Título: A medicina, o médico e a representação política
Autor: Almeida, José Carlos de
Fonte: Correio Braziliense, 19/09/2011, Opinião, p. 11

Médico urologista, foi presidente da Sociedade Brasileira de Urologia (gestão 2008-2009)

Há 89 anos, em 7 de setembro de 1922, foi cravada a pedra fundamental da futura capital federal na região de Planaltina, no centro do país, pelo então presidente da República, Epitácio Pessoa. Quando, em 1960, o médico urologista e presidente da República, Juscelino Kubitschek, concretizou o sonho da capital federal no Planalto Central, não foi motivado somente pelo ideal de construir uma cidade com arquitetura arrojada e beleza plástica. O nobre presidente, com seus ideais democráticos, atendeu e respeitou os preceitos constitucionais e desejava uma capital plena, legítima na representação de todos os segmentos sociais, onde as instituições pudessem ter voz e participassem politicamente da vida nacional.

Porém 51 anos depois da inauguração de Brasília, ainda encontramos distorções e lacunas nessa representatividade. Não saberia citar todas as motivações para a resistência dessas instituições, no sentido de estabelecerem um lugar definitivo e legítimo em Brasília. Ao ocuparem um lugar permanente na capital federal, é natural que defendam seus pontos de vista com ações políticas de forma permanente e eficaz, substituindo os lampejos de ações ocasionais em audiências fortuitas. Vale a tônica antiga "Quem não é visto não é lembrado". Assim a política é exercida e, sem pressão, as decisões delongam.

No universo médico e no exercício da medicina, o Brasil tem sido prejudicado. Esse prejuízo social e, também, da classe médica se deve ao formato até então escolhido. A Associação Médica Brasileira (AMB), com sede na cidade de São Paulo, é uma sociedade sem fins lucrativos, fundada em 26 de janeiro de 1951. Tem como missão defender a dignidade profissional do médico e a assistência de qualidade à saúde da população brasileira: possui 27 associações médicas estaduais e 396 associações regionais. Compõem o seu Conselho Científico 53 sociedades médicas, que representam as especialidades reconhecidas no território nacional.

Desde 2006, portanto há cinco anos, as instituições médicas tentam obter a aprovação do Ato Médico no âmbito da Câmara e do Senado. Desde 2003, portanto há oito anos, tenta-se a validação e o reconhecimento, por parte dos planos de saúde, da Classificação Brasileira de Honorários e Procedimentos médicos (CBHPM). Será que essa morosidade, que impõe prejuízos para a sociedade em geral e ao exercício da medicina, é natural e imutável? Caso existisse outra forma de representação política, com a sede da AMB e de todas as 53 especialidades médicas em Brasília, o caminho seria o mesmo?

O sonho de ter a sede da associação médica brasileira definitivamente plantada na capital federal é legítimo e até uma prerrogativa legal estatutária. O estatuto da AMB reza no artigo 100º o seguinte: "A sede da AMB deverá ser transferida para a capital federal". Quando? Como? Por quem? O que vemos é um caminho oposto e sem justificativa. A AMB, em 2006, acabou com seu escritório de representação política em Brasília, transferindo toda estrutura para São Paulo! Quando teremos esse estatuto respeitado? Quando teremos pessoas desprovidas de apego regionalista e determinadas a cumprir esse estatuto, com pensamento nacionalista?

A sede da Associação Médica Brasileira, com as sociedades médicas de especialidade, em Brasília é fundamental e necessária. Assim, a classe médica Brasileira e a própria saúde poderão vislumbrar outro caminho de representação política, podendo também almejar resultados melhores e em menor prazo. Projetos como orçamento para a saúde, carga tributária imposta aos médicos, aquisição de equipamentos médicos com a isenção de impostos, interiorização da medicina, escolas médicas, superpopulação de médicos nos grande centros urbanos, escola e preparação de futuros médicos-políticos na defesa da classe médica, monitoramento da influência dos planos de saúde no Congresso Nacional em detrimento da classe médica, política oncológica nacional e projetos para as doenças mais prevalentes são alguns projetos que merecem a presença diuturna, perante ao poder, por parte das instituições que defendem essas bandeiras. Quebremos o silêncio e ousemos um pouco mais. O Brasil, o médico e a própria medicina agradecem.