O globo, n. 30.060, 25/11/2015. País, p. 8

Relator vota para manter processo contra Cunha

Aliados do presidente da Câmara pedem vista e suspendem sessão

Conselho de Ética leu relatório que autoriza processo contra o presidente da Câmara, mas votação ficou para terça. -BRASÍLIA- Depois de manobras adiarem a leitura do texto do relator, o processo que pode levar à cassação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), por quebra de decoro finalmente avançou ontem no Conselho de Ética. A estratégia de adiamento elaborada pela defesa do peemedebista, que consistia em um pedido de afastamento do relator do processo, Fausto Pinato (PRB-SP), fracassou, e o relatório que pede a abertura das investigações foi lido. Após um pedido de vista coletivo, a votação ficou marcada para a próxima terça-feira.

O relator do processo contra Cunha acatou a denúncia porque considerou que, em tese, os fatos imputados contra ele constituem falta de decoro. Após a leitura do relatório, aliados de Cunha pediram vista do processo, como era esperado. O pedido foi feito pelo deputado Sérgio Brito (PSD-BA), e, em seguida, outros o acompanharam. Em seu relatório, Pinato afirma que há indícios suficientes para levar adiante o processo. “Os documentos que acompanham a representação constituem, decerto, suporte indiciário suficiente a permitir o prosseguimento do feito (...). O arquivamento inicial da representação seria extremamente temerário, e passaria a impressão à sociedade brasileira de que este Parlamento não atua com cuidado e espírito público de transparência”.

DEFESA TENTA TIRAR RELATOR No relatório, Pinato destaca que, em ofício, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, confirmou a existência de contas bancárias em nome de Eduardo Cunha e de seus familiares na Suíça, que elas foram bloqueadas, e informou ainda que a investigação que envolve Cunha diz respeito a crimes de lavagem de dinheiro e corrupção. Pinato disse que a afirmação de Cunha, na CPI da Petrobras, de que não teria contas além daquelas declaradas em seu Imposto de Renda deve ser “melhor analisada”.

Logo no início da sessão, a defesa do presidente da Câmara pediu a substituição do relator do processo. O advogado Marcelo Nobre alegou que Pinato antecipou seu parecer antes de ter ouvido a defesa. Nobre citou episódio ocorrido em 2009 que culminou com o afastamento do relator do processo contra o então deputado Edmar Moreira (sem partido-MG), por ter antecipado seu voto sobre a acusação. Na ocasião, o presidente do conselho, que também era José Carlos Araújo, determinou o afastamento de Sergio Moraes (PTB-RS) do caso.

— O que indigna é que o relator não nos aguardou, não teve interesse em se preocupar com os argumentos que a defesa traria. Qual o receio? A defesa está aqui para colaborar — disse Nobre.

Pinato se defendeu do pedido de suspeição e disse que não vai deixar a relatoria. Ele afirmou que, no caso de Edmar Moreira, o relator teria se antecipado ao mérito do processo:

— O relator não está vinculado à defesa prévia para apresentar seu exame de admissibilidade. Depois disso, será aberto todo o prazo de defesa e contraditório. Quando há manifestação de mérito fora dos autos, antecipadamente, em tese, surge hipótese de suspeição. Não reconheço o pedido de afastamento e não me afastarei. Reafirmo minha capacidade de julgar o processo.

O presidente do conselho afirmou que a decisão sobre a suspeição é de “foro íntimo” por parte do relator e que tem “convicção” de que não há motivos para o impedimento, mas disse que irá consultar a área jurídica do colegiado para ter uma posição “prudente” e que dará uma resposta definitiva sobre o caso na próxima sessão do conselho.

O advogado Marcelo Nobre adiantou que, caso Araújo mantenha sua decisão, irá recorrer à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.

O presidente do conselho encerrou a sessão sem que o advogado de Cunha tivesse feito a defesa no caso e sem que os deputados tenham debatido o relatório. Com isso, deputados favoráveis à cassação de Cunha temem que a votação do relatório não ocorra na próxima terça.

— O ritmo está muito lento, o que leva à possibilidade de não se votar a admissibilidade do processo antes do recesso parlamentar, o que seria um desgaste profundo para a Câmara — disse o líder do PSOL, Chico Alencar (RJ).

Indagado se acredita no arquivamento da representação, Cunha afirmou:

— Estou absolutamente tranquilo. A representação é pífia, ela apenas repete os trechos da acusação.