O globo, n. 30048, 13/11/2015. País, p. 7

Dilma sanciona lei sobre direito de resposta
 

Entidades jornalísticas podem ir à justiça sobre pontos que dificultam defesa dos meios de comunicação

Catarina Alencastro e Juliana Castro

opais@oglobo.com.br

BRASÍLIA A presidente Dilma Rousseff sancionou a lei que regulamenta o direito de resposta de pessoas e empresas que se sentirem ofendidas por alguma reportagem veiculada na imprensa. A resposta ou correção deverá ser publicada gratuita e proporcionalmente ao tamanho da notícia que ofendeu o requerente. Todos os meios de comunicação deverão se enquadrar à lei. Dilma vetou um único artigo, que permitia ao ofendido exercer, em pessoa, o direito de resposta.

Entidades ligadas à imprensa avisaram que questionarão ao menos dois pontos que consideram inconstitucionais: a possibilidade de o juiz decidir pela publicação da resposta, antes mesmo de o veículo apresentar sua defesa, e a dificuldade de se obter em tempo hábil um efeito suspensivo da decisão.

Em nota, a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) informou, porém, que a presidente acertou ao vetar o artigo que previa a representação em pessoa do ofendido, que poderia até gravar um vídeo a ser veiculado, no caso de TVs. Na justificativa do veto, Dilma afirma que, "ao não definir critérios para a participação pessoal do ofendido, o dispositivo poderia desvirtuar o exercício do direito de resposta ou retificação." Pela lei, comentários de leitores e usuários de internet estão excluídos do que pode ser objeto de reparo por parte do veículo de comunicação. As novas regras foram publicadas ontem no Diário Oficial da União.

Em caso de mídia escrita (jornal, revista e sites na internet), a resposta deverá ter o mesmo espaço da notícia que causou a ofensa. No caso de emissoras de TV e rádio, terá a mesma duração da reportagem que ensejou a reclamação. Se tiver sido retransmitida em mais de um estado ou município, o alcance da resposta também será proporcional.

O ofendido terá 60 dias para pedir o direito de resposta a partir do dia em que a notícia foi veiculada. Ao receber o pedido de resposta, o veículo terá sete dias para publicá-la, caso contrário poderá sofrer uma ação judicial. Essa ação terá de ser julgada em até 30 dias. Quando receber o caso, o juiz deverá notificar o veículo no máximo em 24 horas, para que explique porque não publicou a resposta do ofendido. Havendo ou não resposta da empresa, o juiz poderá fixar a data para a publicação da resposta, respeitando o prazo máximo de dez dias.

O juiz poderá impor multa diária pelo não cumprimento da decisão. Em casos de publicações periódicas, a resposta deverá ser publicada na edição seguinte à que veiculou a matéria reclamada ou em edição extraordinária, caso seja muito longo o período entre as duas publicações. Na resposta do ofendido, não poderá haver assunto diferente do tratado na matéria reclamada. A publicação da resposta ou retificação de forma espontânea, antes de ser requerida pelo ofendido, não impede o exercício do direito de resposta garantido pela lei, nem prejudica a ação por dano moral que venha a ser movida pelo ofendido.

Na definição do que pode ser punido, a nova legislação diz que as ofensas se dão quando o conteúdo atenta, "ainda que por equívoco de informação, contra a honra, a intimidade, a reputação, o conceito, o nome, a marca ou a imagem de pessoa física ou jurídica". O direito de resposta poderá ser pedido por um representante legal ou por um parente, caso a pessoa que deseja ver publicada sua resposta estiver fora do país ou tenha morrido após a divulgação da matéria ofensiva. A lei do direito de resposta foi aprovada pelo Congresso a partir de um projeto do senador Roberto Requião (PMDB-PR).

Em nota divulgada esta semana, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) disse que a lei "põe em risco a liberdade de expressão e nega a empresas de mídia e comunicadores independentes o direito à defesa". A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) tem a mesma preocupação, "de que a nova legislação, diante das áreas de sombra que envolvem o novo texto, seja utilizada como álibi para garrotear a liberdade de expressão e intimidar o trabalho investigativo da imprensa em diferentes áreas de atividades, incluindo os poderes Executivo e Legislativo".

A Associação Nacional dos Jornais (ANJ) afirma que o texto sancionado por Dilma tem "flagrantes inconstitucionalidades" e que estuda tomar medidas legais. A Abert também aponta para inconstitucionalidades e, como a ANJ, avalia tomar medidas judiciais para reverter essas questões.

- O artigo sétimo dá pouco tempo para o veículo de comunicação se manifestar quando houver a concessão de direito de resposta. A regulamentação dá muito mais tempo a quem quer o direito do que dá ao veículo - afirmou o diretor-executivo da ANJ, Ricardo Pedreira.

Juiz versus colegiado

Pedreira frisou que a pessoa que se sente atingida tem até 60 dias, a partir da data da publicação ou veiculação da matéria, para pedir a retratação ao veículo. Se o meio de comunicação não atender o pedido, o ofendido poderá ir à Justiça.

- Existe um segundo ponto, do artigo 10, que consideramos inconstitucional porque prevê que, quando alguém quiser direito de resposta, pode conseguir isso na decisão de um juiz sozinho e, se um veículo quiser contestar, será analisado por um colegiado. Esses colegiados não se reúnem regularmente. Então, o recurso pode demorar muito tempo para ser examinado e a resposta pode ser publicada sem que ele seja analisado. - disse Pedreira.

Coordenadora adjunta da graduação de Direito do Ibmec/RJ, Bianca Farias vê avanços com a nova regulamentação, mas chama atenção para o fato de a lei não definir o que é ofensa, o que leva ao risco de decisões subjetivas.

- A lei não descreveu o que é ato ofensivo. Isso é muito subjetivo e vai gerar uma instabilidade, porque haverá uma diversidade de decisões. É importante ter uma diretriz - afirmou.

Especialista em sociologia da comunicação da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Danilo Rothberg afirmou que a nova lei tem aspectos bons e ruins, mas o saldo positivo se sobrepõe porque pode democratizar o acesso aos meios de comunicação. A desvantagem, diz, pode ser uma eventual autocensura dos veículos de comunicação temerosos de punição.