Título: Xadrez no conselho
Autor: Tranches, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 27/09/2011, Mundo, p. 16

Começa no órgão máximo das Nações Unidas o debate sobre o ingresso do país como 194º membro pleno da organização. Estados Unidos manobram nos bastidores para derrubar o pedido sem recorrer ao poder de veto O Conselho de Segurança das Nações Unidas deu início ontem à discussão oficial sobre o pedido de adesão do Estado da Palestina e voltará a debater o tema amanhã, em Nova York, durante reunião aberta. O conselho iniciou as conversações preliminares a portas fechadas, três dias após o presidente da Autoridade Palestina (AP), Mahmud Abbas, formalizar a solicitação e pronunciar um memorável discurso perante a Assembleia Geral. O encontro de ontem inaugurou o processo, que poderá levar várias semanas até o desfecho. A inclusão de membros na ONU é decidida pela Assembleia Geral, porém apenas por recomendação do Conselho de Segurança (CS), onde a decisão deve ser aprovada por nove dos 15 membros, sem voto contrário (veto) e um dos cinco membros permanentes.

O órgão, que é a instância superior das Nações Unidas, deve decidir amanhã se submeterá a candidatura palestina ao Comitê de Admissão de Novos Membros, segundo informou o presidente atual do CS, o libanês Nawaf Salem, a jornalistas. O passo seguinte seria a votação, mas acredita-se que ela possa demorar até quatro semanas. A AP espera assegurar, até o momento, os nove votos necessários para levar a questão à Assembleia Geral, onde o reconhecimento pleno da Palestina conta com mais de 140 dos 193 países-membros.

Seis integrantes do conselho já se declararam favoráveis ao pedido palestino: Rússia, China, Brasil, Índia, África do Sul e Líbano, as duas primeiras membros permanentes. Entre estes, Reino Unido e França ainda não declararam voto, assim como Alemanha, Nigéria, Bósnia, Portugal e Gabão. A Colômbia deve se abster. Caso a Palestina garanta os nove votos, porém, os Estados Unidos já anunciaram que usarão seu poder de veto.

Falando à imprensa, o representante da Palestina na ONU, Riyad Mansour, disse esperar "responsabilidade" do CS. "Teve início o processo e esperamos que o Conselho de Segurança assuma sua responsabilidade e lide com a aplicação com uma atitude positiva", afirmou. Ele declarou ainda que teve encontros com todos os 15 países-membros, "para convencê-los a votar a favor da adesão da Palestina". Na batalha diplomática, os EUA e Israel exercem pressão no sentido oposto, e ameaçam os palestinos com represálias e cortes na ajuda financeira. Antes da sessão de ontem, a secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, reuniu-se com o primeiro-ministro libanês, Najib Mikati.

Duelo retórico Na última sexta-feira, Abbas entregou ao secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, o pedido para que a Palestina integre o organismo como 194º membro pleno, com soberania sobre os territórios da Faixa de Gaza e da Cisjordânia e tendo Jerusalém Oriental como sua futura capital ¿ em resumo, nas fronteiras anteriores à guerra árabe-israelense de 1967. Segundo o líder, a solicitação foi feita após fracassarem as tentativas de negociação com Israel, que não aceitou suspender a construção de novas moradias nas colônias judaicas instaladas em território palestino. Discursando à ONU pouco depois de Abbas, o premiê israelense, Benjamin Netanyahu, respondeu que o congelamento das conversações se deu por conta da recusa da AP a aceitar seu país como um Estado judeu.

Ontem, segundo uma reportagem do jornal Haaretz, o presidente Shimon Peres afirmou que o líder palestino é "o melhor parceiro para negociarmos a paz". "Chamo meu amigo, o presidente palestino Mahmud Abbas, que eu respeito e reconheço como o melhor com quem Israel poderá trabalhar para retornar à mesa de negociação", declarou durante cerimônia alusiva ao Rosh Hashanah, o Ano Novo judaico, que será observado amanhã.

Desde dezembro último, o Brasil reconhece a Palestina como Estado soberano nas fronteiras de 1967. Em Nova York desde a semana passada, por conta da Assembleia Geral, o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, tem mantido o tema na agenda de seus encontros diplomáticos. Segundo fontes consultadas pelo Correio, entre sexta-feira e ontem Patriota manteve reuniões com 20 chanceleres, boa parte de países do Oriente Médio. Em todas as conversações, a proposição palestina foi o tema dominante.

Olho no voto judaico Barack Obama tem sido acusado de sacrificar os próprios planos de paz para o Oriente Médio em nome de não perder o apoio do eleitorado judaico na difícil disputa pela reeleição, em 2012. Por seu peso específico, os judeus podem influir em dois estados americanos considerados críticos para a conquista da Casa Branca. Em Nova York, a hegemonia democrata em eleições presidenciais não parece ameaçada, mas o voto judaico pode ser crucial para Obama na Flórida, que decidiu a vitória de George W. Bush em 2000. Pesquisas de opinião, no entanto, sugerem que decisões sobre política externa pesam pouco sobre a opção dos americanos na hora de escolher o presidente.