O globo, n. 30.060, 25/11/2015. Rio, p. 11

A saída nos royalties

Estado tentará antecipar recursos do petróleo para conseguir R$ 2,2 bi e fechar suas contas

Depois de dizer que estava atrás de “uma cartola para tirar um coelho”, como forma de dar a dimensão da gravidade da crise financeira que atinge o estado, o governador Luiz Fernando Pezão sinalizou ontem que pode ter encontrado o que procurava. Ele começa a agir para tentar aprovar junto ao governo federal uma operação através do Rioprevidência — fundo de pensão dos servidores —, cartola de onde espera retirar R$ 2,2 bilhões, quase o total necessário para fechar as contas de 2015. Para isso, segundo fontes do governo, Pezão precisa do aval do ministro da Fazenda, Joaquim Levy. A ideia é antecipar, por meio do Banco do Brasil, royalties do petróleo. A manobra é possível graças à lei 7.074, aprovada em outubro deste ano pela Alerj.

Se a operação for aprovada, o estado oferece como garantia os royalties do petróleo que receberá no futuro. O montante seria suficiente para o governo arcar com R$ 1 bilhão da folha de aposentados em dezembro, R$ 900 milhões da segunda parcela do 13º dos servidores e R$ 87 milhões das dívidas com fornecedores. O Rioprevidência é capitalizado com os royalties do petróleo.

No último dia 17, o pagamento de 2.100 fornecedores do estado foi adiado para garantir os salários de aposentados e pensionistas do Rioprevidência no início de dezembro. Pezão se compromete a quitar a dívida com os fornecedores até a próxima segunda-feira, dia 30. Ontem, ele também esclareceu que, ao longo do mês de dezembro, vai acertar contas atrasadas de anos anteriores, estimadas em R$ 400 milhões. Mais uma vez, Pezão disse que atrasou os repasses aos fornecedores — que incluem contratos de insumos e pessoal terceirizado, lotado em unidades de ensino e saúde — para garantir a folha de pagamento:

— Adiei o pagamento de fornecedores para garantir a folha no dia 30 (de novembro). Nos primeiros dias úteis de dezembro, pagarei a servidores e pensionistas. Tenho operações importantes em Brasília para liberar recursos do Rioprevidência.

NEGOCIAÇÃO DEPENDE DE JOAQUIM LEVY Pezão não deu detalhes sobre as negociações envolvendo recursos do fundo de pensão, que já enfrenta sérias dificuldades. Nos bastidores, sabe-se que a negociação precisa ter o apoio de Joaquim Levy para ser feita através do Banco do Brasil ou da Caixa Econômica Federal. O deputado Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB) observa que, no atual momento de severa crise econômica, seria difícil para o estado atrair o interesse de bancos privados no mercado financeiro.

— A saída é buscar os bancos públicos. Seria uma solução para o momento atual, mas o Rioprevidência já atravessa sérias dificuldades, em parte por conta de outras operações semelhantes já realizadas anteriormente — disse o deputado.

Não é a primeira vez que o estado adota essa medida — antecipar os royalties de petróleo — para fazer caixa. A prática chegou a ser alvo de polêmica em setembro, quando o Rioprevidência correu o risco de ter R$ 500 milhões bloqueados de sua conta — dinheiro captado, à época, no mercado internacional. Isso ocorreu porque a previsão de receitas do fundo com os royalties caiu, acompanhando a desvalorização de 50% do petróleo e a redução na produção da Petrobras. Essa mudança no fluxo financeiro implicaria descumprimento do contrato. O problema só foi contornado após um acordo, que envolveu o pagamento de uma multa de R$ 80 milhões por parte do Rioprevidência.

BOLSISTAS DA FAPERJ TEMEM FALTA DE RECURSOS Em busca de solução para o rombo no caixa, Pezão também cogitou, ontem pela manhã, lançar mão de recursos da Faperj, destinados à manutenção de bolsas de mestrado e doutorado em universidades estaduais. O anúncio do governador caiu como uma bomba na comunidade acadêmica. Bolsistas da Faperj disseram temer que a medida anunciada significasse atrasos nos pagamentos no ano que vem e também a suspensão da concessão de novas bolsas.

— Estamos vendo hoje (terça-feira) recursos da Faperj, dentro do orçamento, para ver se dá para pagarmos às empresas que causam mais aflições dentro da Uerj (que suspendeu as aulas) e no Hospital Pedro Ernesto (que restringiu atendimentos). É um problema mais localizado ali. Com outros fornecedores, nós já tínhamos negociado, mas eu estou aberto a receber o presidente do sindicato, conversar com ele e mostrar as dificuldades do estado — disse Pezão.

Para receber o financiamento da Faperj, estudantes precisam se dedicar exclusivamente à pesquisa. Entre alunos de programas de pós-graduação da Uerj que hoje contam com o benefício, o clima é de insegurança e sobram perguntas. Ricardo Nicolay, de 28 anos, contou que, este ano, o pagamento atrasou duas vezes. Em janeiro e junho, em vez de cair na conta no dia 10, só foi transferido nos dias 24 e 19 de cada mês, respectivamente. Morador de Petrópolis, ele depende do valor da bolsa (R$ 2.300) para se manter no Rio, comprar livros e tocar a pesquisa, sobre o fado português.

— Fazemos a nossa parte, assistimos às disciplinas, publicamos, e a contrapartida, além do valor quase irrisório, é a incerteza, Desde o começo do ano, a gente vive assim, e esse anúncio do Pezão só complica a situação — criticou.

No início da noite, a assessoria do governador alegou que Pezão fora mal compreendido. Segundo o estado, o governador, na verdade, quis dizer exatamente o contrário, que seu esforço atualmente está voltado para aumentar os recursos para a Faperj.

O estado também anunciou que o desconto de 8% para o pagamento integral do IPVA no início do ano que vem foi reduzido para 3%.