Levy diz que "está fora" se meta fiscal diminuir

Rosane Hessel 

Não bastasse estar com o mandato em risco devido ao processo de impeachment que está em andamento na Câmara dos Deputados, a presidente Dilma Rousseff foi surpreendida pelo claro aviso do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, de deixar o governo. Ele disse em reunião, na noite de quarta-feira, com representantes da Comissão Mista de Orçamento (CMO), que não se submeterá a um novo vexame se a meta de superavit primário de 2016, que ele prometeu ser de 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB), for reduzida, como defende uma ala do governo liderada pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa. "Se zerar o superavit, estou fora", afirmou.

 


Ao ser informada sobre a ameaça da Levy, Dilma mandou chamar o subordinado ontem à noite para uma conversa. Segundo interlocutores, apesar do tom ameno, o ministro ressaltou que o governo não pode fugir da obrigação de dar início ao tão esperado ajuste fiscal. Desde que assumiu a Fazenda, ele vem sendo sistematicamente derrotado. Assim que tomou posse, prometeu entregar um superavit primário (economia para o pagamento de juros) de 1,1% do PIB. Meses depois, a meta foi reduzida para 0,15% do PIB e acabou, recentemente, transformando-se em um rombo de até R$ 119,9 bilhões.


Para 2016, o ministro havia defendido superavit de 2%, mas o governo enviou ao Congresso um projeto de Orçamento prevendo deficit de R$ 30,5 bilhões. Levy foi contra. Prevaleceu, porém, a posição de Barbosa. O resultado foi a perda de grau de investimento do país pela Standard & Poor's (S&P) e uma crescente onda de desconfiança em relação ao governo, que impulsionou a inflação e agravou a recessão. Na tentativa de reverter o estrago e evitar a perda do selo de bom pagador por outras duas agências, a Moody's e a Fitch, Levy reforçou a promessa de superavit de 0,7% para 2016.


Segundo integrantes da CMO, esta foi a segunda vez, em pouco mais de uma semana, que o ministro da Fazenda indicou que não passaria novamente pelo desgaste de ver a meta de superavit reduzida. Na primeira, em 3 de dezembro, ele disse que "entregaria o chapéu" a Dilma se ela apoiasse a proposta de "meta zero", como defende o colega do Planejamento. Ao ouvir o desabafo, a presidente da Comissão, senadora Rose de Freitas (PMDB-ES), emitiu sinais de alerta para o Palácio do Planalto, mas não teve retorno. Ontem, porém, Dilma decidiu botar panos quentes e abriu espaço na agenda para receber o subordinado. A presidente teme um movimento forte do mercado financeiro a favor do impeachment no caso de Levy sair.


A previsão de superavit primário de 0,7% do PIB consta do projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que pode ir a votação na próxima terça-feira. Levy vem defendendo que o governo liquide essa fatura logo, como forma de dar uma sinalização positiva aos agentes econômicos de que tudo está sendo feito para garantir a normalidade fiscal, mesmo com a grave crise política que aflige o país. O problema é que o PT resolveu encampar a proposta de "meta zero" para 2016.


O líder do governo na CMO, deputado Paulo Pimenta (PT-RS), já afirmou que apresentará uma emenda à LDO para ratificar a proposta de "meta zero" do Planejamento, como forma de liberar R$ 34 bilhões do Orçamento para investimentos (Programa de Aceleração do Crescimento) e para impedir o corte de R$ 10 bilhões no Bolsa Família defendido pelo relator-geral do Orçamento de 2016, deputado Ricardo Barros (PP-PR).
 

Correio braziliense, n. 19191, 11/12/2015. Economia, p. 9