O globo, n. 30049, 14/11/2015. País, p. 8

Estudantes vão às ruas contra Cunha e o impeachment de Dilma

 
ANDRÉ DE SOUZA E JÉSSICA OURA

Na manifestação, grupos criticaram a presidente, o ajuste e até Levy.

Cerca de 4 mil pessoas, a maioria ligada à União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), participaram ontem de uma manifestação na Esplanada dos Ministérios. O principal item do protesto era a saída de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Câmara dos Deputados. Mas entre os manifestantes, a pauta era variada e muitos estavam mais preocupados com a melhoria da Educação do que com Cunha.

Os manifestantes passaram em frente ao Congresso Nacional, onde estão acampados defensores do impeachment da presidente Dilma Rousseff e também da intervenção militar para tirá-la do poder. O encontro entre os grupos gerou um clima de tensão pela possibilidade de um embate. Assim, o efetivo da Polícia Militar (PM) e da Polícia Legislativa foram reforçados. Alguns manifestantes trocaram provocações.

Ao chegar ao Congresso por volta das 13h, um cordão policial impediu os estudantes de ocuparem rampa. O grupo deu a volta continuando a passeata em outra direção. No carro de som, a presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Carina Vitral, provocou os defensores do impeachment.

— Não embarcamos na manifestação do MBL, do revoltados online, e de meia dúzia de playboys que dizem representar o povo brasileiro — declarou Carina.

O momento mais tenso ocorreu quando manifestantes ligados à Juventude Socialista Brasileira ( JSB), do PSB, passaram pelos defensores da intervenção militar. Eles estavam na parte final da passeata e houve provocações e faixas arrancadas, mas não ocorreram agressões físicas. Integrantes de um grupo que defende intervenção militar estavam armados com pedaços de pau, cassetetes e spray de pimenta. Não houve intervenção da Polícia Militar.

— Quando a gente chegou próximo do acampamento, começaram a provocar. A gente arrancou algumas faixas deles, e eles algumas nossas — relatou o secretário nacional de Juventude do PSB, Tony Siqueira.

REDUÇÃO DA MAIORIDADE EM PAUTA

Mais cedo, quando cerca de 100 manifestantes da JSB ainda estavam concentrados no Museu da República, o grupo já deixava claro que não faria uma defesa do governo no protesto. Além de gritar palavras de ordem contra Eduardo Cunha, eles carregavam faixas contra a redução da maioridade penal e o ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

— A gente, pelo menos da JSB, entende que o impeachment é um dispositivo legal — disse Tony Siqueira, concluindo: — Nossa pauta é contra o ajuste fiscal e fora Cunha.

A Ubes está reunida em Brasília nesta semana em razão de um congresso da entidade. Eles dizem que a passeata também era contra o impeachment de Dilma e o corte de verbas na Educação, e a favor da Petrobras. No protesto também havia movimentos sociais simpáticos ao governo, como a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

— É um ato em defesa da Petrobras, em defesa da democracia, por mudanças na política econômica. Também somos contra o impeachment de Dilma. É forçação de barra de quem perdeu a eleição. Diferentemente do presidente da Câmara, que tem denúncia da PGR e contas na Suíça — afirmou o presidente da CUT, Vagner Freitas, que também participou da manifestação.

Embora o protesto fosse contra Cunha, havia manifestante que pouco sabia sobre ele. Militante do MST, Irene Barbosa acreditava que o presidente da Câmara fosse ministro de Minas e Energia, mas disse ter ido por outros motivos:

— Um dos motivos é a Petrobras. A barragem em Minas, para as autoridades tomarem providências. E sobre os direitos de todos os trabalhadores.

O secretário- geral da UNE, Thiago Ferreira, criticou o presidente da Câmara e também a aprovação de medidas pela Casa como a aprovação da redução da maioridade penal.

— É quase natural que tenhamos aderido ao Fora Cunha, que representa hoje esse conjunto de projetos retrógrados que atingem diretamente os estudantes. Já tivemos o protesto com dólares jogados nele na semana passada como forma de mobilização — disse Thiago.

