Saúde: famílias gastam mais do que o governo

Celine Perrone 

As famílias brasileiras gastam mais do que o governo com a saúde. A pesquisa publicada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelou que os 8% do Produto Interno Bruto (PIB) — R$ 424 bilhões — gastos com bens e serviços de saúde, em 2013, R$ 234 bilhões (4,4%) couberam às famílias. O governo, na realidade, arcou com apenas R$ 190 bilhões, o equivalente a 3,6% do PIB.

O gerente de Bens e Serviços da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE, Ricardo Moraes, salientou que os gastos com planos de saúde nas famílias subiram de 75,9% para 77,9% (R$ 141 bilhões) de 2012 para 2013, Já os custos com medicamentos diminuíram de 22,5% para 20,6% (R$ 78,6 bilhões) de um ano para o outro. “O governo gastou R$ 149,9 bilhões com hospitais públicos e R$ 31,9 bilhões com o Sistema Único de Saúde (SUS), afirmou.

Para Ivens Filho, consultor da DXI Planejamento Financeiro, o número salta aos olhos porque evidencia a ineficiência do governo nessa área. “A saúde é um problema sistêmico. A surpresa é o número absoluto porque mostra que não é falta de dinheiro e sim como é aplicado. O setor de saúde é um exemplo perfeito da incapacidade do governo de alocar recursos de forma eficiente”, disse.

Convênios

O Ministério da Saúde, em estatística de 2013, mostrava que quase 50 milhões de pessoas no país tinham um convênio de saúde naquela época, dos quais 30 milhões eram participantes de convênios empresariais, aqueles oferecidos pelos empregadores aos seus empregados. Ivens chama a atenção para o fato de que, com o aumento do desemprego e a diminuição de renda, mais pessoas possam vir a depender do sistema público de saúde. “Se as empresas começarem a cortar esse produto, ou mesmo rebaixar de categoria o plano, procurando o mais básico, por exemplo, pode ser que isso influencie a pessoa a procurar um posto de saúde perto de casa. Acredito que essa é uma despesa que pode pesar no orçamento nas classes de menor poder aquisitivo”, constatou.

O arquiteto Theo Ziram, 26 anos, está na iminência de usar o convênio porque o filho vai nascer em fevereiro. “Já estou procurando informações de como incluí-lo no convênio. Pago metade, e a outra metade é paga pela empresa onde trabalho. Só de convênio vão cerca de 15% da minha renda familiar”, garantiu. Mas ele nem cogita a hipótese de ficar sem. “Tenho hipertensão, minha mulher vai ter benê, depois vem consulta com pediatra. Tudo isso é uma paulada. Se fosse esperar para fazer o pré-natal no sistema público, creio que o bebê nasceria antes do primeiro exame. Além de ser tudo muito cheio, o atendimento é sofrível. Não dá para arriscar”, reclamou.

A artesã Cleonice Baggio, 50 anos, faz apenas consultas de rotina. Disse não precisar de muitos tratamentos, mas, como o marido trabalha no Banco do Brasil, tem convênio médico garantido. “Antes dos nossos filhos se casarem, a família inteira, de cinco pessoas, se beneficiava. Hoje, somos só eu e meu marido e gastamos cerca de 5% da nossa renda com esse tipo de seguro, que prefiro não usar, mas é melhor ter. Não dá para confiar em hospital público”, assegurou.

 

Correio braziliense, n. 19191, 11/12/2015. Economia, p. 11