização criminal por morte e lesão. A empresa também deverá responder legalmente pelos danos materiais causados aos moradores atingidos pela lama.

O promotor de Diretos Humanos da Vara de Mariana, Guilherme de Sá Meneghin, começou ontem a tomar os primeiros depoimentos de moradores atingidos pelo rompimento das barragens. “Vamos ingressar com ações civis o quanto antes. Preliminarmente, dá para dizer que, diante do ocorrido com as famílias, uma indenização justa seria de pelo menos R$ 500 mil por família”, disse. / COLABOROU JOSÉ MARIA TOMAZELA

Sismógrafos registraram abalos antes de acidente

Menos de duas horas antes do rompimento da barragem da empresa Samarco, em Mariana, foram registrados quatro tremores de terra a menos de 100 quilômetros de distância da cidade. Especialistas em sismologia avaliam que os abalos sísmicos podem ter relação com o rompimento, embora obras de engenharia nesse nível devam ser capazes de suportar tremores com magnitude superior, de até 5 graus.

De acordo com o Centro de Sismologia da Universidade de São Paulo (USP), os abalos aconteceram antes do rompimento das barragens: às 14h12, 14h13, 15h56 e 15h59. Eles tiveram intensidade considerada pequena, segundo os especialistas, com magnitude de 2 a 2,6 graus. Os dois primeiros foram os mais fortes. O rompimento aconteceu por volta das 16 horas.

“Apesar de fracos, não podemos descartar a possibilidade de ter sido a causa do acidente. Já que há outros fatores, como o solo e a construção, que podem influenciar nos reflexos dos tremores”, disse Marcelo Assumpção, professor do centro

George San França, professor do Observatório de Sismologia da Universidade de Brasília (UnB), afirma que foram registrados outros sete abalos na região, com distância superior a 100 quilômetros. “Eles podem se somar a outros problemas, mas os abalos não foram decisivos”, ressaltou.

Segundo Ciro Humes, professor do Centro Universitário FEI e membro do Comitê Brasileiro de Barragens, tremores causados por abalos sísmicos e detonações podem causar o rompimento da barragem porque “liquefazem” a lama composta por água e rejeitos na base da estrutura. “É uma lama fina e saturada. Se houver uma vibração causada por sismo ou detonação, surge uma pressão e ela liquefaz, vira líquido. Se ela (a barragem) estiver apoiada na lama, fica comprometida.”