O globo, n. 30057, 22/11/2015. País, p. 6

PMDB mostra preocupação com Cunha

Partido do presidente da Câmara avalia que aliado ficou vulnerável depois de quinta passada; PT quer reunião

POR JÚNIA GAMA / FERNANDA KRAKOVICS

22/11/2015 10:00 / atualizado 22/11/2015 10:28

Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, em entrevista no salão verde do Congresso Nacional - Michel Filho / Agência O Globo

 

BRASÍLIA E RIO — Integrantes da cúpula do PMDB ligados ao vice-presidente Michel Temer avaliam que o ousado movimento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para inviabilizar a sessão do Conselho de Ética na quinta-feira, deixou o aliado em situação ainda mais vulnerável e já demonstram preocupação com a disputa que pode tirar o partido do comando da Casa. O agravamento da situação de Cunha e o esvaziamento de apoios em todos os partidos, inclusive no próprio PMDB, colocou os caciques peemedebistas em estado de alerta com a possibilidade de o partido perder a presidência da Casa. Os peemedebistas destacam que o comando da Câmara é crucial para o projeto político do PMDB de aumentar a hegemonia nas eleições municipais de 2016 e, principalmente, para uma candidatura presidencial em 2018.

Há um temor de que, com o enfraquecimento cada vez maior de Cunha diante de seus pares, a sucessão pela presidência da Câmara adquira uma dinâmica incontrolável que não termine com o que consideram um movimento natural, que seria a manutenção do cargo com o PMDB, por ser o maior partido na Casa. A avaliação entre essas lideranças é de que será pequena a influência que Cunha terá para fazer seu sucessor e que pode ser necessária uma intervenção por parte do comando do PMDB na disputa. Os dirigentes do partido querem evitar que o governo seja o responsável pela nomeação do próximo presidente da Casa.

— O fundamental para o PMDB é a presidência da Câmara ficar com o partido e isso deve ser resolvido pela direção do partido, junto com a bancada, pela importância que isso vai ter nas eleições municipais e em 2018. É uma situação delicada, porque sabemos que é muito difícil qualquer negociação com Eduardo Cunha por causa da postura convicta dele — afirma um peemedebista histórico.

As manobras de Eduardo Cunha para tentar impedir a abertura de processo contra ele no Conselho de Ética da Casa, causaram desconforto na cúpula do PMDB. A operação foi considerada "muito truculenta" pela direção partidária. Não é tradição do PMDB, no entanto, tomar a iniciativa de punir seus integrantes, ainda que haja um sentimento de que o partido começa a ser prejudicado pela exposição negativa.

— A situação dele piorou muito depois da coletiva em que foi tentar convencer a versão dele sobre as contas da Suíça. Daí em diante, houve uma piora crescente que culminou com essa manobra desastrosa de quinta. Mas, o partido não deve tomar iniciativa diante do quadro. As coisas estão caminhando na Câmara e o que é imputado a ele cabe a ele mesmo resolver. Mas seria ingênuo dizer que não prejudica o partido –— diz um dirigente do partido.

A direção do PT continua tentando ganhar tempo, temendo que um confronto com Cunha prejudique o governo. A preocupação é que o presidente da Câmara revide com a abertura de um processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff e que a crise política inviabilize a votação de medidas do ajuste fiscal.

Mas, no momento em que o deputado Fausto Pinato (PRB-SP), relator do processo contra Cunha, conseguir ler seu parecer pela continuidade das investigações, o PT deve votar a favor. Deputados do PT reclamam que a decisão de não dar quórum para a sessão do Conselho de Ética não foi discutida com a bancada. Segundo petistas, a articulação ficou restrita à direção do partido; ao líder da bancada, deputado Sibá Machado (PT); e aos integrantes do colegiado.

A insatisfação na bancada petista deve-se ao fato de o desgaste pelo apoio à manobra protelatória de Cunha ser dividido entre todos. A revolta maior é dos deputados que integram a Mensagem, segunda maior corrente interna petista e oposição ao comando partidário. Metade da bancada do PT assinou a representação contra Cunha feita pelo PSOL no Conselho de Ética.

— A bancada está no limite — disse um deputado do PT.

Os insatisfeitos cobram do líder Sibá Machado uma reunião, na próxima terça-feira, para discutir o assunto, e tentam conseguir uma posição partidária, com o respaldo do presidente do PT, Rui Falcão. Depois de desembarcar da aliança que mantinha com Cunha, o PSDB tenta agora jogar o desgaste pela sustentação do peemedebista no colo do PT. É isso que uma parcela da bancada petista tenta evitar.

O apoio a Cunha está minguando mesmo entre seus principais aliados. Deputados do entorno de de Eduardo Cunha se reuniram na liderança do PTB e fizeram uma avaliação de que “erros” foram cometidos no episódio e que houve “exagero’ na operação, já que a expectativa era que não haveria votação do relatório na quinta-feira. Aliados do presidente da Câmara revelaram incômodo com a situação e analisaram que acabaram ficando em uma "saia-justa" ao respaldarem Cunha.

As manobras desta quinta-feira reforçaram o sentimento de um grupo restrito de pessoas próximas a Cunha que defendem que ele deve construir uma "saída honrosa" para salvar seu mandato com a renúncia à presidência da Câmara. Está prevista para esta semana uma abordagem nesse sentido ao peemedebista.

