País perde US$ 5,6 bi das reservas em 2015

Rosana Hesel 

02/01/2015

Apontadas pelo governo como um seguro anticrise, as reservas em moedas internacionais estão encolhendo. Passaram de US$ 374 bilhões, no fim de 2014, para US$ 368,4 bilhões, em 30 de dezembro de 2015 — uma redução de US$ 5,6 bilhões, refletindo, em parte, a perda do grau de investimento do país. Foi o terceiro ano seguido de queda. desde o pico de US$ 378,6 bilhões, de 2012. O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, defende sempre que pode o nível elevado das reservas porque elas “são um seguro para economia e têm funcionado bem”. No entanto, especialistas ouvidos pelo Correio apontam que não há necessidade de o país ter um volume tão grande, dado o alto custo de manutenção desses recursos.

Pelas contas do consultor Roberto Luis Troster, o governo gasta de R$ 190 bilhões a R$ 200 bilhões por ano para manter essa proteção contra imprevistos nas contas externas. Essa despesa ocorre porque, para obter recursos para comprar os dólares, o governo brasileiro emite títulos públicos que pagam juros de 14% a 15% ao ano e aplica o dinheiro em papéis estrangeiros, na maior parte títulos do Tesouro dos Estados Unidos, recebendo remuneração média de 1%. “Nessa troca, há um custo de carregamento médio de 13,5%,”, estima o consultor, que foi economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).

Para Troster, manter metade do volume atual de reservas “seria mais do que razoável”, porque não há risco de aumento no deficit das transações do país com o exterior. Além disso, o endividamento externo do país é considerado baixo — de 4,4% do Produto Interno Bruto (PIB), em novembro, conforme dados do Banco Central (BC). Na avaliação do BC, a queda do nível das reservas nos últimos três anos foi marginal. “As alterações diárias no volume são decorrentes basicamente das variações de preço dos ativos. Ressalta-se que as reservas internacionais também funcionam para o mercado internacional como um indicador econômico de solidez do país”, informou a autarquia.

Temor
O economista Carlos Thadeu de Freitas Gomes, chefe da Divisão Econômica da Confederação Nacional do Comércio (CNC), também considera o volume excessivo. “O nível atual poderia ser reduzido. A balança comercial deve ter superavit de quase US$ 20 bilhões em 2015 e o valor pode dobrar em 2016. O temor da crise da balança de pagamentos está se afastando”, explica. A expectativa do mercado é de que o deficit em conta-corrente (balança comercial mais saldo de transações de serviços e rendas) caia de US$ 64 bilhões para US$ 38,6 bilhões nesse período.

O Brasil é a terceira nação que mais detém títulos do Tesouro dos EUA, atrás apenas da China e do Japão. Se forem incluídos os bancos centrais caribenhos e o conjunto dos exportadores de petróleo, o país cai para o quinto lugar. De acordo com o Banco Central, esses papéis correspondem a cerca de 80% da cesta total de reservas internacionais brasileiras.

Depois de três anos com média de US$ 50 bilhões, as reservas ganharam impulso a partir de 2006, crescendo vigorosamente ano a ano. Até 2012, caminhavam para chegar aos US$ 400 bilhões. Mais recentemente, sofreram o baque do rebaixamento da Standard & Poor’s, que, em setembro, tirou o selo de bom pagador do governo brasileiro. Naquele mês, US$ 6,6 bilhões deixaram o pais, e a saída só não foi maior porque o BC atuou no mercado, fazendo leilões de swap cambial (operações equivalentes à venda futura de dólares). Em outubro, o volume de saída foi menor, de US$ 300 milhões, e, em novembro, de US$ 1,9 bilhão, pelas contas do economista Thiago Biscuola, da RC Consultores.

O economista-chefe da INVX Global Partners, Eduardo Velho, avalia que as reservas, mesmo no nível atual, não são totalmente prejudiciais. Mas critica o custo elevado do instrumento. “Isso vem aumentando o custo da dívida e, consequentemente, a inflação. A compra de dólares pelo BC joga mais reais no mercado e, para esterilizar essa oferta, o governo vende títulos. Essa operação está muito onerosa e afeta o resultado fiscal do setor público”, alerta.

Custos
Para Biscuola, da RC Consultores, o custo de manter as reservas, sem dúvida, é muito alto. “Esse colchão é o que diferencia a situação atual do país das crises anteriores. Mas o governo pode, de forma gradual, aproveitar a atual alta do dólar, que elevou o valor das reservas, e diminuir um pouco esse volume para reduzir o endividamento bruto, que está muito elevado ”, avalia. Ele lembra que a taxa da dívida bruta em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), pelas estimativas do próprio BC, ultrapassará 70% neste ano.

Já o economista sênior do banco Haitong, Flávio Serrano, defende a manutenção do volume atual, dado o enorme grau de incertezas nas economias interna e externa. “O momento não é propício para se falar em redução de reservas”, aconselha.

Fabio Klein, especialista em contas públicas da consultoria Tendências, destaca a necessidade de se avaliar os gastos com lupa. “O governo precisa pesar os custos desses instrumentos. Os juros estão em um nível muito elevado e podem subir ainda mais. Isso poderá ter um impacto fiscal negativo, ao acelerar a queda da atividade econômica e da arrecadação”, destaca. Para ele, o governo precisará coordenar melhor as política monetária e a fiscal para evitar o crescimento acelerado da dívida em relação ao PIB. 
 
Correio braziliense, n. 19213, 02/01/2016. Economia, p. 6