O globo, n. 30077, 12/12/2015. País, p. 7

PF intima Lula a depor sobre venda de medidas provisórias

 
JAILTON DE CARVALHO

Ex-presidente diz que caso investigado ocorreu após o seu governo.

PF e Ministério Público Federal também investigam relações de um dos filhos de Lula com empresa de lobby acusada de comprar trechos de MPs

A PF intimou o ex-presidente Lula a depor em inquérito que investiga a suposta venda de medida provisória a montadoras. Lula alegou que a MP foi editada no governo Dilma. Na mesma Operação Zelotes, Luis Claudio, filho de Lula, e o ex-ministro Gilberto Carvalho tiveram o sigilo fiscal e bancário quebrado. A Polícia Federal intimou o expresidente Luiz Inácio Lula da Silva a prestar depoimento em um dos inquéritos abertos na Operação Zelotes para investigar venda de trechos de medidas provisórias para algumas montadoras, entre elas a Caoa, representante da Hyundai, e a MMC Automotores, fábrica da Mitsubishi no Brasil. O depoimento está previsto para o próximo dia 17, em Brasília.

O ex- presidente está na Espanha, mas nota divulgada pelo Instituto Lula diz que, “mesmo sem ter sido notificado oficialmente para depor”, ele estará à disposição das autoridades. “O expresidente Lula não tem qualquer relação com os fatos investigados. A Medida Provisória em questão foi editada e aprovada pelo Congresso em 2013, quando ele não era mais presidente da República”, afirma a nota.

A PF e o Ministério Público Federal também investigam as relações entre Luis Claudio Lula da Silva, um dos filhos de Lula, e a Marcondes & Mautoni, empresa de lobby acusada de comprar trechos de medidas provisórias favoráveis à Caoa e à MMC. A Marcondes & Mautoni recebeu mais de R$ 32 milhões das duas montadoras no período em que estariam em curso tratativas para a alteração de três medidas provisórias de concessão de benefícios fiscais para montadoras. As MPs foram editadas em 2009, 2011 e 2013.

Em 2014, a Marcondes & Mautoni fez depósitos da ordem de R$ 2,5 milhões para a LFT Marketing Esportivo, uma das empresas de Luis Cláudio a título de pagamento por serviços de consultoria em marketing esportivo. A partir das investigações, o juiz Vallisney Oliveira, da 10ª Vara Federal, determinou a quebra do sigilo bancário e fiscal da empresa. A polícia afirma que a empresa de Luis Cláudio não tem estrutura para fazer estudo de grande envergadura. O ex-secretário-geral da Presidência Gilberto Carvalho também teve o sigilo bancário e fiscal quebrado pela Justiça Federal.

A polícia sustenta ainda que trechos da consultoria apresentada por Luis Cláudio como prova de prestação de serviços foram extraídos da internet. O advogado Cristiano Zanin Martins afirmou que vai recorrer contra a decisão de Vallisney Oliveira autorizar a quebra do sigilo bancário e fiscal da LFT Marketing Esportivo e outras empresas de Luis Cláudio. Segundo o advogado, o caso foi investigado num inquérito já encerrado e não poderia ser objeto de nova investigação.

“Assim que tivermos acesso à decisão, vamos impugná-la porque não há situação concreta a justificar a quebra dos sigilos bancários e fiscal. Ilações de autoridades não autorizam medidas invasivas, como já decidiu no caso concreto a desembargadora Neusa Alves, do TRF1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região)”, afirma o advogado em resposta por escrito enviada ao jornal. Ele argumenta ainda que “os dados bancários e fiscal de Luis Cláudio já foram apreciados pelas autoridades no âmbito do Inquérito 1.424/2015 e não foi imputada a ele a prática de nenhum ato ilegal”.

Martins sustenta ainda que “ser contratado por uma empresa cujos donos estão sendo acusados da prática de atos ilícitos não torna ilegal e muito menos criminosa a contratação; não há qualquer ato ou conduta atribuída a Luis Cláudio que possa configurar crime — ele não é referido em nenhum bilhete, gravação telefônica, anotação ou qualquer outro documento”.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, já declarou que não há nada que desabone a conduta do ex-presidente:

— Lula nunca praticou ilícito e, tenho certeza, não permitiria que ninguém em seu entorno praticasse.

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Delcídio não fará delação, diz advogado

 

Prioridade da defesa é conseguir habeas corpus para que senador seja solto.

O advogado Antonio Figueiredo Basto afirmou ontem que o senador Delcídio Amaral (PT-MS) não vai fazer acordo de delação premiada e que a prioridade da defesa é conseguir um habeas corpus no Supremo Tribunal Federal ( STF) para que ele responda em liberdade.

Delcídio está preso desde o dia 25 de novembro e é acusado de tentar atrapalhar as investigações da Operação Lava-Jato. Basto foi o responsável pelo acordo de delação premiada do doleiro Alberto Youssef e outros seis acusados. No começo da semana, ao ser contratado por Delcídio, Basto havia dito que a delação era uma das saídas analisadas pela defesa.

— Não existe essa possibilidade (fazer a delação) — disse Basto.

MESADA PARA CERVERÓ

A prisão do senador foi autorizada pelo ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, com base em gravações entregues à Procuradoria- Geral da República por Bernardo Cerveró, filho do exdiretor da área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró. O senador é suspeito de oferecer uma mesada de R$ 50 mil por mês à família de Cerveró para que ele não fosse citado na delação premiada do executivo. Na gravação, feita com a presença do advogado Edson Ribeiro, também preso na Lava-Jato, são feitos comentários sobre um plano de fuga de Cerveró, caso conseguisse habeas corpus no Supremo Tribunal Federal. Ao jornal “Valor”, Basto afirmou que as provas são ilícitas.

NÚCLEO POLÍTICO

A possibilidade de Delcídio firmar acordo de delação na Lava-Jato preocupa outros envolvido na investigação. Na quarta-feira, durante evento do Dia Internacional de Combate à Corrupção, em Curitiba, o procurador da República Diogo Castor de Mattos disse que uma possível delação do senador levaria as investigações ao núcleo político da Lava-Jato. O procurador acredita que uma eventual colaboração por parte do senador petista envolverá novos políticos.

Delcídio foi diretor da Petrobras, e Cerveró foi um de seus apadrinhados na empresa. Segundo o delator Fernando Soares, o Fernando Baiano, o senador recebeu US$ 1,5 milhão de dólares de propina pela compra da refinaria de Pasadena, no Texas, pela Petrobras. O negócio resultou em prejuízo de mais de US$ 700 milhões para a estatal.