Correio: Desemprego e carestia aumentam. Renda cai

SIMONE KAFRUNI, RODOLFO COSTA, ALESSANDRA AZEVEDO

Uma combinação perversa de fatores está corroendo, dia a dia, o poder de compra do brasileiro. Inflação e desemprego aceleraram e a renda continuou em queda — o pior dos mundos para qualquer trabalhador. O contingente de desocupados aumentou 67,5% em outubro no acumulado em 12 meses, período em que 771 mil pessoas perderam o emprego. Os salários daqueles que conseguiram permanecer no mercado de trabalho encolheram 7% em um ano, pressionados por um custo de vida 10,28% maior, de acordo com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15) calculado no período de 12 meses até novembro.

Os dados foram divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mas não devem ter chegado aos ouvidos do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que estava ontem em Nova York, onde comentou, otimista, que a inflação começou a ceder — o que não é verdade, como mostram os números do instituto. Neste mês, o IPCA-15 atingiu 0,85%, o índice mais elevado desde 2010. O indicador mede as variações de preços entre os dias 15 de cada mês. De janeiro a novembro, a carestia já está em 9,42%, e nada indica que vai arrefecer, apontam especialistas.

Alimentos

Para o analista da Tendências Consultoria Márcio Milan, os dados foram suficientes para promover uma revisão na inflação anual de 2015. “Pela primeira vez, nossa estimativa passou para dois dígitos, de 10,3% neste ano”, destacou. Milan ressaltou que o avanço dos preços do grupo alimentos, de 1,05% em novembro, surpreendeu, e é exatamente o que mais compromete o orçamento das famílias. “A gente esperava um IPCA-15 de 0,65% e ele veio bem acima disso, sobretudo por conta da alta em produtos in natura, como o tomate, que subiu 15,23%, carnes e açúcar”, disse.

Quem vai ao supermercado se assusta. Até o fim do ano passado, R$ 700 eram suficientes para a bancária Viviane Lessa, 39 anos, encher o carrinho com as compras do mês. “Gasto o mesmo valor, hoje, mas levo metade dos produtos. Precisei abrir mão de consumir alimentos de que gosto para o principal caber no orçamento”, observou. “Olha o açúcar, por exemplo. Antes, estava em R$ 6, agora está o dobro”, surpreendeu-se a bancária. Ao observar a mesma prateleira, a comerciante Marli Vieira, 44, também não conseguiu conter a decepção. “Achei um absurdo e fui procurar em outros mercados. Mas está caro em todos”, lamentou. De acordo com o IPCA-15, o açúcar cristal aumentou 9,61% e o refinado 7,94%, apenas em novembro.

Recessão

Como se não bastasse pagar mais por tudo, os brasileiros ainda estão perdendo o emprego e ganhando menos. Em outubro, a desocupação ficou em 7,9%, a mais alta desde agosto de 2009 — quando o índice ficou em 8,1% —, segundo a Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE. Para o mês, foi a maior taxa em oito anos. De setembro para outubro, 60 mil pessoas encorparam o grupo de desocupados, que ficou em 1,9 milhão, uma alta de 3,2%.

Enquanto isso, a quantidade de pessoas empregadas caiu. No mês passado, eram 22,4 milhões de pessoas. Em relação a setembro, houve recuo de 230 mil, queda 1%. Na comparação com o mesmo período de 2014, foram 825 mil desligamentos, uma contração de 3,5%. Com os dois movimentos, que tendem a se intensificar, será inevitável que a desocupação continue avançando, avaliou o professor de economia Carlos Alberto Ramos, da Universidade de Brasília (UnB).

“As demissões estão aumentando e não há vagas para todos. O empresário não vai manter o mesmo quadro de pessoal com um país em recessão e, naturalmente, faltarão oportunidades”, avaliou. Além disso, sem trégua da inflação, muita gente que estava fora do mercado passará a procurar emprego para manter a renda familiar, o que também vai contribuir para pressionar a taxa de desocupação.

Como não querem arcar com despesas adicionais, os empresários estão fazendo o possível para reduzir custos com pessoal. Os trabalhadores ainda empregados estão tendo as horas extras reduzidas ou até eliminadas, sendo dispensados mais cedo do trabalho. Como faltam vagas, quem está voltando ao mercado são admitidos com um salário menor e os reajustes concedidos não cobrem a inflação. Tudo isso contribui para a redução do rendimento médio real dos trabalhadores, que ficou em R$ 2.182,10 em outubro. Em comparação a setembro, houve recuo de 0,6%; frente ao mesmo período do ano passado, o tombo foi de 7%.

Correio braziliense, n. 19170, 20/11/2015. Economia, p. 8