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Cláudia Cruz: sonhos de ser primeira-dama do país

Operação Lava-Jato interrompeu os planos da mulher do presidente da Câmara​

POR FERNANDA KRAKOVICS

22/11/2015 9:21 / atualizado 22/11/2015 16:19

Tiete. Claudia Cruz fotografa a coletiva do marido Eduardo Cunha, que preside a Câmara - André Coelho / André Coelho/19-08-2015

 

BRASÍLIA — Antes de a Operação Lava-Jato revelar suas contas secretas na Suiça, a jornalista Cláudia Cruz, mulher do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), chegou a sonhar em ocupar o posto de primeira-dama do país, segundo pessoas que conviveram com ela. A aspiração foi alimentada pela trajetória até então ascendente do peemedebista, que impôs uma derrota ao governo em fevereiro, ao se eleger para o comando da Câmara.

Desde então, Cláudia passou a ficar mais tempo em Brasília. Sentindo-se sozinha e deslocada, ela pediu ajuda, no início do ano, à diretora do Centro Cultural da Câmara, Isabel Flecha de Lima, para organizar alguns jantares, na tentativa de animar sua vida na capital federal.

— Ela disse que estava querendo se enturmar em Brasília porque quando ele (Cunha) fosse presidente da República, ela não queria ficar sozinha naquele palácio — disse um participante de um desses jantares, em referência ao Palácio da Alvorada.

Cláudia não era a única a pensar em voos mais altos. Após a eleição de Cunha para a presidência da Câmara, aliados também chegaram a cogitar uma candidatura à Presidência da República. Os planos, porém, foram atropelados pela operação Lava-Jato, da Polícia Federal, que investiga um esquema de corrupção na Petrobras.

Agora, com o peemedebista enfrentando um processo no Conselho de Ética da Casa, que pode resultar na cassação de seu mandato por quebra de decoro parlamentar, aliados do presidente da Câmara tentam minimizar as antigas aspirações e dizem que Cláudia deve ter falado em tom de brincadeira.

A reportagem de O GLOBO solicitou uma entrevista com ela, o que foi descartado por Cunha:

— Sem chances. Ela não falará.

Em maio, ao conceder entrevista para a jornalista Mariana Godoy, da Rede TV, Cunha foi questionado se queria ser presidente da República. Ele respondeu que esse tipo de coisa não se planeja, que acontece de acordo com as circunstâncias, mas não descartou essa possibilidade:

— A gente vive cada dia. Cada dia, sua agonia — disse ele, na ocasião.

Desde que foram divulgados, pela Procuradoria Geral da República (PGR), documentos ligando Cunha a contas na Suíça que teriam sido abastecidas com dinheiro de propina da Petrobras, o entorno do casal está na defensiva.

Selfie.Claudia Cruz imagem capturada deperfil nas redes sociais - reprodução da intenet / Reprodução da Internet

Procurada, Isabel Flecha de Lima reagiu com irritação ao ser questionada sobre os jantares organizados por ela para ampliar o círculo social da primeira-dama da Câmara:

— E o que é que tem?

Deputados que tiveram contato com Cláudia, mas não são de seu círculo íntimo, disseram que ela “não é um exemplo de simpatia” e que se deslumbrou com o poder:

— Todo mundo começou a se aproximar dela para chegar a ele, que é o terceiro homem da República (na linha sucessória). Ela foi mordida pela mosca azul — disse um deputado, que esteve com ela “quatro ou cinco vezes”.

Na residência oficial da Câmara, chamou atenção de um parlamentar as dezenas de porta-retratos com fotos do casal. Cláudia costuma dizer, segundo pessoas próximas, que Cunha é “um homem maravilhoso”, e chegou a fazer uma declaração de amor recentemente em uma rede social. “Ele é meu e eu o amo”, escreveu a jornalista.

Presidente da Telerj nos anos 90, Cunha se encantou com Cláudia em uma entrevista e a tornou a voz da operadora de telefonia. Os dois estão casados há quase vinte anos e têm uma filha. Cunha tem ainda três filhos do primeiro casamento, e ela, uma, de um relacionamento anterior.

Cláudia foi uma das apresentadoras do telejornalismo da Rede Globo nos anos 90 e também trabalhou na Record. Colegas de profissão afirmaram, no entanto, que o jornalismo funcionava como um hobby para ela.

— O lado dondoca já era forte naquela época — disse um colega de trabalho.

Ela pareceu não se abalar quando vieram à tona pela primeira vez, em 16 de outubro, documentos enviados pela Suíça com a assinatura do deputado em uma das contas mantidas naquele país. Apreciadora de alta gastronomia, nesse dia ela almoçou no Fasano, no Rio, com um grupo de amigos.

Além do gosto por bons restaurantes, amigos dizem que a jornalista é “fissurada” em ginástica. No Facebook, Cláudia faz parte de grupos sobre dieta sem glúten, como “Cozinha livre: sem glúten & sem lactose”, e curte páginas sobre esse assunto.

A vida de altíssimo padrão do casal aparece em relatório do Ministério Público suíço, segundo o qual Cunha usou contas secretas naquele país para pagar faturas de cartões de crédito internacional e despesas pessoais da mulher e da filha na Inglaterra, na Espanha e nos Estados Unidos. Entre os gastos estão o pagamento de US$ 59,9 mil para a IMG Academies, de Nick Bollettieri, famoso professor de tênis em Palm Beach, reduto de milionários americanos.

Cláudia Cruz e Eduardo Cunha brindam em Brasília: - Reprodução da internet