O globo, n. 30049, 14/11/2015. País, p. 4

Um sonho agora mais difícil

 
DANDARA TINOCO E WASHINGTON LUIZ

Rompimento de barragens atinge área de instituto que pretende recuperar 400 mil nascentes do Rio Doce. Fundador, Sebastião Salgado encontrou-se com Dilma.

Ao encontrar ontem a presidente Dilma Rousseff em Brasília para discutir a recuperação do Rio Doce, Sebastião Salgado dividiu anseios de uma vida. A história das terras que cercam aquelas águas coincide com a sua própria existência, já disse o fotógrafo que, ao lado da mulher, Lélia Deluiz Wanick, criou o Instituto Terra, responsável por plantar mais de dois milhões de árvores e recuperar mil nascentes desde 1998, em Aimorés, divisa de Minas Gerais com o Espírito Santo. Na década e meia, toda uma cadeia alimentar voltou a refugiar-se na região. De insetos a jaguatiricas. Rejeitos de minério lançados pelo rompimento das barragens em Mariana (MG) devem estar nesse ponto do rio na madrugada de hoje, segundo previsão do Serviço Geológico do Brasil.

Durante a conversa com a presidente, o fotógrafo apresentou detalhes do projeto Olhos D´Água, no qual o instituto tem concentrado esforços. O sonho do casal e de funcionários que passaram a dividir seus anseios é fazer ainda mais do que já parecia impossível, expandindo para todo o vale do Rio Doce o projeto de Aimorés, e cercando seus 375 mil olhos-d´água em 853 quilômetros. É um plano para três décadas, calculam.

Com o rompimento das barragens, técnicos do instituto, de imediato, se debruçaram sobre um plano para recuperar o rio. A proposta, detalha nota divulgada, propõe a criação de um Fundo com recursos das empresas responsáveis pelo desastre. O dinheiro seria usado para recuperar nascentes e condições ecológicas. “Já sabíamos que restabelecer a vida do Rio Doce seria um processo difícil e de longo prazo. Agora, exigirá mais empenho e urgência nas ações, bem como uma aprendizagem ambiental compartilhada com a sociedade” , informou a nota do instituto. Controladora da Samarco, a companhia Vale patrocina o projeto de Salgado.

É na Fazenda Bulcão, de propriedade da família de Salgado, que o fotógrafo busca pouso em meio a jornadas mundo afora. Num desses momentos, surgiu a ideia de fazer nascer de novo a floresta em terras degradas. O verde das árvores que hoje tomam conta do terreno brotou antes na imaginação de Salgado e Leila. “Vamos plantar uma floresta”, foi a sua proposta ao divisar as terras secas do passado. A área de sete mil hectares tornou- se uma Reserva Particular do Patrimônio Natural.

Ontem Dilma demonstrou interesse em ampliar o trabalho e encaminhou o projeto para ser analisado pelo Ministério do Meio Ambiente. Na próxima semana, o fotógrafo deve se reunir com a ministra da pasta, Izabella Teixeira.

— Acho fundamental, a gente ser capaz de recuperar o Rio Doce. Fazer, com essa ação, que a gente consiga transformar um momento de dificuldade, de crise hídrica, em uma forma de recuperar o rio — disse Dilma.