GOVERNO VAI PEDALAR COM SALÁRIOS DE TERCEIRIZADOS

Vera Batista 

01/12/2015

A tesourada no Orçamento, que poderá paralisar o país, é maior que a anunciada inicialmente pelo governo, no Decreto 8.580, publicado ontem no Diário oficial da União (DOU). Chega a R$ 12,9 bilhões e afetará os Três Poderes da República. Apenas o Executivo terá de cortar R$ 11,2 bilhões nas despesas discricionárias (que não são obrigatórias). Legislativo, Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública da União terão que abrir mão de mais R$ 1,7 bilhão.

De acordo com o secretário executivo do Ministério do Planejamento, Dyogo Oliveira, em 2015, o contingenciamento total é de R$ 92,4 bilhões. Ele admitiu também que, caso o Congresso não aprove a revisão da meta fiscal deste ano, o governo poderá pedalar gastos com aluguel, água, luz e telefone para o ano que vem. E também atrasar o pagamento de empregados terceirizados e de bolsistas, no Brasil e no exterior. Em vez de entregar um superavit de R$ 66,3 bilhões nas contas públicas, como previsto na legislação em vigor, o governo quer autorização para apresentar rombo de até R$ 119,8 bilhões.

Oliveira reforçou que as despesas obrigatórias (pagamento de salários, aposentadorias e benefícios previdenciários), além de investimentos do Programa Minha Casa Minha Vida e do Bolsa Família, são intocáveis. E afirmou que está nas mãos do Congresso a chave para o governo cumprir seus compromissos. Caso contrário, as contas cotidianas que fazem a administração pública andar no dia a dia, com vencimento em dezembro, não serão honradas. “Até que haja descontingenciamento dos recursos, o governo não terá condições de pagar”, destacou.

O programa Minha Casa Minha Vida, uma das bandeiras de campanha da presidente Dilma Rousseff, ficou livre do corte, segundo explicou a secretária de Orçamento, Esther Dweck, porque foi beneficiado por uma lei, desde o início deste ano, que permite repasses de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

Atrasos

Oliveira disse que não espera um calote em cadeia porque o pagamento dos compromissos depende de cada ministério e alguns já fizeram a reserva de recursos, que são repassados trimestralmente. O Ministério da Educação foi citado como exemplo. Por isso, os bolsistas do Programa Ciências sem Fronteiras podem ficar livres do calote. Já os pesquisadores do Ministério de Ciência e Tecnologia poderão não ter a mesma sorte. “Para o Ministério de Ciência e Tecnologia, o repasse será feito em 15 de dezembro. E não terá problemas se já estiver concluído o processo de votação do PLN nº 5, que altera a meta fiscal”, explicou Oliveira.

Os empregados terceirizados devem ficar atentos ao comportamento do órgão ao qual estão ligados. De acordo com oMinistério do Planejamento, não é possível apurar o número de pessoas que podem ter salários atrasados porque a quantidade é de responsabilidade das empresas contratadas. O valor já pago em terceirizações em 2015, no Poder Executivo, é de R$ 9,9 bilhões, referente a contratos celebrados com empresas, para atividades de apoio administrativo e de vigilância.

Dyogo Oliveira prometeu que o governo acompanhará de perto os efeitos do contingenciamento, embora tenha constatado, após reunião com os secretários executivos dos diversos ministérios, que não faltarão recursos para manter o bom funcionamento dos serviços até o fimdesta semana. Na quinta-feira, haverá novo encontro com os secretários para reavaliar as estratégias.

De acordo com o economista Alexandre Espírito Santo, da Órama  Investimentos, o mercado está atento ao que vai acontecer no Congresso. “A situação é tão grave que o Parlamento não terá outra opção a não ser aprovar a revisão da meta. O governo não tem mais o que fazer. Prometeu um corte absolutamente insuficiente, de R$ 11 bilhões, que, na verdade, deveria ser de mais de R$ 100 bilhões”, assinalou. Ele disse que sequer consegue enxergar o que vai acontecer com o país se o PLN nº 5 não passar no Congresso. “É uma situação que nunca vi  em 30 anos de profissão”, declarou.

 

Correio braziliense, n. 19181 , 01/12/2015. Economia, p. 7