Segundo balanço da PM, a única ocorrência registrada foi a de um homem ligado ao Movimento Intervencionista que estava acampado no gramado. Ele foi preso apontando uma arma de fogo para algumas pessoas. “A manifestação teve de um modo geral caráter pacífico. Foi organizada pela UBES mas teve a participação também de pessoas ligadas ao MST e ao Movimento Passe livre. Estes últimos entraram em discussão com as pessoas do Movimento Intervencionista quando passaram por eles na marcha até o Congresso Nacional, momento em que o cidadão sacou uma arma de fogo", diz a nota da PM. O homem foi identificado como policial civil do estado do Maranhão e foi encaminhado para a Corregedoria da Polícia Civil.

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Manifestante é preso com armas perto do Congresso

 
ISABEL BRAGA, JAILTON CAR DE LETÍCIA E FERNANDES VALHO

Policial estava em acampamento de grupo que defende intervenção militar.

A Polícia Militar do Distrito Federal prendeu na noite de anteontem um dos militantes que protestam contra a presidente Dilma Rousseff, próximo ao Congresso, por porte ilegal de armas. Com Jorge Luiz Damasceno Vidal, policial militar reformado, policiais civis encontraram uma pistola 380 Taurus, 12 sprays de mostarda, 16 furadores de coco, 1 porrete e 1 soco inglês. Vidal estava no acampamento com o grupo que defende intervenção militar e popular. Na manhã de ontem, a PM faz revista neste acampamento e foram encontradas mais armas brancas.

Interrogado logo depois de ser preso na 5ª DP, Damasceno Vidal não explicou o que pretendia fazer com o arsenal. Segundo o delegado Marco Antonio, ele exerceu o direito de ficar calado e foi transferido para um batalhão militar. Vidal foi autuado por porte ilegal de armas. Segundo a Polícia Civil, o militante não tem licença para portar pistola e sprays. As armas estavam no carro do policial, estacionado perto do acampamento dos militantes pró-impeachment.

O coordenador nacional do Movimento Brasil Livre, Rubens Nunes Filho, afirmou ontem que o manifestante preso com armas não prejudica a imagem do movimento porque não o integra. Segundo Rubens, são manifestantes que pregam a intervenção militar e não o impeachment, como o MBL:

— Não prejudica. Um sujeito desse diapasão não é do movimento. A gente lamenta que esteja nas intermediações do Congresso, com armas e explosivos. Nas manifestações de 12 abril entrei com liminar para deixar esse pessoal da intervenção militar longe, não defendemos isso. Segundo Rubens, o foco do MBL é o impeachment de Dilma, mas eles “não fecham os olhos” para as denúncias contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

“FARPAS PELA INTERNET”

De acordo com manifestantes do movimento pró-intervenção, a apreensão das armas ocorreu por conta de desentendimento entre os diferentes grupos que defendem a saída de Dilma do poder. Integrante do movimento Ocupa Brasília, que defende a intervenção popular para tirar Dilma do cargo, o jornalista e escritor Felipe Porto, de 55 anos, contou que na noite de quinta-feira chegou ao acampamentos, no gramado de cima do Congresso, um manifestante chamado Davi Ben Araham, acompanhado por Damasceno Vidal.

Ben, segundo Porto, já tinha trocado farpas pela internet com um manifestante chamado Tamaio — que também estava acampado na Esplanada. De acordo com Porto, quando Tamaio viu Ben, ele pegou um facão. Nesse momento, Vidal chamou a Polícia Militar. Na confusão, Tamaio disse que Vidal escondia armas e a polícia revistou o carro do policial.

— Tem muita gente querendo se apropriar dos movimentos. Integrantes que são intervencionistas radicais, como Ben, que defende invadir prédios. Teve a briga, mas já estão trocando farpas pela internet faz tempo — contou Porto.

Com base na prisão do manifestante, o líder do PT, Sibá Machado (AC), divulgou nota ontem pedindo que o Ministério da Justiça e a Polícia Federal investiguem a atuação de grupos que se manifestam contra o governo na Esplanada. “Respeitamos a liberdade de expressão e de manifestação, princípios que fundaram o nosso partido e balizam a nossa atuação, mas jamais poderemos nos omitir diante de fatos gravíssimos como o que ocorreu ontem (anteontem) e que podem se repetir na forma de tragédia”.