Menos dívida, mais empréstimo

Eduardo Bresciani, Maria Lima, Sérgio Roxo Tiago Dantas 

31/12/2015

A nova fórmula para calcular a dívida dos estados e municípios com a União, regulamentada ontem pelo governo federal, foi comemorada por governadores que já veem a possibilidade de contrair novos empréstimos e retomar a agenda de investimentos, elevando, porém, o grau de endividamento das unidades da federação. O novo cálculo dos débitos, que terão estoques reduzidos e serão corrigidos por uma taxa de juros menor que a atual, era uma das demandas prioritárias dos gestores estaduais.

Agora, os governadores devem aumentar a pressão sobre a Secretaria do Tesouro, do Ministério da Fazenda, para a autorização de novos empréstimos.

— É muito positivo. Primeiro, porque o governo federal dá uma resposta rápida ao pleito. Isso cria um ambiente positivo para a continuidade do diálogo e melhora a dívida dos estados. Agora a liberação de credito é fundamental. No nosso caso, para investimento em infraestrutura. A prioridade é essa — disse o governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg (PSB), que organizou na segunda-feira um encontro com dez governadores para pressionar o governo federal por uma agenda que aliviasse o caixa dos estados.

— Os novos indexadores ajudam muito. Alivia muito a dívida, mas agora temos um longo dever de casa para fazer. Vai reduzir o estoque da dívida, mas não vai ter sobra de caixa para aplicar em outras áreas. O que vai ter é uma folga fiscal maior para novos empréstimos. Vamos ver quais linhas de crédito vão ter disponíveis nos bancos oficiais — afirmou o governador do Rio Luiz Fernando Pezão (PMDB), que complementou: — Quero reestruturar o estado, ver o que conseguimos de alongamento da dívida para a retomada dos investimentos em 2016. Vamos torcer para a economia crescer.

 

Segundo a Secretaria de Fazenda do Rio, análise preliminar dos técnicos verificou que a nova base de cálculo deve reduzir em dez anos o prazo de pagamento da dívida. Em 2015, o valor médio desembolsado por mês foi de R$ 430 milhões. A dívida do Rio com a União é de R$ 66,8 bilhões.

 

— É um gesto diante da necessidade de se ter caminhos de retomada do crescimento. Um dos caminhos mais rápidos é viabilizar investimento público, o que vale para o governo federal e também para os governos estaduais. Um dos jeitos de possibilitar um caminho para a retomada é esse, de dar um respiro para as finanças dos entes nacionais. O mérito de descentralizar é que você atinge mais rapidamente as pessoas. A questão do crédito é o passo seguinte — disse Flávio Dino (PC do B), governador do Maranhão.

Desde que as dívidas dos estados e municípios foram federalizadas, em 1998, eles só podem contrair novos empréstimos se tiverem autorização da Secretaria do Tesouro. No caso de empréstimos junto a organismos e bancos internacionais a União entra como avalista. Ao longo de 2015, o governo federal represou essas autorizações justamente para evitar o aumento do endividamento. Na reunião que teve com os governadores nesta semana, o novo ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, se comprometeu a apresentar um cronograma para a retomada destas autorizações. Mas já ressaltou que a liberação acontecerá paulatinamente.

 

Uma das principais interessadas na mudança do indexador, a prefeitura de São Paulo calcula que poderá reduzir em R$ 45 bilhões (de R$ 72 bilhões para R$ 27 bilhões) o valor de sua dívida com a União. O prefeito, Fernando Haddad, havia se empenhado diretamente na articulação com parlamentares para aprovar a lei. A alteração permitirá uma economia anual de R$ 1,9 bilhão para o município. A avaliação da prefeitura é que a troca do indexador vai evitar insolvência e permitirá retomada da capacidade de investimento em áreas como mobilidade urbana, saneamento, habitação, Saúde e Educação.

Já o secretário da Fazenda do estado de São Paulo, Renato Villela, disse que a mudança não produzirá nenhum efeito de curto prazo sobre as finanças. Segundo ele, em 1997 o governo paulista negociou o pagamento à União de um valor fixo de 13% da receita. A vantagem, segundo ele, é que a dívida crescerá menos a cada ano. Com isso, o estado prevê pagar o que deve com quatro anos de antecedência. Em vez de 2037, deve fazer isso em 2033.

O Paraná, que passou por dificuldades financeiras ao longo do ano, calcula que terá uma economia anual de R$ 150 milhões com a mudança do indexador. O dinheiro extra deve ser usado para duplicar rodovias.

Dilma pode se beneficiar

Pezão, Rollemberg e Dino avaliam ainda que se a economia melhorar nos estados haverá também uma distensão no ambiente político, o que poderia ajudar a presidente Dilma Rousseff que enfrenta um processo de impeachment na Câmara dos Deputados e tem baixa popularidade.

— A melhoria do ambiente econômico melhora o político, e a do político melhora o econômico. Tudo que o Brasil precisa é de uma agenda propositiva. Os estados ganham e o país sai ganhando — afirmou Rollemberg. O governador do Rio compartilha da avaliação: — Isso vai melhorar os investimentos para todo mundo, não só para o Rio. Melhorando investimentos, melhora o crescimento. Se melhorar, consequentemente melhora o humor em relação à crise política e à situação da presidente Dilma também.

 

Reajuste para servidores federais

Ontem, o governo federal também enviou para o Congresso projetos de lei que preveem um aumento de 5,5% para a maioria dos servidores civis do Executivo em agosto de 2016. O aumento faz parte de uma negociação com as categorias e tem vigência de dois anos, que inclui outro reajuste de 5% em janeiro de 2017, resultando em uma alta total de 10,5% no período.

Tradicionalmente, o reajuste é dado pelo governo no mês de janeiro de cada ano, mas, para 2016, o aumento será atrasado para agosto por conta do ajuste fiscal. O anúncio dessa prorrogação foi feito em setembro, no pacote de corte de gastos para permitir um resultado superavitário em 2016, o que incluía ainda a suspensão de novos concursos.

Segundo nota do Ministério do Planejamento, as propostas resultam da negociação com entidades que representam 1,1 milhão de servidores, do total de 1,227 milhão de servidores civis do Executivo Federal. “Em um ano de dificuldades econômicas e fiscais, o saldo de acordos pode ser visto como positivo”, disse em nota o secretário Gestão de Pessoas e Relações de Trabalho do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Sérgio Mendonça.

Ainda seguem as negociações com servidores ligados a Receita Federal, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal (PFR), Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), médicos peritos do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), analistas de infraestrutura, analistas de políticas sociais, peritos federais e diplomatas.

O globo, n. 30096, 31/12/2015. País, p. 3