O Estado de São Paulo, n. 44622, 19/12/2015. Internacional, p. A18

Partidos têm diferenças insuperáveis e ampliam incerteza na Espanha

ANDREI NETTO, ENVIADO ESPECIAL / MADRI - O ESTADO DE S.PAULO

 

A campanha eleitoral para definir o novo primeiro-ministro da Espanha terminou nesta-sexta-feira (18) na total incerteza sobre qual partido poderá obter uma maioria no Parlamento amanhã. Em Barcelona, o atual premiê, Mariano Rajoy, candidato à reeleição pelo Partido Popular (direita), descartou a possibilidade de convidar o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) para formar uma aliança nos moldes da mantida pela chanceler Angela Merkel na Alemanha.

De outro lado, os líderes dos três maiores partidos de oposição negaram qualquer possibilidade de participar de uma coalizão com o conservador, acusado de corrupção.

Esse cenário isolou Rajoy, que chegou ao último dia da campanha para as eleições como líder em todas as pesquisas de opinião. Pelas projeções do instituto Metroscopia, o atual premiê deve conquistar o primeiro lugar, com cerca de 25,3% dos votos, à frente do socialista Pedro Sánchez, com 21%. O terceiro lugar ficaria entre o líder do partido de esquerda Podemos,

Pablo Iglesias, que aparece com 19,1% das intenções de voto, e Albert Rivera, chefe do partido de centro-direita Ciudadanos, que teria 18,2% dos votos.

Este prognóstico daria a Rajoy entre 105 e 112 assentos no Parlamento, número muito abaixo da maioria absoluta de 176 deputados eleitos. A alternativa mais óbvia seria uma coalizão entre PP e Ciudadanos, mas ontem Rivera deixou mais uma vez clara a sua intenção de não integrar uma aliança com o atual premiê, cujo partido é acusado de protagonizar o maior escândalo de corrupção da Espanha contemporânea.

Rivera afirmou nesta sexta-feira que seu partido apoiaria projetos pontuais de um governo do PP ou do PSOE, mas não aceitaria integrar o gabinete. “Se o Ciudadanos ganhar, que PP ou PSOE se abstenham e nos deixem governar. Se ganhar um deles, nós o faremos e estaremos na oposição”, disse Rivera.

Mesmo sem o apoio automático dos Ciudadanos, Rajoy queimou ontem as pontes com os socialistas, afastando qualquer hipótese de uma coalizão PP-PSOE – os dois partidos históricos que se alternam no poder na Espanha desde 1982. “Não sei quem o propôs, mas eu digo desde já ‘não’”, disse o primeiro-ministro.

Rajoy aproveitou para atacar os adversários advertindo para o “risco” de uma coalizão de esquerda entre PSOE e Podemos. “Se não querem uma coalizão que leve a Espanha à ruína, vote no PP, que é uma opção segura”, afirmou o premiê.

Em resposta, Pedro Sánchez pediu aos eleitores de seu partido socialista que respondessem a Rajoy. “Vocês querem um governo PP-PSOE?”, perguntou. “Não!”, gritou a multidão que acompanhava um comício na cidade de Zaragoza. O socialista também criticou os opositores que, segundo ele, tentam riscar o PSOE do mapa eleitoral da Espanha. “Diante da frente anti-PSOE, aqui estamos em pé, nós, socialistas”, afirmou.

O secretário-geral do PSOE pediu ainda que os 41% de indecisos adotem a estratégia do voto útil para conter o PP de Rajoy, sugerindo que abandonem os “partidos emergentes”.

“"Votar em Podemos ou Ciudadanos é perpetuar o PP em La Moncloa”, argumentou Sánchez, referindo-se à sede do governo espanhol.

Assim, com duas das três possibilidades de coalizões mais óbvias – PP-Ciudadanos e PP-PSOE – sendo descartadas, restam dois cenários mais fortes para o domingo: a hipótese de um governo de minoria de Rajoy, instável e propenso a cair por falta de apoio no Parlamento, ou uma coalizão PSOE-Podemos, possibilidade que ainda não foi descartada por nenhum dos dois lados.

A questão das últimas horas de campanha era saber qual das duas maiores forças de esquerda será a mais bem colocada amanhã. Pesquisas encomendadas por partidos políticos – os trackings, não divulgados em razão da lei eleitoral espanhola – indicavam um crescimento do partido Podemos de Pablo Iglesias, apontando para um bloco de esquerda forte.

Um documento com uma análise interna do PP, que foi obtido ontem pela imprensa, indicava o temor de uma frente de oposição.

“Todos os institutos de pesquisa indicam uma queda de Ciudadanos e uma tendência de alta de Podemos, que poderia ser a segunda força”, dizia o texto. “Este cenário torna verossímil um governo radical de Podemos-PSOE.”