O globo, n. 30052, 17/11/2015. País, p. 7

OAB recorre contra lei de direito de resposta

 
EDUARDO BRESCIANI 

Ordem questiona no STF artigo segundo o qual só órgão colegiado pode rever decisão de juiz de 1 ª instância.

“Não se pode fazer do direito de resposta uma oportunidade de impedir o trabalho da imprensa”
Marcus Vinicius Coêlho
Presidente da OAB

A OAB recorreu ao STF contra ponto da nova lei de direito de resposta por considerar que cerceia a liberdade de informação. - BRASÍLIA- A Ordem dos Advogados do Brasil ( OAB) protocolou ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal ( STF) para derrubar o trecho da nova lei de direito de resposta que exige decisão colegiada para suspender direito concedido por juiz de primeira instância. O presidente da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, disse que é preciso se evitar abuso na concessão do direito de resposta.

A nova legislação, em vigor desde a semana passada, prevê que a pessoa que se considere ofendida por uma publicação procure o veículo de comunicação em até 60 dias. Após a notificação formal, o veículo terá sete dias para publicar a resposta de forma proporcional à reportagem questionada. Caso isso não ocorra, a pessoa poderá recorrer ao Judiciário onde um juiz de primeira instância decidirá se deve ser concedida a medida.

RECURSO SÓ A COLEGIADO O único recurso possível contra a decisão de primeira instância, com pedido de efeito suspensivo, só pode ser apresentado ao colegiado de um tribunal ( decisão tomada por mais de um magistrado). Caso não ocorra a suspensão, a resposta deve ser publicada em até dez dias após a decisão. Para a OAB, esse rito contraria o funcionamento do Judiciário.

— Para que tenha celeridade e efetividade na prestação jurisdicional, o desembargador poderia sustar o direito de resposta, até melhor exame do caso. Com o artigo 10 da lei, isso não será possível, porque só o colegiado poderá fazê- lo. Na prática, isso tornará inepta a decisão do colegiado, porque se manifestará depois do direito de resposta já publicado. Assim, um desembargador vai valer menos que um juiz, um ministro, menos que um desembargador — afirmou o presidente da OAB.

Marcus Vinicius frisou que é preciso criar uma jurisprudência para que o direito seja concedido só quando constar na reportagem a questionada calúnia, injúria ou ofensa diretas à honra. Ressaltou que é preciso verificar se não foi oferecido antes espaço adequado para que se procedesse a resposta:

— É preciso assegurar direito de resposta quando o veículo não possibilitar a resposta. Não se pode fazer do direito de resposta uma oportunidade de impedir o trabalho da imprensa. Ele não pode ser usado abusivamente ou como estratégia para impedir o trabalho da imprensa livre. Cumprirá aos tribunais criar jurisprudência que não leve a abusos. Esperamos que haja uma jurisprudência que não permita o abuso no uso do direito de resposta. — afirmou.

Marcus Vinicius admitiu que o fato de a lei ter “cláusulas abertas”, sem definição clara do que será considerado ofensivo, pode levar ao cerceamento da liberdade de imprensa. Afirmou que caberá ao Judiciário evitar isso. E disse que a Constituição garante a liberdade de expressão e de opinião, o que deve balizar as decisões:

— Esse perigo existe, de que uma lei de cláusula aberta gere dificuldades ao trabalho da imprensa, e cumpre ao Poder Judiciário cumprir a Constituição e não construir jurisprudência que vá nessa direção.

PRAZOS CURTOS O presidente da OAB afirmou que os prazos curtos para a defesa dos veículos de comunicação, de no máximo três dias, poderiam ser mais amplos. A legislação permite que o juiz decida, antes mesmo de receber a contestação do veículo. Marcus Vinicius frisou, porém, que a entidade não vê inconstitucionalidade nos prazos e disse que na legislação eleitoral há prazos semelhantes:

— O prazo é realmente pequeno e poderia não ter sido fixado. Mas há outros prazos pequenos, como no Direito Eleitoral. Não são exatamente inconstitucionais, mas isso torna o artigo 10 ainda mais importante. Como o juiz pode fixar o direito de resposta até antes da defesa, o órgão não poder obter uma liminar do desembargador. É um problema ainda maior.

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SENADOR AMEAÇA USAR LEI AO SER PROCURADO

 

Citado como beneficiário de US$ 1,5 milhão em propinas na compra da refinaria de Pasadena pelo lobista Fernando Soares, o Fernando Baiano, na 20 ª Fase da Operação Lava- Jato, o senador Delcídio do Amaral ( PT- MS) ameaçou usar a nova lei de direito de resposta para não responder a perguntas do GLOBO. Procurado ontem para comentar a acusação, ele disse que preferia se “valer das prerrogativas” a que tem direito pela lei, compatível com “a dimensão do dano que lhe for causado” pela eventual veiculação das informações, que considerou improcedentes.

“O senador Delcídio do Amaral, considerando a improcedência da informação, prefere se valer das prerrogativas a que tem direito pela Lei 13.188, que trata do ‘ direito de resposta’, compatível com a dimensão do dano que lhe for causado pela sua eventual veiculação, como preconiza a lei”, afirmou a nota enviada pela sua assessoria de imprensa.

Delcídio não é o primeiro a usar a lei para deixar de responder a acusações. Na semana passada, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), também informou que vai se valer da nova lei para questionar reportagem do GLOBO que revelou a existência de uma procuração que o autorizava a operar uma das contas na Suíça.

O GLOBO mostrou que uma procuração da conta Orion SP, um dos trusts ligados a Cunha, dava a ele amplos poderes para fazer aplicações financeiras em fundos e no mercado futuro, investimentos de curto prazo, compra e venda de títulos, moedas e até de metais preciosos. O presidente da Câmara só não podia realizar saques. A informação contraria a tese de defesa de Cunha, que afirmara que não tinha acesso à conta, que pertenceria a um trust, e não a ele.