O globo, n. 30041, 06/11/2015. País, p. 9

Aposentadoria: nova regra vai aumentar gastos

 
GERALDA DOCA

Trabalhadores terão mais acesso a benefício integral, mas despesas da União vão subir, alertam especialistas.

Dilma sanciona lei que cria novas regras para a aposentadoria e veta desaposentação -BRASÍLIA- Bastou a lei que cria novas regras para a aposentadoria ser sancionada ontem pela presidente Dilma Rousseff para que especialistas passassem a defender a necessidade, ainda mais urgente, de uma nova reforma da Previdência. A nova legislação vai permitir aos trabalhadores se aposentarem em condições mais vantajosas (com salário integral), mas aumenta as despesas da União com a Previdência, que tem déficit de R$ 125 bilhões projetado para 2016. Segundo especialistas, o sistema caminha para se tornar insustentável no longo prazo, diante das mudanças demográficas (envelhecimento da população e queda na taxa de natalidade).

A partir da sanção da presidente, entrou em vigor a fórmula 85/95 (somando idade e tempo de contribuição de mulheres e homens, respectivamente), que é uma alternativa para o aposentado evitar ser atingido pelo fator previdenciário — que reduz em média entre 30% a 40% o valor do benefício para quem se aposenta mais cedo. A fórmula 85/95 vale até dezembro de 2018. A partir desta data, a fórmula vai progredindo um ponto a cada dois anos, até 2026.

O economista Fabio Giambiagi, especialista no assunto, lembra que nos próximos 15 anos o número de pessoas em idade de trabalhar terá um incremento de 0,4% ao ano, enquanto o universo de idosos com mais de 60 anos vai subir 3,7% ao ano. Na visão dele, só isso já cria um desafio enorme ao governo:

— O que a nova regra vai fazer será adicionar lenha na fogueira, fazendo com que as pessoas que se aposentem ganhem mais. É um ato que conspira contra o futuro, por decisão compartilhada entre Executivo e Legislativo. Tornará mais difícil o quadro fiscal.

Embora essa progressividade seja melhor do ponto de vista das contas públicas do que o fim do fator e sua substituição pela fórmula 85/95 fixa, que chegou a ser aprovada no Congresso e foi vetada por Dilma, especialistas alertam para a trajetória crescente das despesas a médio e longo prazo. Pela regra do fator, uma mulher com 52 anos de idade e 30 anos de contribuição teria ao se aposentar hoje uma redução de quase 40% no salário. Com a mudança, se permanecer na ativa por mais um ano e meio, o benefício será integral. E essa despesa adicional terá que ser carregada pela União por cerca de 30 anos (expectativa de vida).

No curto prazo, as receitas da União podem aumentar caso as pessoas decidam postergar o pedido de aposentadoria para receber o valor integral. Mas, a médio e longo prazos, os ganhos serão rapidamente eliminados pela trajetória crescente das despesas, disse o pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Rogério Nagamine.

— Essa alternativa vai custar caro porque aumenta muito as despesas com o regime de aposentadoria — afirmou Nagamine.

Instituído em 1999, o fator gerou para a Previdência uma economia de R$ 74,9 bilhões entre 2000 e 2014, segundo o Ministério da Previdência. Só no ano passado, o ganho foi de R$ 14,2 bilhões.

Ao sancionar a lei, Dilma vetou a desaposentação, que permitia aos trabalhadores que se aposentaram e decidiram continuar na ativa pedirem a correção do valor do benefício, com base no tempo adicional de contribuição e salário.

No governo, especialmente na área econômica, há consenso de que a reforma é crucial para sinalizar aos investidores compromisso com o equilíbrio das contas públicas. Mas, especialistas não acreditam que o Executivo vá enviar uma proposta de mudança ao Congresso, diante da falta de apoio politico. Foi criado um Fórum, com representantes das centrais sindicais para discutir o tema, mas ainda não houve avanços significativos.

O Brasil é um dos poucos países do mundo que não exige idade mínima para as aposentadorias por tempo de contribuição. A idade de 65 anos (homem) e 60 (mulher) é aplicada somente para a concessão de aposentadoria por idade. Neste casos, é preciso ter contribuído para a Previdência por pelo menos 15 anos.