O globo, n. 30.061, 26/11/2015. País, p. 30

Dividido, BC mantém taxa básica de juros em 14,25%

Dois diretores votaram a favor de alta de meio ponto percentual

-BRASÍLIA- Com um cenário de deterioração da economia e das contas públicas, o Comitê de Política Monetária (Copom) manteve a taxa básica de juros (Selic) em 14,25% ao ano, sem viés. Essa é a terceira reunião seguida em que a taxa permanece inalterada. A decisão, contudo, não foi unânime. Seis diretores votaram a favor da manutenção da taxa e dois pela elevação em meio ponto percentual, para 14,75%, o que, na visão de analistas, é uma indicação de que num futuro próximo a Selic pode voltar a subir para conter a inflação.

— Faz tempo que a gente não vê uma divergência assim, chama a atenção ela ter ficado tão explícita. Isso aumenta a possibilidade de o BC subir os juros — afirmou o economista da Guide Investimentos Ignácio Crespo Rey.

Os votos pela elevação da taxa vieram dos diretores de Organização do Sistema Financeiro e Controle de Operações do Crédito Rural do Banco Central (BC), Sidnei Corrêa Marques; e de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos, Tony Volpon. O presidente do BC, Alexandre Tombini, votou pela manutenção da Selic no atual patamar juntamente com outros cinco diretores: Aldo Luiz Mendes, Altamir Lopes, Anthero de Moraes Meirelles, Luiz Edson Feltrim e Otávio Ribeiro Damaso. À ESPERA DA POLÍTICA FISCAL Apesar de o comunicado ter afirmado que não há viés na decisão pela manutenção da taxa Selic, o economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, avaliou que a própria divergência acaba sendo uma sinalização de que será necessário aumentar os juros novamente na tentativa de conter a inflação.

— O fato de ter rachado o placar mostra que a diretoria está preocupada com a inflação não convergir (para a meta) no ano que vem. Alguns diretores sentem que têm que sinalizar, deixar claro esses problemas. Isso tende a deixar um espaço para dúvida — afirmou.

As previsões para a inflação têm se deteriorado ao longo das últimas semanas. Os economistas já esperam que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) atinja 10,33% este ano e ultrapasse o teto da meta, de 6,5%, no ano que vem. A previsão do último boletim Focus para a inflação em 2016 é de 6,64%.

Outra indicação de que a Selic pode voltar a subir, na visão dos especialistas, é a retirada, do comunicado divulgado ontem, da sinalização de que a taxa será mantida “por período suficientemente longo”. Essa expressão fora usada no documento de outubro. A manutenção dos juros nesta reunião, no entanto, não surpreendeu o mercado.

Para Rey, uma alta não ocorreu agora porque a autoridade monetária espera “cautelosa” uma reação da política fiscal. Subir os juros poderia resultar em agravamento do quadro fiscal.

— Em um cenário no qual a projeção do crescimento tem piorado e o controle da inflação também, a tendência é de que a Selic fique nesse patamar à espera de uma iniciativa no front fiscal. O BC se mantém à espera do cenário ficar mais claro para uma ação — disse.

CNI: ALTA DA TAXA AGRAVARIA RECESSÃO

Em nota, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) elogiou a manutenção da Selic como “uma decisão acertada”. A indústria considera que “mesmo com a inflação elevada, não há espaço para um novo aumento dos juros”, e que a elevação da taxa “aprofundaria a recessão e agravaria a situação das contas públicas”. A CNI atribui a disparada da inflação às “pressões de custos, puxados pelo reajuste dos preços administrados e do câmbio, além das incertezas sobre a implementação e a eficácia do ajuste fiscal”.

Com a decisão do Copom, o cenário em relação aos juros para 2016 pode se modificar. A previsão do mercado até então era de que a taxa Selic começasse a cair no ano que vem e atingisse, no fim de 2016, 13,75%. Agora, dizem os especialistas, essa perspectiva já deve começar a mudar no próximo boletim Focus, indicando um aumento dos juros.