O globo, n. 30049, 14/11/2015. País, p. 7

Propina vira ouro na Suíça

 
RENATO ONOFRE

Ex-diretor da Petrobras acertou com gerente de sua conta compra de US$ 200 mil em metal.

Adiversificação dos negócios entre os personagens do esquema de corrupção investigado pela Operação Lava-Jato é uma das marcas do grupo. Pelo que já se sabe, os envolvidos investiam a propina desviada em obras de arte, carros luxuosos e resort no Nordeste. O ex-diretor da área Internacional da Petrobras Jorge Zelada, descobriu-se, transformou parte da propina que recebeu na Suíça em ouro.

A Polícia Federal rastreou uma troca de e- mails em que Zelada orienta a ex-gerente do banco suíço Jacob Safra Denise Kos a diversificar os investimentos no exterior.

Em mensagem enviada a Zelada no dia 3 de janeiro de 2012, Kos sugere: “Tudo bem? Chego antes do que previsto. Dia 16 estarei na terra. Quer comprar um pouco de Gold (ouro)”. O ex-diretor responde: “Boa viagem, vou estar por aqui. Gold ok. Quanto, 200k?”.

Os documentos foram anexados ao inquérito que investiga o pagamento de propinas relativas a contratos de exploração do Campo de Mexilhão, na Bacia de Santos, a maior reserva da gás natural do Brasil. Há indícios da participação de empresas norueguesas no esquema de corrupção.

Zelada se mostra preocupado por ter muito dinheiro nas contas suíças e discute outras formas de investimento. Kos pergunta se ele quer aplicar em um fundo de investimento. Zelada responde: “Sim, vejo que minha posição está muito cash. Isso eh bom ou ruim nesse período de incerteza? Não eh tão ruim ficar líquido, mas com oportunidade compraria. Que tal 300k (US$ 300 mil) de vale (ações da Vale)?”

O executivo foi preso em julho durante a 15ª fase da LavaJato. Zelada é acusado de corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-diretor nega participação no esquema que desviou cerca de R$ 7 bilhões da Petrobras.

Em setembro, O GLOBO revelou uma troca de mensagens entre Zelada e a ex-gerente do banco suíço. Os dois chamavam a propina depositada de “confetes”. No dia 21 de novembro de 2011, Kos encaminhou um e-mail a Zelada intitulado “Carnaval”. No corpo da mensagem, a expressão “com confetes novos.........1026000”. De acordo com inquérito da PF entregue à Justiça na terça-feira, a mensagem era o acordo que a propina teria entrado na conta de uma das offshores controladas pelo ex-diretor da Petrobras, a Vabre International S.A.

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Dinheiro para Duque não cabia nos envelopes

 
TIAGO DANTAS

Segundo Barusco, pacotes só comportavam R$ 60 mil, e valor era maior.

Parte da propina do esquema de corrupção da Petrobras circulava dentro da estatal em envelopes pardos. O exgerente de Serviços da Petrobras Pedro Barusco afirmou na quarta-feira à Justiça Federal que entre o fim de 2004 e o início de 2005 começou a entregar os pacotes semanalmente para seu chefe, o ex-diretor da área Renato Duque. O sistema, porém, tinha um problema: em cada envelope cabiam R$ 60 mil, e os repasses irregulares feitos pelas empreiteiras eram muito maiores que isso. Barusco afirma que teve, então, que transferir de uma só vez US$ 12 milhões a Duque no fim de 2012 para quitar os débitos.

O ex-gerente da Petrobras foi interrogado como réu no processo relativo à empreiteira Andrade Gutierrez. Delator, Barusco foi denunciado em outras quatro ações penais — em uma delas foi condenado a 20 anos e oito meses de prisão pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Ele contou ao juiz Sérgio Moro que recebia propina da Andrade em contas que mantinha no exterior e a repassava para Duque. No início, enquanto o ex-diretor não abrira contas para movimentar o dinheiro, os repasses eram feitos em espécie:

— No final de 2004, início de 2005, comecei a passar para ele (Duque) volumes em dinheiro. Normalmente R$ 60 mil reais. Eu sei porque passava em envelope pardo. E a forma de ajustar dinheiro em envelope pardo era R$ 60 mil reais. Começou com 15 dias, depois passou para semanal — afirmou o delator.

CONTAS PARA RECEBER REPASSE

Barusco relatou que o modelo causou um “desequilíbrio”, pois Duque tinha “direito a volume grande” de propina, mas ele conseguia dar “vazão de forma pequena”. Com o tempo, afirmou Barusco, seu chefe abriu contas para que os repasses pudessem ser maiores. No fim de 2012, segundo o relato dele, ainda havia um débito grande:

— No final de 2012 tive grande acerto com ele (Duque), em cima de tudo que a gente tinha ( recebido) da Keppel ( Fels, empresa estrangeira que está sendo investigada sob a suspeita de ter pagado propina para a construção de uma plataforma da Petrobras), tinha uns US$ 14 milhões para receber. E, nesse acerto, foram US$ 12 milhões pra ele e ficaram US$ 2 milhões pra mim. Essa diferença foi para cobrir o que eu devia a ele.

Barusco voltou a falar sobre a divisão da propina entre as diretorias da Petrobras e partidos que davam suporte políticos aos diretores.